FACTOR “EXóGENO” — 4 andamentos e um quinto andamento coxo | Jorge Nascimento Rodrigues in “Facebook”

1- Em princípios e meados de 2011 quando se falava do papel do factor “exógeno” (evolução da crise financeira internacional e das políticas ziguezagueantes da dupla Merkozy) e da “sincronização” da crise da dívida soberana nos PIIGS, uma parte dos comentadores irritava-se e insultava porque se desprezava a “sujeira interna”. O que valia era o factor endógeno, a situação interna, o resto era proteger o governo que conduzia à bancarrota.

2- Quando a maré política mudou, o factor exógeno continuou o seu caminho, empurrando a crise portuguesa até um pico de bancarrota iminente em 30 de janeiro de 2013. Então, já não havia crime nessa “exogeneidade”. A culpa de não haver milagre com a reeleição presidencial e a nova maioria governativa era do factor exógeno.

3- Depois os juros da dívida começaram a descer, e o factor exógeno desapareceu, de novo, de cena — agora era o sucesso do ajustamento “interno” que convencera os investidores. Os analistas independentes sublinhavam que era, uma vez mais, o factor exógeno que sobretudo tinha feito descer abruptamente os juros no mercado secundário em relação a Irlanda, Portugal, Espanha e Itália, e mesmo Grécia. Os investidores baixaram o prémio de risco em relação aos periféricos, por duas razoes sucessivas: primeiro, a reestruturação da dívida grega decidida em dezembro de 2011 e o segundo programa de resgate a Atenas anularam o medo de uma saída do euro que pudesse provocar um efeito em cadeia; segundo, desde o verão, Draghi, à frente do BCE, anuncia um programa OMT que servia de bombeiro de ultima instancia aos investidores em caso de necessidade. É claro que nada destas coisas “exógenas” contavam para o que se estava a passar. A narrativa era que o sucesso do ajustamento dera frutos.

4- Subitamente a recessão prolonga-se na zona euro e qualquer “anomalia” política, como o caso Bárcenas em Espanha ou o tsunami recente eleitoral em Itália, afetam, de novo, os juros e o risco. Claro, a partir de agora, voltou o discurso do maldito factor “exógeno”. A culpa do desastre na própria aplicação do plano de ajustamento é culpa “lá de fora”. Do Berlusconi e do Grillo, até. Provavelmente da “incompetência” do professor Monti, essa figura reverendíssima que se verifica agora que entusiasma pouco mais de 10% do eleitorado italiano. Subitamente a “sincronização” dos efeitos pelos periféricos é o culpado. O factor exógeno regressou de alma e coração.

5- O mais espantoso é que os que culpavam o factor exógeno pelos PECs sucessivos e pela quase-bancarrota a que se chegou com o disparo dos juros para os 7% e acima, agora, agorinha, dizem que falar do factor exógeno é querer “limpar” a sujeira do factor interno, da governação atual.

Vá a gente entender esta gente incongruente. (uns dirão, vigaristas e intelectualmente desonestos, em português corrente).

Moral da história —
a) é evidente que o factor “interno” conta (como se vê bem exemplificado na Irlanda que tem crescimento e não recessão e que tem conseguido resolver os pendentes herdados da troika, como a questão das promissórias);
b) mas o determinante no filme da crise das dívidas soberanas desde 2009 é o contexto exógeno: a evolução das políticas de Bruxelas e do BCE desde 2009, desde a dupla Merkozy e as políticas sucessivas, contraditórias, que foram defendendo para a zona euro, bem como o dogmatismo de Trichet e dos banqueiros centrais e dos fãs do austerismo monetário e orçamental convencidos que seria benigno passando pelo erro do FMI no multiplicador implícito, até às manobras que Draghi tem feito para salvar a honra do convento;
c) estando nós subordinados a uma zona monetária e pertencendo a uma União, o determinante é a condução política a esse nível;
d) mesmo sendo bom aluno, os resultados macroeconómicos são péssimos e até os “sucessos” no mercado da dívida são condicionados pelos eventos à escala europeia, como agora bem se vê.

Jorge Nascimento Rodrigues

são dois para lá, dois para cá | Patrícia Reis

Foto de Helmut Newton

Foto de Helmut Newton

O bar podia estar vazio, para ela pouco fazia.

Era um bar de hotel e não tinha história. Era internacional e não asiático, podia ser mais interessante. Não era. A mulher pediu um martini.

Depois desistiu.

Pediu um vodka preto e, na casa-de-banho, verificou que tinha a boca preta, a língua de fora, mesmo perto do espelho, riu-se de si e depois chorou.

Chorou pela língua preta.

Deveria ter bebido o martini e fingir que era uma bond girl nas arábias.

Há dias assim.

http://vaocombate.blogs.sapo.pt/470802.html … (FONTE)

Citando Barack Obama

Salgueiro Maia

Salgueiro Maia

“É graças aos soldados, e não aos sacerdotes, que podemos ter a religião que desejamos. É graças aos soldados, e não aos jornalistas, que temos liberdade de imprensa. É graças aos soldados, e não aos poetas, que podemos falar em público. É graças aos soldados, e não aos professores, que existe
liberdade de ensino. É graças aos soldados, e não aos advogados, que existe o direito a um julgamento justo. É graças aos soldados, e não aos políticos, que podemos votar.”

Barack Hussein Obama – Presidente dos USA, que no baile da cerimónia da sua tomada de posse dançou com uma sargento das FA americanas, enquanto a sua mulher dançava com um sargento.

Do outro lado do espelho, de Maria João Martins

Poesia de Maria João Martins

O meu primeiro livro de poesia. Não o primeiro que li, mas o primeiro que comento neste espaço.

Habituei-me à poesia da blogosfera, que é diferente da poesia em papel. Todos os poemas deviam ser lidos em papel, e de preferência em livro. Não é possível ler-se poesia sobre um vidro que nos pode reflectir. A poesia precisa de papel, de uma página que se vira, do cheiro a tinta impressa, do peso de um livro que nos ocupa as mãos.

Hoje, a poesia da bloga saltou para o papel. Ganhou força. Num livro em que a capa se reflecte na contracapa, sendo espelho de si mesmo, fechado sobre si mesmo. Não espreitamos o que está do outro lado do espelho, simplesmente o folheamos e lemos o seu interior. E descobrimos silêncios, partilhas e a imensidão que sendo humana nos estranha. Interroga-nos com a força do verbo e encanta-nos com a sua melodia.

sabendo-me…
simples poça de água
berço das gotas de chuva.

Seja eu esse silêncio em partilha que encontro na poesia da Maria João. odagirbO.

15 de Maio de 2011

Grândola, Vila Morena e a hipótese comunista | Patrícia Vieira in jornal “Público”

PVO mundo vai mal e Portugal ainda pior. Basta olharmos à nossa volta e, se um empirismo circunstancial não nos convencer, recorrermos às estatísticas: taxa de desemprego acima de 16%, contração do PIB de 3,2% no último ano e 2,5 milhões de portugueses em risco de pobreza ou exclusão social. Não é assim de admirar o regresso da famosa canção de Zeca Afonso, Grândola, Vila Morena, à boca de cena da política nacional. Só nos últimos dias, Grândola foi ouvida por Pedro Passos Coelho no debate quinzenal do Parlamento (15.02), pelo ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, em Vila Nova de Gaia (18.02) e à saída do ISCTE em Lisboa (19.02) e pelo ministro da Saúde, Paulo Macedo, no Porto (20.02). A melodia que pôs em marcha a Revolução dos Cravos tem vindo a ser recuperada por diferentes grupos de manifestantes para protestar contra as políticas do Governo e os ditames da troika.

Vale a pena fazer uma pausa neste mar de protestos para refletir sobre a apropriação do imaginário revolucionário no presente. Por que razão nos remetem os manifestantes para a canção de Zeca Afonso? O que significa Grândola para Portugal nos dias que correm? E, mais importante ainda, será que a “hipótese comunista” que a canção evoca é ainda viável? Destacarei, entre inúmeras outras, três conotações distintas, se bem que relacionadas, de Grândola, Vila Morena, que tornam esta música particularmente eficaz como catalisador de protestos e que nos permitem utilizá-la como ponto de partida para uma análise do momento sócio-político que atravessamos.

Em primeiro lugar, Grândola evoca um sentimento de nostalgia em relação a um acontecimento heróico da história portuguesa recente. Temos saudades de um passado não tão distante em que todos distinguíamos claramente o bem (a democracia) do mal (o Estado Novo e a Guerra Colonial). Temos saudades de acreditar que podemos tomar decisões coletivas para mudar o nosso futuro e de que este será melhor do que o presente. E temos acima de tudo saudades do próprio futuro, da ideia de que existem portas abertas.

Em segundo lugar, a canção de Zeca Afonso apela para uma revitalização da atividade política. O slogan “o povo é quem mais ordena” assinala que as deliberações políticas não cabem apenas a uma elite, muitas vezes manipulada por interesses económicos que não os da população em geral. Grândola invoca uma política feita pelos cidadãos e pautada pelos objetivos da comunidade. A soberania popular, que implica a participação direta de todos nas decisões que os afectam, é uma das soluções mais promissoras para sairmos do impasse político em que tanto Portugal como a União Europeia se encontram atolados.

Por fim, Grândola funciona como uma metonímia da “hipótese comunista”. Esta expressão, cunhada pelo filósofo francês Alain Badiou, remete-nos para a o princípio de igualdade (“Em cada esquina, um amigo / Em cada rosto, igualdade”), ou seja, para a noção de que a apropriação da riqueza produzida por todos por um grupo cada vez menor de pessoas é fundamentalmente injusta. A “hipótese comunista” é um princípio regulador tanto da economia como da política e não um esquema de organização social (o erro do comunismo soviético foi precisamente ter-se apropriado desta ideia para justificar um estado totalitário). Cabe a cada sociedade decidir como melhor concretizar a “hipótese comunista” de igualdade e justiça social.

Nestes tempos de transferência maciça de fundos do Estado para o sector privado, seja através de privatizações de empresas públicas, seja através do resgate de bancos com fundos públicos, passando depois a fatura para os contribuintes, não surpreende que a “hipótese comunista” surja como uma alternativa viável ao statu quo. Os nossos governantes continuarão certamente a ouvir cantar Grândola, Vila Morena nas suas futuras intervenções públicas.

(Universidade de Georgetown – www.patriciavieira.net)

http://www.publico.pt/ … (FONTE)

Justyna Kopania | Biografia

Justyna Kopania

My name is Justyna Kopania. I am a painter. Art is my asylum, life, poetry, music, the    best cigar, tasty strong tea, everything.My Art reflects the world I perceive with all mysenses; people I meet and love; nature I admire, and all the things that affect the way I am.The Man is my main inspiration and This Man is the principal topic of my project. I am focusing on Their psyche, attitudes, as well as Their appearance, manners and all the complex processes that take place both outside and inside the Man.I cannot imagine existing without my art, my paintings, my inspirations – it is, and will be, an intrinsic part of my life. I prefer oil painting on huge canvases. People from all around Europe find the pieces of their selves in my works and are impressed with the sincerity and truth expressed through them.In my studio – work – I paint a few, sometimes  several hours a day. This is typical painting – easel, oil, structural. Paintings are “fleshy.” Paint requires both painting, as well as brushes – and I do not regret the paint. Paintings are painted this way – creates a kind of reliefs. Paintings are painted in a sort of style, original … – Inspired by certain  passages of what I see, and stay in my memory. Paitings are entirely painted by hand. I always try to give the climate the moment that stuck in my memory.

http://studiounderthemoon.webs.com/… (FONTE)

A influência russa na literatura brasileira | por Adelto Gonçalves, doutorado em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo

I

            Que a literatura russa influenciou boa parte da literatura produzida no Brasil, especialmente no final do século XIX e na primeira metade do século XX, nenhum crítico de bom senso pode colocar em dúvida. Até que ponto chegou essa influência e como seu deu, pois, na maioria, por desconhecimento do idioma russo, os autores tiveram acesso apenas a traduções de segunda mão do francês, é que nunca ninguém havia estabelecido.

Essa questão, porém, já está devidamente esclarecida e aprofundada, depois da pesquisa de proporções ciclópicas empreendida pelo professor Bruno Barretto Gomide em sua tese de doutoramento apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em junho de 2004, que saiu em livro em 2011 pela Editora da Universidade de São Paulo (Edusp): Da estepe à caatinga: o romance russo no Brasil (1887-1936), Prêmio Jabuti 2012, da Câmara Brasileira do Livro, na categoria Teoria e Crítica Literária.

As fontes deste livro foram extraídas de arquivos particulares de escritores e de uma extensa pesquisa que o estudioso fez em jornais, revistas e livros publicados entre 1887 e 1936, valendo-se também de consulta não só em arquivos públicos e de universidades em Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro como nos Estados Unidos, especialmente nas bibliotecas das universidades de Illinois, Indiana, Stanford e Califórnia.

Neste livro, a recepção da literatura russa no Brasil é estudada a partir de dois eixos: pesquisa documental da recepção crítica do romance russo e estudo da vasta bibliografia comparatista que lida com outros casos de recepção da literatura russa no Ocidente. Tudo isso acompanhado pelas discussões específicas fornecidas pela crítica literária e pela historiografia da cultura brasileira, como observa o autor na introdução.

Os primeiros textos que utilizavam os romancistas russos como contraponto a questões literárias candentes no Brasil datam da segunda metade da década de 1880. Já o final da década de 1930 marca um momento em que tais discussões perdem sua força e deixam de ser relevantes para a crítica. O trabalho conta ainda com um anexo que reproduz algumas fontes significativas, privilegiando as de mais difícil acesso.

II

            É observar que a chegada do romance russo ao Brasil foi uma consequência marginal de um processo internacional iniciado na França, que o tornou uma sensação europeia em meados da década de 1880. Foi quando surgiram as traduções em escala industrial e livros de crítica que assinalavam a recepção desses romances em língua francesa.

Gomide aponta o ensaio O Romance Russo, de Eugène-Melchior de Vogüé (1848-1910), publicado em 1886, como o elemento basilar dessa recepção, pois era a ele que recorria a maior parte dos ensaístas, inclusive no Brasil. Entre os romancistas brasileiros, Lima Barreto (1881-1922) foi o que mais se deixou influenciar pelas ideias que o romances russos traziam implícitas, especialmente a partir do prefácio que Vogüé escreveu para Recordações da Casa dos Mortos, de Dostoiévski (1821-1881).

O pesquisador observa que já havia conhecimento da literatura russa no Brasil antes mesmo da década de 1880, mas esses contatos se davam em escala diminuta. A partir daquela data, o seu “surgimento súbito” no País, em função do que ocorria na França, passou a atiçar a criação de uma literatura genuinamente nacional, como observaram ao tempo José Carlos Jr. (?-?), um crítico paraibano hoje quase esquecido e justamente “ressuscitado” por Gomide, e Clóvis Bevilacqua (1859-1944). Mas, como constata Gomide, essa interpretação não foi unânime. Para Tobias Barreto (1839-1889), por exemplo, os romancistas russos eram a negação de tudo o que a cultura francesa representava.

Para Silvio Romero (1851-1914), os russos seriam também o melhor exemplo antípoda de Machado de Assis (1839-1908). Se o escritor fluminense construía delicados estados psicológicos de suas personagens à maneira do francês Paul Charles Joseph Bourget (1852-1935), Romero fazia o contraste com a estética radical do choque, exemplificada por Edgar Allan Poe (1809-1849) e Dostoiévski, observa Gomide. E acrescenta: para Romero, o autor fluminense ficava “bem abaixo de Dostoiévski, Poe e até de Hoffmann (1766-1822), quando este envereda, como o próprio Machado diria, pelo distrito da patologia literária”.

Portanto, o caráter inovador da prosa russa foi imediatamente detectado pelos críticos brasileiros, que passaram a utilizá-lo largamente como termo de comparação em suas críticas e recensões. E até a apresentá-lo como um modelo de emancipação    para a literatura brasileira.

III

Na primeira parte de seu livro, Gomide trata da divulgação dos romancistas russos a partir da metade dos anos 1880, especialmente de 1883 a 1886. E apresenta exemplos do aumento vertiginoso do número de traduções e do entusiasmo nos meios intelectuais pelo novo fenômeno literário. Mostra ainda que, quando a revolução de 1917 assustou o mundo, já havia no Brasil uma tradição de três décadas de discussão do romance russo em periódicos e livros de crítica.

Portanto, associar autores como Dostoiévski, Turgueniev (1818-1883), Leon Tolstói (1828-1910) e Alexandr Pushkin (1799-1837) ao bolchevismo só podia partir de mentes obnubiladas, o que não é de admirar, pois, à época da última ditadura militar (1964-1985), o livro Juan Rulfo: Autobiografia Armada (Buenos Aires, Corregidor, 1973), de Reina Roffé, teve a sua importação barrada, por volta de 1975, porque o censor fez uma interpretação beligerante da palavra “armada”, quando o título queria dizer apenas que a autobiografia havia sido “armada” com declarações do escritor retiradas de entrevistas publicadas em épocas diversas. Santa ignorância…

Na segunda parte de seu trabalho, Gomide estuda as décadas de 1920 e 1930, quando era flagrante o impacto da revolução bolchevique. E mostra claramente que, ao contrário do que se supõe, a literatura russa nunca foi uma espécie de patrimônio da esquerda, pois intelectuais católicos, como Alceu de Amoroso Lima (1893-1983), Tasso da Silveira (1895-1968) e Jackson Figueiredo (1891-1928), já discutiam sua influência na literatura mundial, especialmente a partir de Dostoiévski, Máximo Górki (1868-1936) e Leon Tolstói.

A segunda parte do livro apresenta, além de um panorama do mercado editorial da década de 1930, textos que desconfiam abertamente das interpretações geradas no fim do século e tentam cercar os romancistas russos por outros ângulos. E contestam a ideia de que o niilismo de Dostoievski e de outros escritores russos teria preparado terreno para o avanço do comunismo e a vitória dos bolcheviques em 1917, apenas porque a literatura russa sempre esteve associada a questões sociais. Na conclusão, Gomide defende que é anacrônico reler os primeiros momentos da recepção da literatura russa no Brasil de acordo com os resultados posteriores à revolução de 1917.

Como o livro vai até 1936, fora da análise de Gomide fica o recente renascimento do interesse do leitor brasileiro pelo romance russo que, a rigor, deu-se depois do lançamento, em 2001, da primeira tradução de Crime e Castigo, de Dostoiévski, feita diretamente do russo por Paulo Bezerra, pela Editora 34, de São Paulo. Em seguida, saíram vários livros traduzidos diretamente do russo por Paulo Bezerra, Boris Schnaiderman, Fátima Bianchi, Lucas Simone e outros. Em 2011, saiu também Gente Pobre, de Dostoiévski, com tradução de Luíz Avelima, pela editora Letra Selvagem, de Taubaté-SP.

IV

            Bruno Gomide (1972) é doutor em Letras pela Unicamp, com estágio de doutorado na Universidade da Califórnia, em Berkeley. Realizou cursos nas universidades de Illinois, Indiana, Cambridge e Linguística de Moscou. Foi pesquisador-visitante no Instituto Gorki de Literatura Mundial, em Moscou, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (Fapesp). É o organizador do grupo de trabalho de Literatura Russa da Associação Brasileira de Literatura Comparada (Abralic).

Organizou a Nova Antologia do Conto Russo (1792-1998), lançada recentemente pela Editora 34, que reúne nomes conhecidos no Brasil como Pushkin, Gógol, Dostoiévski, Tchekhov, Tolstói, Pasternak, Bábel e Nabókov e outros menos conhecidos, como Odóievski, Grin, Chalámov, Kharms, Platónov e Sorókin, num total de 40. Tem publicado artigos em periódicos internacionais, como Tolstoy Studies Journal eVopróssi Literaturi, e participado dos principais congressos de eslavística.

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 DA ESTEPE À CAATINGA: O ROMANCE RUSSO NO BRASIL (1887-1936), de Bruno Barretto Gomide. 1ª ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo (Edusp), 768 págs., 2011, R$ 120,00.

E-mail: edusp@usp.br

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(*) Adelto Gonçalves é doutor em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo e autor de Gonzaga, um Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999),Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002) e Bocage – o Perfil Perdido (Lisboa, Caminho, 2003). E-mail: marilizadelto@uol.com.br

Almeirim | Exposição fotográfica pelo olhar de Fátima Condeço

expo_fatimaFátima Condeço inaugurou na sexta feira, dia 22 de Fevereiro,  a Exposição de Fotografia intitulada “Hoje não…” na Galeria Municipal de Almeirim.

Professora de Ciências Naturais na Escola 2, 3 Febo Moniz em Almeirim mas com a fotografia com hobby, despertou desde cedo o interesse por fotografar não o fazendo por negócio ou faturação mas sim por puro prazer. Premiada a nível nacional por diversas vezes, conta no seu portefólio a exposição fotográfica comemorativa do 55º aniversário do jornal O Almeirinense em 2010.

A exposição “Hoje não…” compõe-se de uma mostra de 22 fotografias em redor do retrato, a temática vista no olho até ao extremo do nem por isso. Mais um evento cultural em Almeirim divulgando assim o trabalho desta talentosa cidadã.

Este evento decorre até dia 30 de Março e conta com o olhar atento de todos os visitantes.

http://www.almeirinense.com … (FONTE)

Liberdade, onde estás, quem te demora? | José Pacheco Pereira in “Público”

kjhhNão é bom viver no Portugal onde reina o engano e a mentira institucionalizada.

Este artigo é um panfleto. Não acrescenta nada de novo àquilo que digo há mais de dois anos, pelo que não tem interesse mediático. Não é distanciado, nem racional, nem equilibrado, nem paciente, nem tem um átomo da imensa gravitas de Estado que enche a nossa vida pública no PS e no PSD, cheia daquilo a que já chamei redondismo e pensamento balofo.

http://www.aofa.pt/rimp/Pacheco_Pereira_Liberdade_onde_estas.pdf   (FONTE)

Uma sombra de medo | Rui Bebiano in “A Terceira Noite”

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De repente, uma sombra de medo começou a pairar sobre as cabeças de muitos dos nossos políticos de tribuna e comentadores de cátedra. Um medo não declarado, mas certo e percetível. Medo da atual vaga de protestos «antidemocráticos» e não conduzidos – materializados, veja-se a desfaçatez, na propagação pacífica da bela canção de fraternidade que anunciou o fim da velha ditadura – poder mostrar ao comum dos cidadãos que o exercício da democracia não se limita a depositar o voto na urna e, de seguida, a hibernar durante quatro anos com a consciência tranquila e a boca fechada. Passando uma procuração com plenos poderes aos governantes e aos deputados eleitos, inimputáveis durante toda uma legislatura ainda que já nem se recordem do rosto dos seus eleitores e, sem ponta de vergonha, rasgado o contrato que com eles assinaram.

Mas bem mais do que a presença do protesto imprevisível, sonoro, irrefreável, que consideram perverso e inadmissível só porque não concebem a autoridade política fora da redoma «representativa» consignada em Diário da República, preocupa-os a possibilidade, na situação extrema que vivemos, de as pessoas comuns compreenderem que têm mais poder do que aquele que acreditavam possuir, e, ainda pior para eles, de perceberem que existe política para além dos programas vagos, repetitivos, irresponsáveis e descartáveis com os quais tantos eleitores têm sido iludidos. Perturba esta espécie de gente, que da democracia possui uma visão estreita e sitiada, a possibilidade mínima do fim da reverência e da submissão projetarem a possibilidade de um mapa político novo e dotado de novos equilíbrios. Numa paisagem que sejam incapazes de compreender, de explicar e, para eles o mais intolerável, de controlar.

http://aterceiranoite.org/2013/02/23/uma-sombra-de-medo/ … (FONTE)

Se Tenho Medo | John Keats

se
Se tenho medo de meus dias terminar
antes de a pena me aliviar o espírito, antes
de muito livro, em alta pilha, me encerrar
os grãos maduros como em silos transbordantes;
se vejo, nas feições da noite constelar,
enormes símbolos nublados de um romance
e penso que não viverei para copiar
as suas sombras com a mão maga de um relance;
quando sinto que nunca mais hei de te ver,
formosa criatura de um momento ideal!
Nem hei de saborear o mítico poder
do amor irrefletido! – então no litoral
do vasto mundo eu fico só, a meditar,
até ir Fama e Amor no nada naufragar.

Carlos Carvalhas acredita que se a União Europeia tivesse cedido a José Sócrates – ao não pedir resgate – a história tinha sido outra, porque Merkel e Trichet teriam cedido e não deixariam cair Portugal.

Carlos Carvalhas

Carlos Carvalhas

Entrevista a Carlos Carvalhas

Carlos Carvalhas admite que venha a ser necessária uma plataforma de emergência pós-eleições que reúna no governo PCP, Bloco de Esquerda, PS, independentes e outras forças. O antigo secretário-geral do PCP defende que PSD, CDS-PP e PS continuam com ilusões de que o país vai recuperar com as medidas que estão a ser seguidas.
Aos 71 anos, o homem que foi líder do PCP entre 1992 e 2004 e que foi deputado durante 20 anos afirma que o seu partido “não é doido nem aventureiro”, sendo essencial renegociar a dívida. Carvalhas acredita que se a União Europeia tivesse cedido a José Sócrates – ao não pedir resgate – a história tinha sido outra, porque Merkel e Trichet teriam cedido e não deixariam cair Portugal.Nesta entrevista conduzida pela jornalista Maria Flor Pedroso, Carlos Carvalhas considera que este governo só se mantém porque o Presidente da República, Cavaco Silva, é “um Conselheiro Acácio”. “Se houvesse eleições, este governo seria corrido”, afiança. O BPN foi outro dos assuntos abordados. Pelas contas de Carvalhas, o banco implica 8 mil milhões de euros, o dobro do que vão cortar, e a banca continua sem pagar os juros da sua recapitalização. Cortar no carro do ministro é importante, mas são “tremoços”.Foto: Antena1
2013-02-22

Bombeiros prometem não participar mais de ações de despejo na Espanha

foto_mat_40393Agrupamentos de bombeiros nas regiões de Madri, Catalunha e Galícia anunciam que não participarão mais de despejos, que têm ocorrido com mais frequência na Espanha devido à crise econômica. Decisão foi impulsionada por bombeiros da cidade galega de Corunha, que se recusaram a entrar na casa de uma octogenária que não havia pagado o aluguel.
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21644 … (FOTO)

PS (Política Surrealista) | Boaventura Sousa Santos

BSSPor que é que um cidadão de esquerda, preocupado com o rumo que o país está tomar, temendo que a distância dos cidadãos em relação ao sistema político democrático se agrave, inconformado com a falta de unidade entre as forças de esquerda sociologicamente maioritárias, tem dificuldade em conter a raiva ante as insondáveis uniões divisionistas e divisões unitaristas do PS?

Por três razões. Primeiro, sentimento de impotência: sabe que se der um murro na mesa o único efeito possível é magoar-se, tal a incapacidade do partido em distinguir luta política de luta por cargos políticos. Segundo, sensação de perigo: o país precisa de uma alternativa política e o PS parece apostado em desistir dela antes mesmo de tentar. Terceiro, inconformismo ante o desperdício da oportunidade: o PS tem algum potencial para reinventar-se como partido de esquerda, um potencial muito limitado e problemático, mas mesmo assim existente.

Só esta última razão permite transformar a raiva em esperança, mesmo que esta mal se distinga do desespero. Dois factos bloqueiam esse potencial e outros dois podem ativá-lo. O primeiro bloqueio decorre da qualidade dos líderes. A estatura de Mário Soares criou uma sombra difícil de dissipar. Os líderes que se seguiram distinguiram-se mais pela integridade ética do que pela coragem política (Vítor Constâncio, Jorge Sampaio e António Guterres). O mais lúcido e corajoso de todos, Ferro Rodrigues, foi assassinado politicamente de forma sumária e vergonhosa.

O segundo bloqueio advém da perda de cultura socialista (e até de cultura geral) entre os dirigentes, o que amortece as clivagens políticas e aguça as clivagens pessoais. Quem não for militante do PS não entende a hostilidade entre José Sócrates e António José Seguro, quando ambos são produto da mesma terceira via (entre capitalismo e capitalismo) que vergou os partidos socialistas europeus às exigências do neoliberalismo e os fez vender a alma do Estado de bem-estar social. Seguro está condenado a continuar Sócrates em piores condições. Causa arrepios pensar que não frustrará as expectativas apenas por estas serem nulas.

O primeiro facto potenciador de transformação no PS é o contexto europeu e mundial. O Sul da Europa, o Médio Oriente e o Norte de África são as faces mais visíveis da vertigem predadora de um capitalismo selvagem que só se reconhece na extração violenta dos recursos humanos e naturais. É agora mais visível que o socialismo democrático foi construído contra a corrente, com muita luta e coragem que a Guerra Fria foi tornando desnecessárias. Tornou-se então claro que a coragem e a vontade de luta dos socialistas se tinham transformado, elas próprias, num instrumento da Guerra Fria, capazes de se exercitar contra comunistas e esquerdistas mas nunca contra capitalistas. É bem possível que não sejam os socialistas a reinventar o socialismo democrático. Uma coisa é certa: a ideia de um outro mundo possível nunca foi tão urgente e necessária, e reside nela a última reserva democrática do mundo.

O segundo facto potenciador é que os socialistas portugueses já mostraram estar conscientes de que qualquer vitória que o atual líder lhes proporcione a curto prazo será paga no futuro com pesadas derrotas. Os militantes socialistas jovens e pobres – que (ainda não enriqueceram no governo nem nas empresas – leram com atenção o livro de António Costa, Caminho Aberto, publicado em 2012, e ficaram tão impressionados como nós com a experiência governativa, lucidez política, capacidade de negociação com adversários, revelada pelo autor num livro que retrata como poucos o Portugal político dos últimos 20 anos e abre pistas luminosas sobre os desafios que a sociedade portuguesa enfrenta. Devem sentir, como nós, a dificuldade em conter a raiva.

Poderão dar um murro na mesa e terem algum efeito além de se magoarem? A tragédia do socialismo democrático atual é ser um fogo apagado que só reacende as brasas quando troca a coragem política pela ética, como se a coragem política não fosse eminentemente ética.

Ler mais:

http://visao.sapo.pt/ps-politica-surrealista=f711257#ixzz2LfAxL5py … (FONTE)

O roubo do presente | José Gil in “Visão”

José Gil 2“Nunca uma situação se desenhou assim para o povo português: não ter futuro, não ter perspetivas de vida social, cultural, económica, e não ter passado porque nem as competências nem a experiência adquiridas contam já para construir uma vida. Se perdemos o tempo da formação e o da esperança foi porque fomos desapossados do nosso presente. Temos apenas, em nós e diante de nós, um buraco negro.

O «empobrecimento» significa não ter aonde construir um fio de vida, porque se nos tirou o solo do presente que sustenta a existência. O passado de nada serve e o futuro entupiu.

O poder destrói o presente individual e coletivo de duas maneiras: sobrecarregando o sujeito de trabalho, de tarefas inadiáveis, preenchendo totalmente o tempo diário com obrigações laborais; ou retirando-lhe todo o trabalho, a capacidade de iniciativa, a possibilidade de investir, empreender, criar. Esmagando-o com horários de trabalho sobre-humanos ou reduzindo a zero o seu trabalho.

O Governo utiliza as duas maneiras com a sua política de austeridade obsessiva: por exemplo, mata os professores com horas suplementares, imperativos burocráticos excessivos e incessantes: stresse, depressões, patologias border-/ine enchem os gabinetes dos psiquiatras que os acolhem. É o massacre dos professores. Em exemplo contrário, com os aumentos de impostos, do desemprego, das falências, a política do Governo rouba o presente de trabalho (e de vida) aos portugueses (sobretudo jovens).

O presente não é uma dimensão abstrata do tempo, mas o que permite a consistência do movimento no fluir da vida. O que permite o encontro e a intensificação das forças vivas do passado e do futuro – para que possam irradiar no presente em múltiplas direções. Tiraram-nos os meios desse encontro, desapossaram-nos do que torna possível a afirmação da nossa presença no presente do espaço público.

Atualmente, as pessoas escondem-se, exilam-se, desaparecem enquanto seres sociais. O empobrecimento sistemático da sociedade está a produzir uma estranha atomização da população: não é já o «cada um por si», porque nada existe no horizonte do «por si». A sociabilidade esboroa-se aceleradamente, as famílias dispersam-se, fecham-se em si, e para o português o «outro» deixou de povoar os seus sonhos – porque a textura de que são feitos os sonhos está a esfarrapar-se. Não há tempo (real e mental) para o convivio. A solidariedade efetiva não chega para retecer o laço social perdido. O Governo não só está a desmantelar o Estado social, como está a destruir a sociedade civil.

Um fenómeno, propriamente terrível, está a formar-se: enquanto o buraco negro do presente engole vidas e se quebram os laços que nos ligam às coisas e aos seres, estes continuam lá, os prédios, os carros, as instituições, a sociedade. Apenas as correntes de vida que a eles nos uniam se romperam. Não pertenço já a esse mundo que permanece, mas sem uma parte de mim. O português foi expulso do seu próprio espaço continuando, paradoxalmente, a ocupá-lo. Como um zombie: deixei de ter substância, vida, estou no limite das minhas forças – em vias de me transformar num ser espetral. Sou dois: o que cumpre as ordens automaticamente e o que busca ainda uma réstia de vida para os seus, para os filhos, para si.

Sem presente, os portugueses estão a tornar-se os fantasmas de si mesmos, à procura de reaver a pura vida biológica ameaçada, de que se ausentou toda a dimensão espiritual. É a maior humilhação, a fantomatização em massa do povo português.

Este Governo transforma-nos em espantalhos, humilha-nos, paralisa-nos, desapropria-nos do nosso poder de ação. É este que devemos, antes de tudo, recuperar, se queremos conquistar a nossa potência própria e o nosso país.”

http://visao.sapo.pt … (FONTE)

José Pacheco Pereira: “As pessoas que nos governam não conhecem Portugal” in “Quadratura do Círculo”

kjhhAs razões porque este exercício do governo está a falhar é porque lhe falta uma dimensão política; tem que haver consistência política entre queixarmo-nos de um orçamento europeu de contenção e defendermos o contrário cá dentro sem que ninguém se deva queixar, entre sermos keynesianos lá fora e hayekianos cá dentro.

As pessoas que nos governam há ano e meio não conhecem Portugal, são uma coligação entre tecnocratas e ignorantes e seria possível, sem pôr em causa os objectivos orçamentais, não destruir o tecido económico existente sem construir nada ao lado.
A maneira com o fisco trata os portugueses raia um estado totalitário, podendo saber-se tudo sobre a vida de uma pessoa a partir de um número de contribuinte, o que coloca um número de questões e não há nenhum pensamento político sobre esta questão (e a oposição também não o tem).
A classe média está destruída e a empobrecer, havendo uma enorme desautorização do Estado e das instituições e um desrespeito pela política e pelos políticos.”

Citando Viviane Reding

Viviane Reding

Viviane Reding

“Feliz é o país que protesta com uma canção”

Viviane Reding

Viviane Reding é uma política luxemburguesa que ocupa atualmente o cargo de comissária europeia de Justiça, Direitos Fundamentais e Cidadania, sendo igualmente a primeira Vice-Presidente da Comissão Europeia. Wikipedia
Nascimento: 27 de abril de 1951 (61 anos), Esch-sur-Alzette
Educação: Universidade de Paris

NO CENTENÁRIO DE ÁLVARO CUNHAL | José Pacheco Pereira in “Público”

acunhalA personalidade de Álvaro Cunhal merece neste ano do seu centenário um conhecimento menos preso à mitologia, quer hagiográfica, quer hostil, para poder devolver-se à memória histórica dos portugueses um homem real e bem pouco comum, em vez de uma abstracção mecânica, que, essa sim, será rapidamente esquecida. Ora, nos anos desta década infeliz, precisamos bem dessa memória mais profunda e complexa da história, para não nos embrutecermos mais do que o que já estamos.

José Pacheco Pereira

http://abrupto.blogspot.pt/2013/02/no-centenario-de-alvaro-cunhal-deixado.html … (FONTE)

O Homem do Turbante Verde, de Mário de Carvalho

“Quanto ao professor, estava manifestamente a mais nesta fase da expedição e todos pareciam concordes com isso.”

A trama parece, desde o início, revelar o seu desfecho final, como se no plot traçado não tivesse implícito um volt face. Uma mestria que faz destes contos uma verdadeira aventura para o leitor. São vários os ambientes percorridos por estas narrativas, desde os mais exóticos, ao conturbado período de sobrevivência à ditadura portuguesa. Em todos, um tema comum, uma certa crueldade que parece contida na mente e atitudes dos homens, que se liberta ao sabor do acaso ou do destino. Um mal sem objectivo aparente ou moral assertiva.

A escrita destas narrativas curtas é cuidada e clara, dotada de apontamentos fora do léxico comum que reforçam o ritmo da acção. “Num instante, a multidão oscilou, dividiu-se, sombras correram, a vaia modelou-se em vozeios diferenciados, crepitaram ruídos corridos de passos, desaustinaram tropeios de botas.” E tudo ficou dito sobre a multidão em fuga sujeita a uma carga policial. Toda a emoção e toda a tensão num ritmo desaustinado, num relato perfeito. Dispensam-se mais palavras.

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Fechado para almoço

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Todos se espantam quando digo que aqui em Fartura as farmácias fazem plantão até às 22h. Perguntam-me e depois, como é que faz. Não faz. Pode-se bater à porta do farmacêutico. Pode-se também ir ao Pronto-Socorro, que está pronto a socorrer qualquer um. Só não garante cura. Sequer alívio. Mas a crônica é outra.

Em Apucarana há um restaurante que fecha pra almoço. O leitor não está a enxergar mal. Se se vai ao tal restaurante para almoçar, não almoça-se. Uma plaquinha atenta para o fechamento temporário.

Mas a gerência já providencia melhoras: especificando hora de retorno, construindo uma área de espera com uma recepcionista especialmente contratada para o serviço de recepcionar quaisquer famélicos clientes, estacionamento mais amplo dividido por categorias: 1ª) “Clientes da manhã” (que abarca os que querem frutas ao acordar); 2ª) “Clientes da espera” (àqueles que chegam ao restaurante entre meio-dia e duas da tarde); 3ª) “Clientes noturnos” (que podem ser tanto os que chegam para o almoço quanto os que vão jantar); e 4ª) “Clientes esporádicos” (àqueles que surgem de quando em vez apenas a petiscar), além de reformas para maior conforto da clientela.

Com toda essa preocupação, é de se considerar justificável a ausência da equipe do restaurante, pois, como ensinam os pais, para tudo tem hora.

‎As Menízias do Ninhou nestes passos | As Mantas de Minde nos nossos dias | Museu de Aguarela Roque Gameiro – Minde

mantas

No próximo sábado, dia 23 de fevereiro, às 15h, no Atelier de Desenho e Pintura, abrirá ao público a exposição. A função das mantas como proteção contra o frio, mantém-se. Hoje, abrem-se novas oportunidades da sua utilização.
No entanto, mantemos os padrões, a textura, a matéria-prima (lâ 100% portuguesa), os processos de tingimento e de fabrico, sempre a pensar na qualidade e beleza das verdadeiras “Mantas de Minde”.
Venha descobrir os novos produtos.
A entrada é livre.

Correntes d’ Escritas abre hoje as portas | Póvoa do Varzim

CE

Começa hoje à noite, na Póvoa de Varzim, a 14ª edição do Festival Literário Correntes d”Escritas que este ano vai homenagear os escritores Urbano Tavares Rodrigues e Manuel António Pina.

A edição deste ano contará com a presença de mais de 50 escritores (de Portugal, Angola, Espanha e Brasil), tradutores, editores, designers, ilustradores, jornalistas que se vão espalhar por várias escolas da cidade, por mesas redondas, onde se vai debater literatura, e pelos vários lançamentos de livros que decorrem durante os três dias que dura o evento.

Este ano serão muitas as estrelas do firmamento literário de a marcar presença no festival. Entre eles estarão a brasileira que venceu o último prémio Saramago, Andrea del Fuego, os espanhóis Ignácio Martínez de Píson, Susana Fortes e Domingo Villar, os portugueses , António Mega-Ferreira, Vasco Graça Moura, Valter Hugo Mãe, Hélia Correia, Rui Zink, Richard Zimmler ou Nuno Camarneiro (prémio Leya) num evento em que a poesia estará em destaque.

Ler mais:

http://josesaramago.org/384111.html … (FONTE)

Citando Clarice Lispector

Clarice Lispector

Clarice Lispector

“Há três coisas para as quais eu nasci e para as quais eu dou minha vida. Nasci para amar os outros, nasci para escrever, e nasci para criar meus filhos. O ‘amar os outros’ é tão vasto que inclui até perdão para mim mesma, com o que sobra. As três coisas são tão importantes que minha vida é curta para tanto.” –Clarice Lispector (imagem: site oficialwww.claricelispector.com.br)

John Locke: o direito de resistir à tirania | por Irene Pimentel

A citação de Thomas Jefferson (Declaração de Independência dos EUA, 1776), feita por
José Gomes André, no blogue «Delito de Opinião» (08.09.12), levou-me a reler parte dos Dois Tratados sobre o Governo (1689), de John Locke (1632-1704), filósofo que os actuais neo-liberais tanto gostam de citar (está em inglês, porque não encontrei uma boa tradução portuguesa).

«Whenever the power that is put in any hands for the government of the people, and the protection of our properties, is applied to other ends, and made use of to impoverish, harass or subdue them to the arbitrary and irregular commands of those that have it; there it presently becomes tyranny, whether those that thus use it are one or many». (Second Treatise, Chapter 18).

«But if a long train of abuses, prevarications and artifices, all tending the same way, make the design visible to the people, and they cannot but feel, what they lie under, and whither they are going, ‘tis not to be wondered, that they should then rouse themselves, and endeavour to put the rule into such hands, which may secure to them the ends for which government was at first enacted». (Second Treatise, Chapter 19).

Para Locke, o governo civil legítimo é instituído pelo consentimento explícito dos governados, que decidem transferir para ele, por acordo, o seu direito de executar a lei de natureza e de julgar seu próprio caso. Estes são os poderes que são dados ao governo central e que legitimam a função do sistema da justiça dos governos. Todavia, a transferência dos direitos naturais para o Estado, representada pelo pacto originário, é parcial. Ao ingressar no estado civil, os indivíduos renunciam a um único direito: o de fazer justiça pelas suas próprias mãos. Conservam todos os outros, principalmente o direito à propriedade, que já nasceria perfeita no estado de natureza, fruto de uma acção natural – o trabalho -, que não dependeria do reconhecimento alheio.
Dado que, no estabelecimento do governo civil, o consentimento universal é necessário para dar forma a uma comunidade política e que uma vez concedido não pode ser retirado, alguns fazem uma leitura da comunidade política lockeana enquanto uma entidade estável. No entanto, outros observam que existe, em Locke, o direito a resistir ao governo ilegítimo. Nas circunstâncias de um governo ilegítimo, que viole a vida, a liberdade e a propriedade do povo, a rebelião é legítima. Para Locke, todo o poder político legítimo deriva somente do consentimento dos governados que confiam as suas «vidas, liberdades, e posses» à comunidade como um todo, expressa esta maioritariamente pelo seu corpo legislativo. Mas a comunidade política como um todo pode ser dissolvida (e uma nova pode ser formada) sempre que haja uma mudança fundamental nos membros da legislatura ou uma violação das leis. O soberano que, contrariando o poder supremo por ele representado, desrespeita a lei, perde o direito à obediência, «pois que não devem os membros [do corpo político] obediência senão à vontade pública da sociedade».
Locke admite assim o direito de insurreição em determinadas circunstâncias: «Se um governo subverte os fins para os quais foi criado e se ofende a lei natural, então pode ser deposto». Na visão de Locke, a possibilidade de revolução é uma das características de qualquer sociedade civil bem formada. A causa mais provável da revolução é o abuso do poder pelo próprio governo: quando a sociedade interfere erradamente nos interesses de propriedade dos cidadãos, estes têm de se proteger retirando-lhe o consentimento (Segundo Tratado, § 222).Ocorre uma usurpação quando alguém se apodera pela força daquilo a que outro tem direito ou prejudica o bem público. Quando são cometidos grandes erros na governação de uma comunidade, só a rebelião mantém uma promessa de restauração dos direitos fundamentais (Segundo Tratado, § 225).
Quem é o juiz disso quando tal ocorre? Só o povo pode decidir, segundo Locke, pois que a existência mesmo da ordem civil depende do seu consentimento (Segundo Tratado, § 240). Locke conclui que, «se em alguns casos é permitido resistir, nem toda resistência aos príncipes é rebelião», sendo por isso muito importante saber quando é lícito desobedecer. O direito de resistência não constitui perigo para os governantes justos e numa sociedade civil política justa, não é possível que um ou mais homens perturbem um governo se o interesse colectivo não estiver em risco. Só quando os malefícios da tirania atingem a maioria da sociedade, então existe o direito à resistência contra a força ilegal. São os tiranos que são os verdadeiros rebeldes e, dessa forma, os malefícios que resultarem da resistência aos verdadeiros rebeldes não podem ser creditados aos defensores da própria liberdade. Se o fim do governo é o bem da humanidade, não pode haver tolerância à tirania.
locke

Filarmónica Fraude | E Tudo Acabou em 69 | Editora Guerra e Paz

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Este é um livro que conta a história – curta mas cheia de grandes episódios – da Filarmónica Fraude, uma banda de rock portuguesa que marcou o fim dos anos 60 com um disco profundamente revolucionário, Epopeia, cuja real importância só agora começa a ser verdadeiramente entendida.

Oferta de CD
com 4 temas inéditos
14,00 €
Não Ficção/Música
Nas livrarias a 21 de Fevereiro
Guerra e Paz

IV Encontro-Livreiro | 7 de Abril na Livraria Culsete em Setúbal

O Livreiro da Esperança – uma homenagem das gentes do livro aos livreiros portugueses, muito esquecidos e nem sempre compreendidos na sua fundamental função de editores da leitura – foi instituído em 2012 e homenageou o livreiro Jorge Figueira de Sousa, da Livraria Esperança, no Funchal.
O Encontro-Livreiro homenageia, em 2013, os livreiros

Caroline Tyssen e Duarte Nuno Oliveira
Livraria Galileu – Cascais

O diploma «Livreiro da Esperança 2013» será entregue no IV Encontro Livreiro, a realizar na tarde do dia 7 de Abril, domingo, na Livraria Culsete, em Setúbal.

A Livraria Galileu, que completou 40 anos de vida no passado dia 22 de Dezembro de 2012, é um exemplo de sonho transformado em realidade, de persistência, de esperança e de grande confiança no futuro do livro, da leitura e das livrarias.

Obrigado, Caroline Tyssen! 

Obrigado, Duarte Nuno Oliveira!
LG

«Uma pequena obra-prima» | José Guardado Moreira in “Documenta”

mentiroso«A novela O Mentiroso revela toda a arte do escritor anglo-americano Henry James (1843-1916): virtuosismo, atenção ao pormenor, sentido de ironia subtil – marcas de um mestre que se queixava ao irmão William, filósofo, de não ser reconhecido, mas que recolhia a admiração de Robert Louis Stevenson, Edith Wharton ou Joseph Conrad. Graham Greene disse que ele era “tão solitário na história do romance como Shakespeare na história da poesia”. Seria redescoberto por T.S. Eliot, Ezra Pound, Hemingway e W.H. Auden, […].
O narrador é um pintor de retratos, com créditos firmados na sociedade. Um dia, ao ser convidado para uma casa de campo, reencontra uma antiga paixão, casada agora com um pândego, coronel das Índias e senhor de uma verve algo inusitada e extravagante. Por despeito, ciúme ou desafio, propõe-se pintar o retrato do personagem, de tal modo que lhe desvende o embuste aos olhos de todos, principalmente da mulher, que o idolatra, aparentemente ignorante da patologia do marido. […] O jogo de enganos termina com um resultado fulgurante e uma constatação não desejada. Uma pequena obra-prima.»
José Guardado Moreira, «Henry James – Mentiras e Enganos», LER, nº 121, Fevereiro de 2013,

Passatempo | Qual o autor? | Qual o nome do conto?

– Quantos males te esperam, oh, desgraçado! Antes ficasses, para toda a imortalidade, na minha ilha perfeita, entre os meus braços perfeitos…

Gérard de Lairesse

Gérard de Lairesse

Ulisses recuou, com um brado magnífico:

– Oh, deusa, o irreparável e supremo mal, está na tua perfeição!

E, através da vaga, fugiu, trepou sofregamente à jangada, soltou a vela, fendeu o mar, partiu para os trabalhos, para as tormentas, para as delícias das coisas imperfeitas!

«Um livro triste e belo», por Ana Cristina Leonardo

011«Creio ser com legitimidade que podemos considerar Judeus Errantes um livro de História, com H maiúsculo. História abreviada do povo judaico, mas também uma história onde se identifica um olhar nostálgico, pelo menos perplexo, sobre esse tempo singular em que o Império Austro-Húngaro cede lugar aos estados-nação, conceito envolto em autodeterminação e liberdade que não deixará de arrastar sangrentos resultados. Joseph Roth, testemunha privilegiada desse período, traça um retrato preciso da cultura, religiosidade e idiossincrasias judaicas, centrando-o nos judeus orientais e, com isso, desmistificando o mito do judeu inevitavelmente rico, banqueiro, conselheiro de príncipes e poderosos. […] O livro é uma “declaração de amor” e reconhecimento das origens […]
Intuindo com argúcia o carácter antirreligioso do nazismo, conclui profeticamente: “Não há nenhum conselho, nenhum consolo, nenhuma esperança. […] Morre em 1939, em Paris, e a História dar-lhe-á razão. Um livro triste e belo.»
Ana Cristina Leonardo, «Actual»/ Expresso, 9 de Fevereiro de 2013

Algumas linhas sobre a urbanização colonial em Angola | in BUALA por Andréia Moassab

BUALAEstas brevíssimas reflexões resultam de diálogo profícuo com a arquiteta, professora e pesquisadora Manuela da Fonte, sobretudo a partir da sua tese de doutorado Urbanismo e Arquitectura em Angola: de Norton de Matos à Revolução, defendida na Universidade Técnica de Lisboa (Portugal) em 2007. Para além da agradável leitura, seu trabalho organiza um excelente material de pesquisa sob um primoroso rigor acadêmico. Das histórias não contadas na tese, vale a pena destacar a imensa dificuldade que é qualquer incursão pelos arquivos angolanos. Plantas, relatórios e documentos estão perdidos (e perdendo-se) pelas instituições, sem catalogação tampouco disposição adequada. É uma parte da história do país e da história da arquitetura e do urbanismo do século XX que literalmente desfaz-se.

Ler texto completo em BUALA:

http://www.buala.org/pt/cidade/algumas-linhas-sobre-a-urbanizacao-colonial-em-angola … (FONTE)

Bertold Brecht


“Primeiro puseram no desemprego os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida mandaram para o desemprego alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

Depois lançaram no desemprego uns miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois deixaram de pagar fundo de desemprego uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei

Agora estão me pondo no desemprego
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.”

David Seymour | ITALY. Naples. 1948.

SED1948024W00004/10

ITALY. Naples. 1948.
Some of the young Napolitans placed in a reformatory in the Albergo dei Poveri by order of the Juvenile Court. They work in different workshops attached to the reformatory. They also go to school in the same building. Discipline is very rigid and the boys’ faces are wary and suspicious. The reformatory is a vast building erected by Charles, King of Sardinia at the end of the 19th century, which now houses orphanages and reformatories.

http://www.magnumphotos.com/C.aspx?VP3=CMS3&VF=MAGO31_10_VForm&ERID=24KL53Z58C … (FONTE)

Insónia | Álvaro de Campos

Insónia

Não durmo, nem espero dormir.
Nem na morte espero dormir.

Espera-me uma insónia da largura dos astros,
E um bocejo inútil do comprimento do mundo.

Não durmo; não posso ler quando acordo de noite,
Não posso escrever quando acordo de noite,
Não posso pensar quando acordo de noite —
Meu Deus, nem posso sonhar quando acordo de noite!

Ah, o ópio de ser outra pessoa qualquer!

Não durmo, jazo, cadáver acordado, sentindo,
E o meu sentimento é um pensamento vazio.
Passam por mim, transtornadas, coisas que me sucederam
— Todas aquelas de que me arrependo e me culpo;
Passam por mim, transtornadas, coisas que me não sucederam
— Todas aquelas de que me arrependo e me culpo;
Passam por mim, transtornadas, coisas que não são nada,
E até dessas me arrependo, me culpo, e não durmo.

Não tenho força para ter energia para acender um cigarro.
Fito a parede fronteira do quarto como se fosse o universo.
Lá fora há o silêncio dessa coisa toda.
Um grande silêncio apavorante noutra ocasião qualquer,
Noutra ocasião qualquer em que eu pudesse sentir.

Estou escrevendo versos realmente simpáticos —
Versos a dizer que não tenho nada que dizer,
Versos a teimar em dizer isso,
Versos, versos, versos, versos, versos…
Tantos versos…
E a verdade toda, e a vida toda fora deles e de mim!

Tenho sono, não durmo, sinto e não sei em que sentir.
Sou uma sensação sem pessoa correspondente,
Uma abstracção de autoconsciência sem de quê,
Salvo o necessário para sentir consciência,
Salvo — sei lá salvo o quê…

Não durmo. Não durmo. Não durmo.
Que grande sono em toda a cabeça e em cima dos olhos e na alma!
Que grande sono em tudo excepto no poder dormir!

Ó madrugada, tardas tanto… Vem…
Vem, inutilmente,
Trazer-me outro dia igual a este, a ser seguido por outra noite igual a esta…
Vem trazer-me a alegria dessa esperança triste,
Porque sempre és alegre, e sempre trazes esperança,
Segundo a velha literatura das sensações.

Vem, traz a esperança, vem, traz a esperança.
O meu cansaço entra pelo colchão dentro.
Doem-me as costas de não estar deitado de lado.
Se estivesse deitado de lado doíam-me as costas de estar deitado de lado.
Vem, madrugada, chega!

Que horas são? Não sei.
Não tenho energia para estender uma mão para o relógio,
Não tenho energia para nada, para mais nada…
Só para estes versos, escritos no dia seguinte.
Sim, escritos no dia seguinte.

Todos os versos são sempre escritos no dia seguinte.
Noite absoluta, sossego absoluto, lá fora.
Paz em toda a Natureza.
A Humanidade repousa e esquece as suas amarguras.
Exactamente.
A Humanidade esquece as suas alegrias e amarguras.
Costuma dizer-se isto.
A Humanidade esquece, sim, a Humanidade esquece,
Mas mesmo acordada a Humanidade esquece.
Exactamente. Mas não durmo.

Álvaro de Campos, in “Poemas”
Heterónimo de Fernando Pessoa

Alípio de Freitas | copiado de Carlos Matos Gomes in Facebook

Alípio de Freitas

Alípio de Freitas

Hoje faz anos um Homem. Alípio de Freitas está, obviamente deslocado nesta época de meninos bem comportados. Tive a oportuidade de o conhecer e de aprender a respeitar. Deixar aqui a lembrança do seu aninersário, para dizer que há e houve homens como este, constitui a minha homenagem e a minha prova de otimismo. Quem era Alípio de Freitas?
Alípio de Freitas ou Padre Alípio de Freitas nasceu em Fevereiro de 1929 e cresceu em Vinhais (Bragança, Trás-os-Montes). Foi padre em Portugal e revolucionário no Brasil.
Em 1957 aceitou um convite do arcebispo de Maranhão para viver no Brasil, onde deu aulas na universidade. Num subúrbio miserável de São Luís do Maranhão, fundou uma paróquia, uma escola, um posto médico. De início não celebrava missa, nem tão-pouco ia à missa, e depois quando o fez (em atenção ao arcebispo), era em Português, no que antecipava o Concílio Vaticano II. Em 1962 foi a Moscovo, ao Congresso Mundial da Paz, onde privou com Pablo Neruda, a Pasionaria e Kruchtchev. Regressou ao Brasil e rompeu com a hierarquia da Igreja. Apoiou a candidatura de Miguel Arraes ao governo de Pernambuco, o que lhe valeu ser raptado pelo exército e detido durante 40 dias. Naturalizou-se brasileiro, foi para o Rio de Janeiro, viveu nas favelas, e ajudou a fundar as Ligas Camponesas, um movimento radical que entre outras iniciativas organizava ocupações de terras.
Na sequência do golpe militar de 1964, pediu asilo político no México, depois recebeu treino político-militar em Cuba, regressando clandestinamente ao Brasil em 1966. A partir daí percorreu o país de ponta a ponta, promovendo o movimento camponês. Em Maio de 1970 foi preso, sujeito à tortura do sono durante 30 dias. Saiu da prisão em 1979, como apátrida. Em 1981 foi viver para Moçambique, num projecto com camponeses. O álbum de José Afonso Com as Minhas Tamanquinhas inclui uma canção-homenagem com o nome Alípio de Freitas. Uma das suas frases: “Trabalhadores, ontem vos ensinei a rezar e hoje aqui estou para ensiná-los a pegar em armas e lutar”.
Nos anos 80 regressou a Portugal, entrando para a RTP até 1994, realizando com Mário Zambujal, Carlos Pinto Coelho e José Nuno Martins o programa Fim de Semana. Está ligado ao Tribunal Mundial sobre o Iraque, assim como a diversos movimentos sociais e associações cívicas, nomeadamente o Fórum Social Mundial.

Carlos Matos Gomes in Facebook

Henri Cartier-Bresson

Henri Cartier-Bresson (Chanteloup-en-Brie22 de agosto de 1908 — Montjustin2 de agosto de 2004) foi um fotógrafo do século XX, considerado por muitos como o pai do fotojornalismo.

Cartier-Bresson era filho de pais de uma classe média (família de industriais têxteis), relativamente abastada. Quando criança, ganhou uma câmera fotográfica Box Brownie, com a qual produziu inúmeros instantâneos. Sua obsessão pelas imagens levou-o a testar uma câmera de filme 35mm. Além disto, Bresson também pintava e foi para Paris estudar artes em um estúdio.

Em 1931, aos 22 anos, Cartier-Bresson viajou à África, onde passou um ano como caçador. Porém, uma doença tropical obrigou-o a retornar à França. Foi neste período, durante uma viagem a Marselha, que ele descobriu verdadeiramente a fotografia, inspirado por uma fotografia do húngaroMartin Munkacsi, publicada na revista Photographies (1931), mostrando três rapazes negros a correr em direção ao mar, no Congo.

Quando eclodiu a Segunda Guerra Mundial, Bresson serviu o exército francês. Durante a invasão alemã, Bresson foi capturado e levado para um campo de prisioneiros de guerra. Tentou por duas vezes escapar e somente na terceira obteve sucesso. Juntou-se à Resistência Francesa em sua guerrilha pela liberdade.

Quando a paz se restabeleceu, Cartier-Bresson, em 1947, fundou a agência fotográfica Magnum junto com Bill VandivertRobert Capa,George Rodger e David Seymour “Chim”. Começou também o período de desenvolvimento sofisticado de seu trabalho.

Revistas como a LifeVogue e Harper’s Bazaar contrataram-no para viajar pelo mundo e registrar imagens únicas. Da Europa aosEstados Unidos da América, da Índia à China, Bresson dava o seu ponto de vista especialíssimo.

Tornou-se também o primeiro fotógrafo da Europa Ocidental a registrar a vida na União Soviética de maneira livre. Fotografou os últimos dias de Gandhi e os eunucos imperiais chineses, logo após a Revolução Cultural.

Na década de 1950, vários livros com seus trabalhos foram lançados, sendo o mais importante deles “Images à la Sauvette”, publicado em inglês sob o título “The Decisive Moment” (1952). Em 1960, uma megaexposição com quatrocentos trabalhos rodou os Estados Unidos em uma homenagem ao nome forte da fotografia.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Henri_Cartier-Bresson … (FONTE)

A primeira câmera Leica de Henri Cartier-Bresson

A primeira câmera Leica de Henri Cartier-Bresson

Citando Baptista Bastos

“A distanciação é uma obscenidade que me põe fora de mim! Como se o jornalista não tivesse nada a ver com aquilo que está a escrever! Então, o jornalista é uma caneta? O jornalista é um microfone? O jornalismo é aproximação. O jornalismo é até amizade!
Depois, temos uma escola anglo-saxónica que fez um certo êxito junto daqueles que não têm criatividade, que esquecem que, quando se olha, já se começa a seleccionar e que, quando se escreve, se selecciona ainda mais. As próprias palavras escolhidas são diferentes de umas pessoas para as outras. O olhar é selectivo, como os sentimentos, como as emoções, como a memória. Tudo é selectivo na condição humana. Além disso, quando se começa a olhar, começa-se logo a interpretar.
Fala-se na imparcialidade e na neutralidade… Não há jornalismo neutro – o jornalismo é o lado humano das coisas. E expliquem-me como é que um locutor de futebol pode ser imparcial. Não pode! A emoção que transparece quando ele relata é a que passa para os ouvintes.
Expliquem-me como é possível afastarmo-nos. Então um tipo vê uma desgraça, escreve um artigo e depois vai beber um uísque? Não me venham com essa conversa. Eu sei que há pessoas assim, mas essas não deixam marca no jornalismo.”

Baptista Bastos in Jornalismo & Jornalistas

The New Mona Lisa

The "Isleworth Mona Lisa" (c. 1410-1455 [approximate canvas date])

The “Isleworth Mona Lisa” (c. 1410-1455 [approximate canvas date])

The case of the Isleworth Mona Lisa got a little more interesting this week, as an art foundation in Switzerland announced that they have reason to believe the painting — purported to be an earlier version of Leonardo da Vinci’s iconic portrait — is authentic.

“When we add these new findings to the wealth of scientific and physical studies we already have, I believe anyone will find the evidence of a Leonardo attribution overwhelming,” said David Feldman, vice-president of the Swiss Federal Institute of Technology, in a statement to The Independent. Check out the full story here.

http://www.huffingtonpost.com/2013/02/14/isleworth-mona-lisa-declared-authentic-swiss-institute-real-painting_n_2685047.html?utm_hp_ref=arts … (FONTE)

José Pacheco Pereira | O número que está tatuado nos braços dos portugueses: o número de contribuinte in “Jornal Público”

Se de manhã ao pequeno- almoço não pedir factura do café, pode vir um fiscal e multar-me…

Aqui há uns anos houve uma discussão sobre o número único a propósito do cartão do cidadão. É uma matéria pouco popular, tida como importando apenas aos intelectuais e aos políticos, que as pessoas comuns vêem com muita indiferença. Se lhes parece mais eficaz que cada um tenha um número único que sirva para o identificar num bilhete de identidade, para reconhecer uma assinatura, na Segurança Social, no fisco, numa ficha médica, num cartão de crédito ou de débito, qual é o problema? Se isso lhe poupa tempo e papéis, qual é a desvantagem? Se isso permitir perseguir um criminoso, que importa existir uma base de dados com o ADN das pessoas? E se as tecnologias o permitirem, como permitem, qual o mal em podermos vir a ter um chip como os cães, ou uma etiqueta electrónica como as crianças à nascença, por que razão é que nós não podemos ser numerados por um qualquer código de barras tatuado no braço?

A maioria das pessoas é indiferente ao abuso do Estado nestas matérias se daí vier uma aparente maior eficácia e menor burocracia. E os proponentes destas medidas, uns tecnocratas, outros fascinados pelos tecnocratas, outros ainda gente mais perigosa e securitária cujo ideal de sociedade perfeita é o 1984 de Orwell, todos manipulam a opinião contra os antiquados defensores dos “direitos cívicos”, que continuam a achar que não se deve ter número único, chip, ou código de barras, em nome dessas coisas tão de “velhos do Restelo” como sejam as liberdades e o direito do indivíduo em ter uma reserva da sua vida íntima e privada, sem intromissão indevida do Estado onde ele não deve estar.

Infelizmente, insisto, a indiferença cívica é o pano de fundo de muitos abusos e a sociedade e o Estado que estamos a construir são os ideais para uma sociedade totalitária. Se uma nova polícia política aparecer – e para quem preza a liberdade esse risco existe sempre -, não precisa de fazer nenhuma lei nova, basta usar os recursos já disponíveis para obter toda a informação sobre um cidadão que queira perseguir.

A promessa que nos é feita é de que os dados “não são cruzados”. Mas esta afirmação não só não é verdadeira como não garante nada. Não impede um serviço de informações que queira abusar, de obter cumplicidades e “cruzar” dados, não impede uma polícia de fazer o mesmo (o episódio do acesso da PSP às filmagens não editadas sem ordem judicial é um exemplo de práticas costumeiras que só são escrutinadas depois de um acidente de percurso), não impede a utilização de software mais sofisticado para fazer buscas na Internet, muito para além da informação já vasta que se pode obter no Google. E se somarmos as câmaras de vigilância e outros meios cada vez mais generalizados de controlo dos cidadãos, mais nos preocupamos com as liberdades no mundo orwelliano em que já vivemos.

E quanto ao “cruzamento de dados” a partir de um número único com informação indevida, tudo isso já existe e chama-se NIF, número de identificação fiscal, ou mais prosaicamente, “número de contribuinte”. De há dez anos para cá, o Governo Sócrates e depois o Governo Passos Coelho transformaram o fisco no mais parecido que existe com uma polícia global, e uma polícia global é também política, e o número de contribuinte no verdadeiro número único dos portugueses, cujo acesso permite todos os cruzamentos de dados e uma violação sem limites da privacidade de cada cidadão. Se somarmos a isso o facto de o fisco ser a única área da lei em que a presunção da inocência não existe e o ónus da prova cai no cidadão, temos um retrato de um Estado de excepção dentro de um Estado que se pretende de direito.

E não preciso de estar a recitar a litania do combate à evasão fiscal, porque este caminho de abuso tem sido trilhado exactamente porque o combate à evasão fiscal tem sido ineficaz onde deveria ser. O furor do Estado volta-se contra as cabeleireiras, os mecânicos de automóveis e as tabernas, mas ignora os esquecimentos de declaração de milhões de euros, que só são declarados quando descobertos e não merecem uma palavra de condenação nem do ministro das Finanças, nem do Banco de Portugal, nem de ninguém dos indignados com a factura dos cafés. E é exactamente porque o combate à evasão fiscal falha, ou porque a economia está morta, ou porque os Monte Brancos são mais numerosos do que todas as montanhas dos Alpes, dos Andes, do Himalaia, que se assiste a uma espécie de desespero fiscal que leva o Estado (os governos) a entrar pela liberdade e individualidade dos cidadãos comuns de forma abusiva e totalitária. Digo totalitária, mais do que autoritária, porque a tentação utópica de “conhecer” e controlar a sociedade e os indivíduos através da monotorização de todas as transacções económicas é de facto resultado de mente como a do Big Brother.

Num computador do fisco está toda a nossa vida já inventariada e cruzada através do número de contribuinte e dos poderes discricionários da Autoridade Tributária. Se de manhã ao pequeno-almoço não pedir factura do café, pode vir um fiscal e multar-me (não pode porque é ilegal, impossível de facto, e o Governo anda a mentir-nos a dizer que já o fez quando se devem contar pelos dedos da mão as contra-ordenações realizadas, se é que há alguma à data do anúncio), e para lavrar o “auto” terá de dizer onde estou, o que consumi sem factura e informar o Estado sobre se tomo chá, café ou chocolate, doces ou salgados, etc. Depois passo por uma livraria e na factura estão os livros que comprei e está o número de contribuinte. Hum! Este anda a ler livros subversivos, ou quer saber coisas sobre a Tabela de Mendeleev (a química é sempre perigosa), ou uma história sexualmente bizarra como a Lolita, (diga aí ao assessor do senhor ministro que um boato de pedofilia é sempre mortífero e o homem lê livros sobre isso), ou o Vox do Nicholson Baker (uma história de sexo por telefone que o procurador Starr queria usar como prova contra Clinton, pedindo à livraria que lhe confirmasse a compra do livro por Monica Lewinsky, o que a livraria recusou e bem). Depois foi almoçar, e pelo número de contribuinte verifico que almoça muitas vezes a dois, e dois é um número suspeito. Coloque lá no mapa o sítio do pequeno-almoço, mais a livraria, mais o restaurante, e as horas. E depois? A Via Verde cujo recibo tem o número de contribuinte mostra que entrou na portagem X e saiu na portagem Y. Interessante, o que é que ele foi fazer ao Entroncamento? E levantou dinheiro no Multibanco. Muito ou pouco? Bastante. Veja lá as facturas que ele pagou no Entroncamento. Aqui está, comprou uma mala de viagem. Então a factura? Não há, comprou nuns chineses, mas foi visto com a mala na câmara de vigilância de um banco. Anote aí para mandar uma inspecção do fisco e da ASAE aos chineses, imagine o que seria se nós não tivéssemos as imagens do banco! O que é que ele vai fazer com a mala? E por aí adiante.

A nossa indiferença colectiva face ao continuo abuso do Estado, que nada melhor nos dias de hoje revela do que o fisco, vai acabar por se pagar caro. Muitos tentaram fugir ao fisco? É verdade, muitos inclusive nunca pagaram impostos e vivem numa economia paralela, mas a sanha contra eles, que face ao fisco não tem direitos, nem defesa, nem advogados, contrasta com a complacência afrontosa com a fraude fiscal com os poderosos. É que também nisso, na perseguição aos pequenos, se revela o mundo totalitário de 1984 e do Triunfo dos Porcos, em que alguns são mais iguais do que outros. E pelo caminho, para garantir que os pequenos sejam apanhados na malha, pelo desespero de um fisco que quer sugar uma economia morta de recursos que ela não tem, é que se usa o número de contribuinte como número único, cruzado nos computadores das finanças, muito para além do que é necessário e equilibrado, numa ameaça às liberdades de cada português.”

José Pacheco Pereira in Jornal Público de 2013.02.16

http://www.publico.pt/opiniao/jornal/o-numero-que-esta-tatuado-nos-bracos-dos-portugueses-o-numero-de-contribuinte-26070900 … (FONTE)

Debates do PEN | Goethe-Institut | Ideias Mortais | Maria João Cantinho | André Barata | André Teodósio

transferirIdeias Mortais

Pensar e Criar em tempos de desafio/difíceis/árduos …

Debates do PEN
18.02.2013, 19h00
Goethe-Institut
Biblioteca
Campo dos Mártires da Pátria, 37
1169-016 Lisboa
00351-2188245-10
info@lissabon.goethe.org
André Teodósio à conversa com André Barata e Maria João Cantinho. Na ordem do dia estão o pessimismo e a angústia. André Teodósio é o nosso convidado para debater formas e modos de intervenção possíveis, na nossa cultura actual. Como pensar, como agir e intervir socialmente neste contexto é o desafio que propomos neste debate, como modo de ensaiar o salto do pensamento.Maria João Cantinho é professora no Iade e no secundário. Doutorada em Filosofia Contemporânea, é também escritora, crítica e ensaísta. Publicou A Garça (ed. Diferença, 2001), O Anjo Melancólico (Ed. Angelus Novus, 2002), Sílabas de Água (ver-o-Verso, 2005), Caligrafia da Solidão (Ed. Escrituras, 2006), O Traço do Anjo (Edium, 2011). Colabora regularmente com várias revistas literárias e de Filosofia, como a Colóquio-Letras, a Ler, entre outras publicações. É membro da Direcção do Pen e da Associação portuguesa de Críticos.André Barata é Doutor em Filosofia Contemporânea pela Universidade de Lisboa. É professor na Universidade da Beira Interior, onde dirige o mestrado de Ciência Política. Nessa universidade, é ainda investigador e membro da direcção do Instituto de Filosofia Prática. É Vice-Presidente da Associação Portuguesa de Filosofia Fenomenológica. Dirigiu a revista Análise (2005/06). Publicou em 2000 Metáforas da Consciência (Porto, Campo das Letras), em 2007 Sentidos de Liberdade (Covilhã, Ta pragmata) e, em co-autoria com Rita Taborda Duarte, Experiências Descritivas(Lisboa, Caminho), em 2010 Mente e Consciência (Lisboa, Phainomenon). Co-editou em 2011 Representações da Portugalidade(Lisboa, Caminho). Publicou em 2012 uma colectânea de ensaios de teoria política intitulado Primeiras Vontades (Lisboa, Documenta).

André Teodósio, n. 1977, é um actor e encenador português de teatro. É membro fundador do Teatro Praga, tendo também integrado a companhia de teatro Casa Conveniente, e colabora assiduamente com a companhia de teatro Cão Solteiro. Para além dos trabalhos desenvolvidos com o Teatro Praga encenou a solo os espectáculos Três mulheres, de Sylvia Plath, Diário de um louco, de Nikolai Gogol, Super-Gorila e Supernova, co-criados com José Maria Vieira Mendes e André Godinho. Encenou as óperas Metanoite, de João Madureira, Outro Fim, de António Pinho Vargas, Blue Monday, de George Gershwin e Gianni Schicchi, de Giacomo Puccini . Escreve regularmente para diversas publicações sendo autor do textoCenofobia editado pela Fundação Culturgest e autor do ciclo Top Models que inclui Susana Pomba (um mito urbano) e Paula Sá Nogueira (um bestiário). É ainda co-autor do bailado Perda Preciosana Companhia Nacional de Bailado. Tem apresentado os seus trabalhos em inúmeros teatros portugueses e estrangeiros. Foi nomeado pelo jornal Expresso como um dos 100 portugueses mais influentes de 2012.

As chaminés de Santa Maria | Daniel de Sá

Por mero acaso li, nos últimos meses, várias publicações em que erradamente, sendo o erro grosseiro, se atribui a forma das chaminés cilíndricas de Santa Maria a hipotéticos povoadores algarvios. Uma fantasia nascida a meados do século XX. O erro é por demais grosseiro, até porque, para além de não ter fundamento histórico, as chaminés de Santa Maria raramente se assemelham às do Algarve, ou do Alentejo, como também há quem diga, chaminés estas em que a finalidade estética se sobrepõe normalmente à funcional. Em Santa Maria, porém, as chaminés cilíndricas generalizaram-se por ter sido provada a excelência do seu funcionamento. Uma razão é suficiente para se perceber que se trata de engano – ao contrário do que é comum dizer-se, do Algarve não vieram povoadores para esta ilha. Para a Madeira, sim, conforme registou Frutuoso. A este respeito, num dos mais bem documentados estudos sobre o descobrimento e povoamento dos Açores, Viriato Campos escreveu: “Tem-se admitido que os primeiros povoadores vieram do Algarve, mas não se conhece nenhum documento que o prove. Vemos aqui um caso dedutivo ou de imaginação, certamente porque o Infante D. Henrique vivia grandes épocas no Oeste algarvio, esquecendo-nos que ele era Duque de Viseu e Senhor da Covilhã, e que o Infante D. Pedro, Regente do Reino, tinha a sua casa em Coimbra. Veja-se que Gaspar Frutuoso, ao tratar da ilha de Santa Maria, nem uma só pessoa indica como vindo do Algarve. Vieram, sim, de Moura, Chamusca, Vila do Conde, Santarém, Santar, Tonda, Silgueiros, Besteiros, Guarda, Covilhã, Recardães, Estremoz, Trofa, Góis, Oliveira do Conde… e Viseu //”.
Mais ainda. A maior parte das casas rurais da época do povoamento não tinha chaminé. O fumo escoava-se por entre as telhas ou por um buraco feito no telhado. Isto acontecia não apenas em Portugal, mas por toda a Europa. No livro “Comme vivaient-ils?”, de Claude Quoniam e Étienne Sergery, é dito das casas dos camponeses prussianos do tempo de Frederico II: “A única lareira que há serve para a cozinha. Acesa no chão, é com grande dificuldade que faz ferver a água do caldeirão de ferro, que está permanentemente ao lume. O fumo e os cheiros escoam-se mal pela única janela, raramente aberta, pela porta baixa ou pelas tábuas do sótão//”. Em Portugal ainda subsistem muitas casas assim. Num estudo sobre o concelho de Nelas no final do século XX, José Manuel Sobral descreve-as do seguinte modo: “casas de dois e mesmo de três andares que utilizavam o granito e com paredes interiores de taipa, material por vezes usado nas paredes exteriores; casas sem chaminé ou com chaminé bastante primitiva, com o fumo a escoar-se pelas telhas; casas escuras, as mais pobres sem vidraças, com poucas divisões – a cozinha e um ou dois quartos”.
À abertura no telhado para a saída do fumo chama-se “bueira”, em Castelo Branco. O Dicionário da Porto Editora regista este termo como “furo no fundo da embarcação para escoar as águas, quando em seco”. E, para “bueiro”, o dicionário de Roquete, de 1848, regista o seguinte significado: “Cano de fornalha; respiradouro”.
Facilmente se percebe que as casas com chaminé cilíndrica são mais recentes do que as outras, com chaminé de “mãos-postas”. Ricardo Freitas, um mariense que tem estudado o assunto, atribui este tipo de chaminé cilíndrica à influência dos emigrantes de torna-viagem do Brasil, na passagem do século XIX para o XX, os quais se teriam inspirado nas chaminés dos navios a vapor. A semelhança é notória, sendo as marienses também ditas chaminés de vapor.
Daniel de Sá

Foto  de Fernando Resendes

Foto de Fernando Resendes

Vinte por dois e meio | Daniel de Sá

Porto da Maia

Porto da Maia

“Ei, peixe fresco! Ei, chicharro grado!” “Ó Meia-Leca, a como é o chicharro?” – Perguntou o senhor da janela do primeiro andar. “A vinte por dois e meio.” “Não tens vergonha de só dar vinte chicharros por dois escudos e meio? Ainda ontem o Caramujo vendeu a trinta.” “Se o senhor quer os chicharros, é vinte por dois e meio, e acabou-se.” “Dás vinte e cinco?” “Não, senhor. Vinte. Nem mais um.” O senhor mandou a empregada ir buscar os chicharros. Ela pegou num prato fundo e foi. Depois o senhor atirou só duas moedas de um escudo para o meio da rua. O Meia-Leca baixou-se para pôr os cestos às costas novamente. Nem olhou para o dinheiro caído no chão. “Estás muito rico, que duas patacas já não te fazem falta!…” O Meia-Leca parou, fixou o senhor lá no alto mas como se estivesse a olhar de cima para baixo, e disse: “O senhor que fique com as patacas. E guarde-as para lhe fecharem os olhos com elas quando morrer.”

Daniel de Sá

NUEVO CANTO DE AMOR A STALINGRADO de Pablo Neruda

 Stalinegrado

Yo escribí sobre el tiempo y sobre el agua,
describí el luto y su metal morado,
yo escribí sobre el cielo y la manzana,
ahora escribo sobre Stalingrado.
Ya la novia guardó con su pañuelo
el rayo de mi amor enamorado,
ahora mi corazón está en el suelo,
en el humo y la luz de Stalingrado.

Yo toqué con mis manos la camisa
del crepúsculo azul y derrotado:
ahora toco el alba de la vida
naciendo con el sol de Stalingrado.

Honor a ti por lo que el aire trae,
o que se ha de cantar y lo cantado,
honor para tus madres y tus hijos
y tus nietos, Stalingrado.

Honor al combatiente de la bruma,
onor al Comisario y al soldado,
honor al cielo detrás de tu luna,
honor al sol de Stalingrado.

Yo sé que el viejo joven transitorio
de pluma, como un cisne encuadernado,
desencuaderna su dolor notorio
por mi grito de amor a Stalingrado.
Yo pongo el alma mía donde quiero.
Y no me nutro de papel cansado
adobado de tinta y de tintero.
Nací para cantar a Stalingrado.

Mi voz estuvo con tus grandes muertos
contra tus propios muros machacados,
mi voz sonó como campana y viento
mirándote morir, Stalingrado.

Ahora americanos combatientes
blancos y oscuros como los granados,
matan en el desierto a la serpiente.
Ya no estás sola, Stalingrado.

Francia vuelve a las viejas barricadas
con pabellón de furia enarbolado
sobre las lágrimas recién secadas.
Ya no estás sola, Stalingrado.

Y los grandes leones de Inglaterra
rolando sobre el mar huracanado
clavan las garras en la parda tierra.
Ya no estás sola, Stalingrado.

Hoy bajo tus montañas de escarmiento
no sólo están los tuyos enterrados:
temblando está la carne de los muertos
que tocaron tu frente, Stalingrado.

Tu acero azul de orgullo construido,
tu pelo de planetas coronados,
tu baluarte de panes divididos,
tu frontera sombría, Stalingrado.

Tu Patria de martillos y laureles,
la sangre sobre tu esplendor nevado,
la mirada de Stalin a la nieve
tejida con tu sangre, Stalingrado.

Las condecoraciones que tus muertos
han puesto sobre el pecho traspasado
de la tierra, y el estremecimiento
de la muerte y la vida, Stalingrado

La sal profunda que de nuevo traes
al corazón del hombre acongojado
con la rama de rojos capitanes
salidos de tu sangre, Stalingrado.

La esperanza que rompe en los jardines
como la flor del árbol esperado,
la página grabada de fusiles,
as letras de la luz, Stalingrado.
La torre que concibes en la altura,
los altares de piedra ensangrentados,
los defensores de tu edad madura,
los hijos de tu piel, Stalingrado.

Las águilas ardientes de tus piedras,
los metales por tu alma amamantados,
los adioses de lágrimas inmensas
y las olas de amor, Stalingrado.

Los huesos de asesinos malheridos,
los invasores párpados cerrados,
y los conquistadores fugitivos
detrás de tu centella, Stalingrado.

Los que humillaron la curva del Arco
y las aguas del Sena han taladrado
con el consentimiento del esclavo,
e detuvieron en Stalingrado.

Los que Praga la Bella sobre lágrimas,
sobre lo enmudecido y traicionado,
pasaron pisoteando sus heridas,
murieron en Stalingrado.

Los que en la gruta griega han escupido,
la estalactita de cristal truncado
y su clásico azul enrarecido,
ahora dónde están, Stalingrado?

Los que España quemaron y rompieron
dejando el corazón encadenado
de esa madre de encinos y guerreros,
se pudren a tus pies, Stalingrado.

Los que en Holanda, tulipanes y agua
salpicaron de lodo ensangrentado
y esparcieron el látigo y la espada,
ahora duermen en Stalingrado.

Los que en la noche blanca de Noruega
con un aullido de chacal soltado
quemaron esa helada primavera,
enmudecieron en Stalingrado.

Guárdame un trozo de violenta espuma,
guárdame un rifle, guárdame un arado,
y que lo pongan en mi sepultura
con una espiga roja de tu estado,
para que sepan, si hay alguna duda,
que he muerto amándote y que me has amado,
y si no he combatido en tu cintura
dejo en tu honor esta granada oscura,
este canto de amor a Stalingrado.

Poema à mãe | Eugénio de Andrade

No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe.

Tudo porque já não sou
o menino adormecido
no fundo dos teus olhos.

Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.

tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!

Olha – queres ouvir-me? –
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;

ainda oiço a tua voz:

Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal…

Mas – tu sabes – a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.

Mothers Love by kolongi

Mothers Love by kolongi

Citando Maria Gabriela Llansol

Jodie Foster, 1987 by Helmut Newton

Jodie Foster, 1987 by Helmut Newton

Não há mais sublime sedução do que saber esperar alguém.
Compor o corpo, os objectos em sua função, sejam eles
A boca, os olhos, ou os lábios. Treinar-se a respirar
Florescentemente. Sorrir pelo ângulo da malícia.
Aspergir de solução libidinal os corredores e a porta.
Velar as janelas com um suspiro próprio. Conceder
Às cortinas o dom de sombrear. Pegar então num
Objecto contundente e amaciá-lo com a cor. Rasgar
Num livro uma página estrategicamente aberta.
Entregar-se a espaços vacilantes. Ficar na dureza
Firme. Conter. Arrancar ao meu sexo de ler a palavra
Que te quer. Soprá-la para dentro de ti
até que a dor alegre recomece.

Maria Gabriela Llansol
in O começo de um livro é precioso