PROLEGÓMENOS A UM TRATADO DE METEOROLOGIA DE CAFÉ, por José Gabriel

Temos de admitir. O IPMA cada vez está mais preciso e rigoroso. Para quem gosta de surpresas, isso não é uma boa notícia. Perde-se aquela emoção de hesitar se se sai com um guarda-chuva ou não.

Qual a roupa adequada à insegurança meteorológica que se adivinha. Depois, conforme as decisões nestes magnos problemas e subsequentes resultados, dispúnhamos de um rol de imprecações para reagir, sendo que os crentes dispõem de um significativo rol de divindades que podem culpar – a começar pelo inevitável S. Pedro, a quem é atribuído, dizem, este pelouro. 

Agora, lemos as previsões e, geralmente, estão certas. Uma monotonia. A coisa foi evoluindo ao ponto de a prática de atribuir nomes às depressões e tempestades se foi refinando até se tornar popular e um xodó dos pivôs televisivos. Lembram-se como era dantes? Usávamos aquelas finas distinções que graduavam a chuva entre a “molha-tolos” – aquela poalha algures entre a névoa e o chuvisco – e a “chuva a cântaros”. Claro que, mais grosseiramente, atribuíam-se outros nomes e adjectivações a esses fenómenos – “a p_ _ _ da chuva” e a consequente “molha do c_ _ _ _  _ _” – mas isso são abordagens de carácter soez que não cabem no âmbito sério deste texto. Muito menos falo dos ventos, da ondulação marítima, posto que, tendo, desde criança, enriquecido o meu vocabulário ouvindo as designações usadas pelos pescadores da Nazaré, receio que a sua enunciação possa provocar chiliques aos mais frágeis de coração. 

Tornamo-nos, pois, cada vez mais eruditos nestas matérias. Com desplante e imodéstia, teorizamos e manifestamos as nossas emoções quanto à transição entre depressões cujos nomes dominamos na inversa medida do nosso conhecimento científico sobre elas. “A Hermínia não me incomodou muito, já o Ivo e a Jana foram uma maçada; inundaram-me o pátio, derrubaram-me os vasos das plantas, encharcaram-me o corpo e molharam-me a dignidade. Durante o Konrad e o Laurence só saí de casa nos intervalos da chuva. Vamos ver como se porta o Martinho” – dizemos, com a lata e a ignorância de um comentador generalista televisivo. Movemo-nos entre estes nomes como especialistas. Até já sabemos quais os nomes dos próximos fenómenos meteorológicos. 

Preparem-se, pois, para os caprichos dos Nuria, Olivier, Pauline, Rudiger, Salma, Timothe, Vanda e Wolfgang que aí vêm – não fui à bruxa, fui ao IPMA. Não são profecias, são previsões, que são coisa mais científica. Espero que se sintam devidamente impressionados. Se assim for, amanhã irei discorrer sobre o tema, com ar sapiente e sobrolho carregado, no café que frequento. Serei um meteorologista de café e impressionarei os leigos. Se, entretanto, o céu não me cair em cima da cabeça. O que, estou certo, não acontecerá. Não porque o IPMA tenha dito alguma coisa sobre tal possibilidade. Mas porque um prestigiado druida, que todos conhecemos, garantiu que amanhã não será véspera desse dia.

José Gabriel, in Facebook

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.