Romance infantojuvenil de Silas Corrêa Leite conta a aventura de um jovem marginalizado no mundo da ficção científica
I Em nova experiência no gênero romance infantojuvenil, Silas Corrêa Leite (1952) apresenta A Coisa: muito além do coração selvagem da vida (São Paulo, Editora Cajuína, 2021), que conta a trajetória de um adolescente revoltado com a difícil vida que leva numa das zonas periféricas da grande cidade de São Paulo e procura fugir de casa para embrenhar-se no mundo. Abandonado pelos pais, decide largar-se sozinho a pé, com seu skate, pela Serra do Mar em busca das praias do Litoral paulista. E, assim, passa a viver uma vida de andarilho e a sobreviver do que a floresta lhe podia oferecer como alimento, ou seja, água, peixes, frutas e animais silvestres, até que, um dia, acaba por descobrir, no meio da mata, um objeto enorme não identificado, a que passa a chamar de A Coisa, ou seja, um aparelho estranho que soltava sons igualmente inidentificáveis, ou seja, provavelmente um veículo extraterrestre.
La crise que nous vivons n’est pas simplement économiqueet financière, mais aussi philosophique et spirituelle. Elle renvoie à des interrogations universelles : Qu’est ce qui rend l’être humain heureux ? Qu’est-ce qui peut être considéré comme un progrès véritable ? Quelles sont les conditions d’une vie sociale harmonieuse ?Contre une vision purement matérialiste de l’homme et du monde, Socrate, Jésus et Bouddha sont trois maîtres de vie. Une vie qu’ils n’enferment jamais dans une conception close et dogmatique. Leur parole a traversé les siècles sans prendre une ride, et par-delà leurs divergences, ils s’accordent sur l’essentiel : l’existence humaine est précieuse et chacun, d’où qu’il vienne, est appelé à chercher la vérité, à se connaître dans sa profondeur, à devenir libre, à vivre en paix avec lui-même et avec les autres. Un message humaniste et spirituel, qui répond sans détour à la question essentielle : pourquoi je vis ?Philosophe et directeur du Monde des religions, Frédéric Lenoir est aussi romancier et dramaturge. Il est notamment l’auteur ou le co-auteur de La Promesse de l’ange, de Code Da Vinci, l’enquête, de L’Oracle della Luna et de la pièce de théâtre Bonté divine ! Ses ouvrages sont traduits dans une vingtaine de langues.
Résumé | Le Christ philosophe
Pourquoi la démocratie et les droits de l’homme sont-ils nés en Occident plutôt qu’en Inde, en Chine, ou dans l’Empire ottoman ? Parce que l’Occident était chrétien et que le christianisme n’est pas seulement une religion. Certes, le message des Evangiles s’enracine dans la foi en Dieu, mais le Christ enseigne aussi une éthique à portée universelle : égale dignité de tous, justice et partage, non-violence, émancipation de l’individu à l’égard du groupe et de la femme à l’égard de l’homme, liberté de choix, séparation du politique et du religieux, fraternité humaine. Quand, au IVe siècle, le christianisme devient religion officielle de l’Empire romain, la sagesse du Christ est en grande partie obscurcie par l’institution ecclésiale. Elle renaît mille ans plus tard, lorsque les penseurs de la Renaissance et des Lumières s’appuient sur la ” philosophie du Christ “, selon l’expression d’Erasme, pour émanciper les sociétés européennes de l’emprise des pouvoirs religieux et fonder l’humanisme moderne. Frédéric Lenoir raconte ici le destin paradoxal du christianisme – du témoignage des apôtres à la naissance du monde moderne, en passant par l’Inquisition – et nous fait relire les Evangiles d’un œil radicalement neuf.
À propos de l’auteur
Lenoir, Frédéric Philosophe, historien des religions et chercheur associé à l’Ecole des hautes études en sciences sociales. Directeur du magazine Le Monde des religions, il est l’auteur d’essais et de romans historiques qui ont connu un succès international. Ses ouvrages sont traduits dans vingt-cinq langues.
A Bertrand Editora tem o prazer de convidar para a sessão de lançamento e para a sessão de apresentação de Diabo, de Gonçalo M. Tavares, que decorrem em Óbidos e Lisboa, respetivamente, a 8 e 12 de outubro. A sessão de lançamento, integrada no FOLIO – Festival Literário Internacional de Óbidos, está agendada para sábado, 8 de outubro, às 19h00, no Auditório Municipal da Casa da Música e conta com música da cantora lírica Maria João Sousa, guitarra clássica de Pedro Sousa e leituras de Inês Nogueira. A 12 de outubro, o encontro decorre na FNAC Chiado, em Lisboa, às 18h30, com música da cantora lírica Maria Varandas guitarra clássica de Pedro Sousa e leituras de Inês Nogueira.
Neste seu novo livro, Rubem Fonseca opta de novo pela concisão, tal como fizera na coletânea Amálgama, vencedora do Prémio Jabuti 2015. Junta desta vez trinta e oito histórias curtas, por vezes curtíssimas, nas quais volta a abordar brilhantemente, de forma crua mas delicada, temas já recorrentes na sua obra mais recente: o envelhecimento, a obesidade, a loucura e todo o tipo de decadência humana.
“A pomposidade venturosa e festiva das palavras obscenas.” Palavras do autor que se enquadram perfeitamente nesta obra. Diverti-me imenso. Vasco Costa | 2021-06-07
RUBEM FONSECA
Nasceu em Juiz de Fora (Minas Gerais), no Brasil, a 11 de maio de 1925. É um dos mais prestigiados escritores brasileiros contemporâneos e um dos expoentes máximos da literatura de língua portuguesa. Traduzido em todo o mundo, foi galardoado com seis prémios Jabuti e, pelo conjunto da sua obra, com o Prémio Camões em 2003. Em 2015, recebeu o Prémio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras (ABL). É autor de uma vasta obra narrativa, contista e romancista, que tem vindo a ser publicada em Portugal, desde 2010, pela Sextante Editora. Os romances Agosto e A Grande Arte são duas das suas obras incontornáveis, exemplos máximos da sua escrita sóbria e de um realismo «duro» que fez escola na literatura brasileira: «todas as palavras devem ser usadas», disse uma vez numa entrevista. A Carne Crua — uma coleção de 26 contos inéditos, lançada em Portugal há precisamente um ano —, que viria a ser a sua derradeira criação, juntam-se atualmente no catálogo da Sextante os romances O Seminarista, Buffo & Spallanzani (Prémio Literário Casino da Póvoa do Correntes d’Escritas), A Grande Arte, Agosto e O Selvagem da Ópera, os livros de contos Calibre 22, Axilas & Outras Histórias Indecorosas, Histórias Curtas e Amálgama, e a autobiografia de infância intitulada José. Rubem Fonseca faleceu no Rio de Janeiro a 15 de abril de 2020, vítima de um enfarte do miocárdio. Após a sua morte foi editado O Doente Molière.
I Um menino de Itararé, criado pelos avós, que, quando chega à idade do entendimento, aos 15 anos, sai de casa em busca da mãe, que sumira quando ele nascera e estaria perdida nos cafundós do Mato Grosso do Sul, perto da fronteira com a Bolívia, e virara missionária. Em breves palavras, este é o enredo do novo livro de Silas Corrêa Leite (1952), O menino que queria ser super-herói (Lisboa/São Paulo, Editora Primeiro Capítulo, 2022), romance infantojuvenil que vem se juntar a uma obra já extensa que inclui publicações em outros gêneros (poesia, prosa poética, contos e romances). Inteligente, precoce, muito ativo e sensível, o menino sabe que o sótão de sua casa guarda um segredo e o porão também esconde coisas do passado de seus familiares. Fã de desenhos animados, de histórias em quadrinhos e de personagens de gibis, como Super-Homem, Batman, o Homem Invisível e o Capitão Marvel, o menino, que tem o nome de Ben-Hur, precisa visitar aqueles lugares recônditos, para conhecer os mistérios de sua vida e descobrir segredos, como saber que seu pai ainda vive em Itararé, mítica cidade localizada no Estado de São Paulo “fincada às barrancasdo vizinho Estado do Paraná”, famosa depois da chamada Revolu& ccedil;ão de 1930, que constituiu mais um golpe civil-militar em que, desta vez, as elites dos demais Estados derrubaram as tradicionais elites paulistas e mineiras. Itararé, antiga terra dos índios guaianases e, depois, no século XVIII, ponto de descanso dos tropeiros que levavam animais do Sul para a feira de Sorocaba, ficaria famosa porque, quando Getúlio Vargas (1882-1954) partiu de trem rumo ao Rio de Janeiro, então capital federal, esperava-se que ocorresse lá uma grande batalha, que não houve porque a cidade acolheu o futuro ditador na estação ferroviária, permitindo sua entrada no Estado de São Paulo, e os militares depuseram o presidente Washington Luís (1869-1957) em 24 de outubro daquele ano e impediram a posse do presidente eleito Júlio Prestes (1882-1946).
La Russie est-elle européenne? Qu’est-ce qu’être russe? Depuis le XVIe siècle, la Russie entretient un lien complexe et ambigu avec l’Europe occidentale. À la tête d’un véritable État-continent s’étendant de l’Europe à l’Asie, les tsars de Russie puis les leaders soviétiques n’ont cessé de s’ interroger sur l’identité de leur pays et les relations à nouer avec l’Europe, tour à tour perçue comme modèle de modernité et d’efficacité ou comme source de danger et de subversion. D’Ivan le Terrible à Vladimir Poutine, les décideurs russes ont été confrontés à ce «dilemme» : fallait-il imiter l’Europe pour mieux la dépasser, ou bien s’en protéger? D’une plume alerte, en s’appuyant sur un vaste ensemble documentaire, Marie-Pierre Rey explore les tourments de l’identité russe, à la croisée de l’histoire des relations internationales et de l’histoire des représentations.
Champs – Champs histoire | 512 pages – 108 x 178 mm
Paru le 10/02/2016 | Format poche | Genre : Histoire
A quoi bon des poètes dans un temps de détresse ? – demandait Hölderlin.
L’orgasme et la folie sont la nouvelle frontière des libérateurs de l’amour où Bukowski monte la garde – Jacques Cabau, Le Point
La réponse est dans Bukowski, dans une prose qui est l’une des plus dénonciatrices-accusatrices de ce temps. Et sans aucune issue proposée : le constat d’enfer nu, organique, brutal. Les ” caprices ” de Goya, en pleines phrases. J’ai lu quelque part que Bukowski était ” rabelaisien “. Mais non, il s’agit de quelque chose de beaucoup plus noir, de beaucoup plus simple et lisible, d’une inspiration beaucoup plus ” théologique ” sous un aira d’anarchisme absolu.
La civilisation, ou ce qui en reste, n’est pas du tout en train de ” renaître ” mais de se tasser, de se décomposer, de se décharger, et Bukowski n’a pas d’autre choix que de lui répondre du tac au tac avec le maximum de violence, à bout portant “.
Philippe Sollers, Le Nouvel Observateur ” Par-delà le cauchemar de l’histoire existe la perfection de l’amour. L’orgasme et la folie sont la nouvelle frontière des libérateurs de l’amour où Bukowski monte la garde “. Jacques Cabau, Le Point
Estarei nos risos das crianças quando têm fome e as chamam para jantar.
«Não sei para onde vou mãe (…). Andarei por ai no escuro. Estarei em toda a parte. para onde quer que olhem. Onde houver uma luta para que os famintos possam comer, estarei lá. Onde houver um policia a espancar uma pessoa, estarei lá. Estarei nos gritos das pessoas que enlouquecem. Estarei nos risos das crianças quando têm fome e as chamam para jantar. E quando as pessoas comerem aquilo que cultivam e viverem nas casas que constroem, também lá estarei.»
Antes de ir desta para melhor, vou dar com a língua nos dentes e lavar roupa suja. Com a faca e o queijo na mão, com uma perna às costas e de olhos fechados, vou sacudir a água do capote. Ainda tirei o cavalinho da chuva, tentei riscar este assunto do mapa, mas eu sou uma troca-tintas, uma vira casacas e vou voltar à vaca fria.
Andava eu a brincar aqui com os meus botões, a chorar sobre o leite derramado, com bicho carpinteiro e macaquinhos na cabeça, quando decidi procurar uma agulha no palheiro. Eu sei, eu não bato bem da bola, mas sentia-me pior que uma lesma e tinha uma pedra no sapato. O problema é que andava a bater com a cabeça nas paredes há algum tempo, com um aperto no coração e uma enorme vontade de arrancar cabelos. Passei muitos dias com cara de caso e com a cabeça nas nuvens como uma barata tonta.
“A Mãe Igreja na Serra de Aire – Uma descoberta de Alcanena a Fátima” é uma edição de autor, escrita em coautoria por Inês Santos e Rosa Neto, duas catequistas do Covão do Coelho, diocese de Leiria-Fátima, concelho de Alcanena. A obra teve a sua génese nas sessões da catequese com a preparação dos jovens para a Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023, mas com o tempo ganhou maiores contornos.
A apresentação pública está para breve, em Minde e no Covão do Coelho, mas o livro já está à venda: online na BookMundo; diretamente às autoras*; entretanto na FNAC. Pagos os custos da impressão, todo o ganho com a venda da obra será entregue à Paróquia de Minde, para ajuda à aquisição de um sistema de som para a capela do Covão do Coelho.
O prefácio é assinado pelo padre Sebastian Joseph, sacerdote indiano da Congregação do Verbo Divino e pároco de Minde e da Serra de Santo António, para quem o livro “vai despertar muita curiosidade”. Isto porque, refere, “para os mais velhos é uma recordação daquilo que foi ou já existiu e para os mais novos um convite a manter as belas tradições, devoções e a revivê-las”.
A conquista de Lisboa aos mouros em 1147 numa pintura de Roque Gameiro.
O terceiro volume com que Sérgio Luís de Carvalho vem fazendo a história da capital portuguesa é dedicado à presença árabe em Lisboa: “Uma viagem maravilhosa por um legado com mais de mil anos de história”.
O historiador Sérgio Luís de Carvalho tem vindo a publicar uma série de livros em que o tema é a história de Lisboa. Após Lisboa Nazi e Lisboa Judaica, lança agora Lisboa Árabe. Quando se lhe pergunta qual dos três volumes seduzirá mais os leitores, considera que, apesar do interesse específico de cada um, admite que Lisboa Nazi possa “ter os ingredientes para cativar desde logo um leitor interessado em temas históricos, no geral. É um assunto mais “perto” de nós e cujos ecos e feridas ainda se poderão fazer sentir”. Quanto aos outros dois, que têm uma componente religiosa maior, refere que “terão mais fôlego em termos diacrónicos, o que levará a uma visão mais “prolongada” temporalmente”. O trio sobre Lisboa não deverá terminar com esta nova investigação e adianta que “é possível, até provável” novos títulos. No entanto, diz, “no caso plausível de haver continuação, tenho de pensar bem como manter o nível e a coerência do projeto”.
A História do Brasil teria que ser contada por um coral de historiadores, apoiados em narrativas de cronistas, aventureiros, viajantes constrangidos ou deslumbrados. Uma inicial e lógica exploração feita a partir da costa, seguida de penosas internações. Todas milagrosamente rápidas, tendo em vista os recursos da época, pois falamos de um passado de meio milhar de anos. Registros, documentos, cartas, mapas (de incrível rigor, em face dos recursos da época), bem como a ansiosa busca de riquezas para uma Europa que experimentara a incubação medieval e a explosão do Renascimento.
Não à toa, Espanha e Portugal, dois países debruçados sobre o mar, como se espichando um pescoço geográfico para o Hemisfério Sul ali dominado pelo Atlântico, lançaram-se à cata de riquezas. A terra lusitana, restrito território, pobre de recursos naturais, mais do que todos, levou a conquista a sério.
Nenhuma colonização é angelical. Antes é fria, cruel e espoliadora. Assim, dizer que o Brasil teria se tornado um país melhor se ficasse com espanhóis, com ingleses, franceses ou (que deslumbramento!) dourados holandeses, nos parece uma conjectura ingênua. Historicamente (ou fatalmente) ficamos com Portugal. E será sobre essa nação e seu povo – tão péssimo como os mais péssimos, tão notável quanto os mais notáveis – que devemos falar.
Ainda a recuperar das ondas de choque e espanto desencadeadas pela estreia no Teatro Nacional de S. João de ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA, a partir do romance de José Saramago. A encenação de Nuno Cardoso, com versão cénica de Cláudia Cedó, a par do espantoso trabalho dos actores, proporciona uma daquelas raras situações em que sentimos estar a viver um momento único. Porventura irrepetível. Romance poderoso sobre uma distopia, evolui em palco como um inquietante épico momento teatral.
Quando se pergunta para que serve um Teatro Nacional, aqui está a esmagadora resposta. Um espectáculo com esta grandeza só é possível graças a uma co-produção que envolve o TNSJ e o Teatre Nacional de Catalunya. Com actores portugueses e catalães (legendas em português e catalão) a peça, até pela sua duração, se surge como um desafio para os actores, não deixa de constituir um permanente desassossego para os espectadores. Até pela surpresa e inventividade de algumas opções cénicas.
Dali ninguém sai como entrou. Mas ninguém se devia furtar à experiência de ir ao TNSJ para, se puder olhar, ver. Se puder ver, reparar.
Um menino que vive em Portugal e, de repente, deixa de ir à escola, perde o contato com os amiguinhos e que olha através da janela as pessoas que passam na rua, todas mascaradas. Esse é o universo do livro do gênero infantil Confinados (Amadora, Edição Canto Redondo, 2022), de autoria do brasileiro Ozias Filho, jornalista carioca radicado em Portugal há mais de três décadas, e do artista plástico português Nuno Azevedo, responsável pelas várias belas peças que ilustram a obra.
Igualmente fotógrafo e responsável por uma coluna no tradicional jornal literário impresso Rascunho, de Curitiba, Ozias Filho escreve poesia, contos, notícias para jornais erevistas e é autor de livros com textos e outros com muitasfotografias de lugares bonitos. Desta vez, porém, ingressa pela primeira vez na experiência de escrever livros para o público infantil. E se sai muito bem porque consegue escrever como se fosse um menino, o que garante que será lido por pais e filhos por muito tempo, mesmo depois que a pandemia de coronavírus (covid-19) venha a se tornar apenas uma amarga lembrança como a peste negra (peste bubônica), a gripe espanhola, a Aids (Sida)e outras pestes.
Oitavo romance de João Almino será fundamental para quem quiser saber, daqui a cem anos, o que foi o Brasil destes tempos.
I
Foi quando já estava em seus derradeiros anos que Machado de Assis (1839-1908) escreveu o romance Memorial de Aires (1908) e que tem como personagem principal o conselheiro Aires, um diplomata em fim de carreira que já havia aparecido em Esaú e Jacó (1904) como participante do enredo, anotando em seu caderno tudo o que de mais significativo acontecia ao redor de sua vida. Esse personagem-narrador seria um alter ego do autor, como deixam concluir algumas coincidências, tais como a idolatria que dedica à mulher e a ausência de filhos em seu casamento.
Pois é esse personagem carismático que já não se sentia como “deste mundo”, pois se achava um homem do século XIX, que o premiado romancista João Almino ressuscita e transporta para o século XXI em sua última obra, Homem de papel (Editora Record, 2022), que, desta vez, alinha-se ao gênero da metaficção, ao romper com os cânones do Modernismo, mostrando-o como um autor pós-modernista. É o que se conclui da observação do professor Abel Barros Baptista, da Universidade Nova de Lisboa, feita no posfácio, ao ressaltar que “a primeira possibilidade de Homem de papel é assim a metaficcional”, com “Aires narrando-se de novo, mas para se inventar novo”.
Terceiro livro do professor Sebastião Marques Cardoso, Poéticas da mestiçagem – textos sobre culturas literárias e crítica cultural (Curitiba, Editora CRV, 2014) resume a clivagem que o autor fez em seus estudos a respeito da literatura brasileira a partir do conhecimento de textos de autores oriundos de países africanos de língua oficial portuguesa, o que se deu, em 2009, quando, já doutor em Letras pela Universidade de São Paulo (USP), atuou como leitor na Embaixada do Brasil na Guiné-Bissau com bolsa oferecida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), fundação vinculada ao Ministério da Educação. À época, auxiliou na docência e na administração da Universidade Amílcar Cabral (UAC) e tornou-se o primeiro assessor científico daquela instituição, na ocasião, partilhada com a Universidade Lusófona da Guiné (ULG). Hoje, a UAC, pública, e a ULG, particular, não estão mais interligadas.
Se durante o período da graduação, do mestrado e do doutorado, Cardoso optou pelo estudo de personagens anônimos da literatura brasileira, considerando-os “figurinos” em João do Rio (1881-1921) e “anti-heróis”, em Oswald de Andrade (1890-1954), a partir da experiência africana ampliou suas reflexões críticas, estudando principalmente a obra do guineense Abdulai Sila (1958), autor de Eterna paixão (1994), que é considerado o primeiro romance de seu país. Como observa o professor Benjamin Abdala Junior, da USP, no prefácio que escreveu para a obra, nestes estudos sobre poéticas da mestiçagem há “reflexões atuais sobre as bases críticas da formação de nosso imaginário nacional e também sobre as que se desenharam nos países africanos de língua oficial portuguesa, na particularidade da Guiné-Bissau”.
«No dia em que uma estátua é acabada, começa, de certo modo, a sua vida. Fechou-se a primeira fase, em que, pela mão do escultor, ela passou de bloco a forma humana; numa outra fase, ao correr dos séculos, irão alternar-se a adoração, a admiração, o amor, o desprezo ou a indiferença, em graus sucessivos de erosão e desgaste, até chegar, pouco a pouco, ao estado de mineral informe a que o seu escultor a tinha arrancado. Já não temos hoje, todos o sabemos, uma única estátua grega tal como a conheceram os seus contemporâneos.»
SOBRE A AUTORA: Marguerite Yourcenar (quase um anagrama do seu apelido verdadeiro, Crayencour) nasceu a 8 de Junho de 1903 em Bruxelas. Escreveu romances como Memórias de Adriano e A Obra ao Negro, e várias novelas. Publicou poesia e traduziu Virginia Woolf, Kavafis, Henry James e espirituais negros. Foi ainda ensaísta e crítica.Primeira mulher eleita para a Academia Francesa, em 1980, afirmou não conceder importância a tal distinção. A sua infância foi invulgar. A mãe morreu quando ela tinha dez dias, sendo educada pela rígida avó paterna e pelo pai, ligado à aristocracia, um viajante inconformista que desempenhou um papel de relevo na sua formação pessoal e literária. Marguerite Yourcenar passava os Invernos em Lille e os Verões, até aos 11 anos, na propriedade familiar em Mont Noir. Estudou em casa e o seu pouco memorável livro de poemas, Le Jardin des chimères, saiu em edição de autor quando tinha 18 anos. Acompanhou o pai em viagens a Londres, durante a Primeira Guerra Mundial, à Suíça e a Itália, onde descobriram a Villa Adriana.
«A ideia do Diário do Escritor nasceu durante a estada de Dostoiévski no estrangeiro em 1867-1871. Sempre atento aos acontecimentos da vida corrente, o escritor sabia captar nos factos aparentemente insignificantes os indícios de fenómenos históricos globais, sabia discernir o lugar desses factos no processo histórico de desenvolvimento dos países, dos povos e das religiões. Os textos do seu “Diário”, enquanto análise e interpretação dos acontecimentos da sua época do ponto de vista da eternidade histórica, mantêm o seu carácter actual ainda hoje, passado quase um século e meio desde a sua criação.» [Da Nota Introdutória de Nina Guerra]
SOBRE O AUTOR: Fiódor Dostoievski nasceu em Moscovo em outubro de 1821, o segundo de sete filhos. A mãe morreu em 1837, de tuberculose, e o pai, médico, saído da nobreza provinciana, foi assassinado dois anos depois, quando se instalara já como proprietário rural. Dostoievski estudou num colégio interno em Mos- covo e, entre 1838 e 1843, frequentou a Academia Militar de Engenharia, onde se interessou mais por Púchkin, Gógol e Lérmontov do que pelas disciplinas do curso. Nessa época, leu também Shakespeare, Byron e Balzac (traduziu Eugénie Grandet), Victor Hugo, Hoffmann, Goethe e Schiller. Publicou a sua primeira história, «Gente Pobre» (onde a influência de O Capote de Gógol é visível), aos vinte e cinco anos, obtendo um enorme sucesso.
Em 1849, quando escrevera já uma dúzia de contos, foi preso e condenado à morte por participar no Círculo Petrashevski. A pena foi substituída à última hora por cinco anos de trabalhos forçados numa prisão siberiana.
Na noite passada, tive um sonho desses bem vívidos, difíceis de esquecer. Eu estava num lugar diferente do que vivo hoje, numa espécie de aldeia, para a qual eu havia acabado de me mudar. Era meu primeiro dia naquela casa, e eu tirava minhas coisas de caixas, quando a paisagem roubou minha atenção. Da janela, eu podia ver um castelo belíssimo, com uma cúpula arredondada. Eu sabia que estava perto do mar e, de repente, conseguia sentir a maresia e ouvir o som das ondas, que começaram a parecer cada vez mais fortes. Enquanto eu admirava o castelo, que agora parecia estar ao alcance das minhas mãos, comecei a ver as ondas arrebentando em suas muralhas. Pensei estar presenciando uma ressaca, algo que me é tão familiar na Ponta da Praia, em Santos.
Em poucos segundos, o mar avançou. As ondas ficavam cada vez maiores, mais fortes, até que uma delas cobriu o castelo. Eu sentia que a próxima seria ainda maior. Vi quando ela, gigante, começou a se formar e cobrir o sol. Eu me afastei um pouco da janela e, embora fosse um cenário cataclísmico, não senti um medo paralisante.
Eu só o conheci recentemente. Nunca havia me aproximado, pois achava que era demais para mim. O clichê “muita areia para meu caminhão”, gritava forte toda vez que eu pensava nisso. Até que um dia dei de cara com ele que, sedutor, acenou-me. Olhei ao redor, para confirmar se era mesmo comigo, e percebi que havia apenas eu e ele — que sempre foi meu crush —na sala. Naquele momento, tive certeza de que esse segredo já não fazia mais sentido. Tomei coragem e o convidei para sair dali. Ele foi simpático, agradeceu e, posso jurar, pareceu aliviado.
No início, conversávamos todas as noites. Na verdade, eu só me mantinha atenta às suas palavras. Ele contou-me a história de um pescador. Uma história que falava do humano e da sua coragem. E sobre não termos controle de todas as coisas o tempo todo: circunstâncias, natureza, o que fazem as outras pessoas, nem mesmo das nossas necessidades essenciais. Falava da importância de olharmos para a vida com simplicidade. E que a medida da nossa força vai muito além do corpo que nos serve de instrumento. Contou-me isso de maneira seca. Direta. No fim da história, chorei um choro doído pela beleza crua da vida. Percebi como é frágil a matéria de que somos feitos. E, ainda assim, ela pode nos levar longe, pois tem algo de indestrutível.
SÃO PAULO – O livro Logística: os novos desafios (São Paulo, 2020), de Milton Lourenço, belamente ilustrado pelo artista plástico Paulo von Poser, lançado em homenagem póstuma a um importante empresário, é obra extremamente importante na área de comércio exterior, pois constitui um mosaico de textos brilhantes. Ex-diretor do Grupo Fiorde, Milton Lourenço (1967-2020) era, por assim dizer, um visionário, dotado de uma mente brilhante e muito além de sua época.
Neste livro, reuniu textos sobre temas importantes como concorrência desleal, desindustrialização em marcha, o porto de Santos e seus desafios, modernização, o isolacionismo brasileiro, Mercosul-União Europeia, os embates EUA x China, entre outras tantas dezenas de temas enfocados com qualidade de conhecimento profundo e escrita de qualidade. Em muitos de seus artigos, defendeu a ideia de que o Brasil, para aumentar a sua participação no comércio exterior, teria de assinar mais acordos com grandes países e blocos.
Depois de publicar, em 2018, Ele está no meio de nós (Curitiba, Kotter Editorial) e, em 2019, O Marceneiro: a última tentativa de Cristo (Maringá-PR, Editora Viseu), Silas Corrêa Leite (1952) acaba de lançar o romance Cavalos Selvagens, publicação que marca o início de uma parceria entre as editoras Letra Selvagem, de Taubaté-SP, e Kotter Editorial, de Curitiba-PR. Este romance, escrito há 15 anos, porém, não faz parte da projetada trilogia aberta pelas duas obras anteriores. Segundo o autor, o último livro da trilogia está praticamente concluído e deverá vir a público em 2023.
A nova obra do romancista e poeta, a exemplo das anteriores, pode ser definida como mística, ecumênica e religiosa, mas vai além, partindo do título inspirado numa canção dos roqueiros ingleses Keith Richards e Mick Jagger, em que a expressão “cavalos selvagens” pode ser apenas uma metáfora de tudo o que o ser humano é, como se lê em Hamlet, tragédia do poeta, dramaturgo e ator inglês William Shakespeare (1564-1616), escrita entre 1599 e 1601 e que explora temas como traição, vingança, incesto, corrupção e moralidade.
Sans clepsydre, ni sablier, sans horloge, ni pendule, sans attendre le crépuscule, Amira s’inquiète de l’heure, elle l’observe.
Son visage adoré est son cadran solaire.
Hélas, elle le vois qui lui annonce que le rêve, aussi sublime fut-il ces deux dernières semaines, s’est déjà achevé, qu’il va devoir se lever, se rhabiller, son bagage boucler, qu’il va l’embrasser, et puis, encore une fois, à mille lieues d’elle, être obligé de s’en retourner.
Il es allé, son magicien, ce soir-là, jusqu’à prendre au mot cette phrase de Boris VIAN qu’elle lui avait envoyée, si innocemment :
Os ossos e ócios dos espantalhos do estupendo literato ADEMIR DEMARCHI
Breve Resenha Crítica
-Eu já o conhecia de outras plagas e sítios, das redes sociais e do próprio nome forte nas lidas da literatura contemporânea de um modo geral. Aqui e ali, volta e meia nos acercamos, mas, aqui e ali também não deu liga de presto, até que, finalmente, num desses sadios contatos que as redes sociais graciosamente propiciam, e, vai lá, agregamento feito, conexão confirmada, e ele generosamente me mandou alguns de seus portentosos livros, que, claro, sentindo-me honrado com a gentileza, e, de cara, garrei a ler, primeiro o livraço ESPANTALHOS, 312 pgs, 2017, Nave Editora de SC. Foi a gota d´água, quero dizer, foi o tsunami literário me encantando, leitor voraz…
Mulheres fantásticas (Mossoró: Sarau das Letras Editora; Fortaleza: Edições Poetaria, 2019), reunião de dezoito pequenos contos, do cronista, romancista, crítico literário e contista Clauder Arcanjo (1963), que constitui um tributo ao realismo fantástico tão presente nas histórias do Nordeste brasileiro, na definição do próprio autor, tem como figura central a mulher e suas habilidades únicas, que tanto intrigam os homens, que, muitas vezes, buscam em vão explicações para o seu comportamento. Não foi para tentar encontrar essas respostas que o Clauder Arcanjo escreveu estes contos, mas, principalmente, para realçar estes mistérios.
Para tanto, tratou de imaginá-las como elementos da natureza, objetos e até animais, como galinha, sapo, abelha, mas sem cair no tratamento chulo das palavras, ou ainda forças naturais, como ventania, maré e nuvem, ou sentimentos, como saudade, mostrando com leveza e bom humor os dramas que ocorrem no relacionamento entre homens e mulheres. Na visão do autor, os homens se mostram frágeis e incapazes de compreender a sensibilidade delas.
Em Portugal, há duas coisas grandes, pela força e pelo tamanho: Trás-os-Montes e o Alentejo. Trás-os-Montes é o ímpeto, a convulsão; o Alentejo, o fôlego, a extensão do alento. Províncias irmãs pela semelhança de certos traços humanos e telúricos, a transtagana, se não é mais bela, tem uma serenidade mais criadora. Os espasmos irreprimíveis da outra, demasiado instintivos e afirmativos, não lhe permitem uma meditação construtiva e harmoniosa. E compreende-se que fosse do seio da imensa planura alentejana que nascesse a fé e a esperança num destino nacional do tamanho do mundo. Só daquelas ondas de barro, que se sucedem sem naufrágios e sem abismos, se poderia partir com confiança para as verdadeiras. Enquanto a nação andava esquiva pelas serras, ninguém se atreveu a visionar horizontes para lá da primeira encosta. Mas, passado o Tejo, a grei foi afeiçoando os olhos à grande luz das distâncias, e D. Manuel pôde receber ali a notícia da chegada de Vasco da Gama à Índia.
Terra da nossa promissão, da exígua promissão de sete sementes, o Alentejo é na verdade o máximo e o mínimo a que podemos aspirar: o descampado dum sonho infinito, e a realidade dum solo exausto.
Não sei se Manuel Maria de Barbosa du Bocage (1765-1805) era bilharista. A sê-lo, alinharia pelos que se comprazem na complexidade do jogo às três tabelas, arredio a submeter-se às triangulações mais clássicas e lineares — a acreditar no vaticínio do seu arqui-inimigo José Agostinho de Macedo: “É um gênio incapaz de simetria!” De fato, não se pode dizer de Elmano Sadino — o seu nome arcádico — que, como Shakespeare, Mozart ou Picasso, fosse artista, capaz de captar, sintetizar ou magnificar tudo o que a sua época lhe oferecia.
Há um anacronismo muito português que o fere, um engenho que lhe minou a obra até ao achamento de si. Para a época clássica, a natureza do gosto era submetida a leis universais e invioláveis e seria necessário romper com demasiadas coisas para assomar no plano estético a subjetividade que culminaria no Romantismo.
Bocage, por exemplo, fez a gesta, mas tal como Ovídio, que traduziu, só procurou nos lugares a reminiscência “histórica”. Foi essa a ilusão que o traiu, a raiz do seu desencontro com os lugares — velados pelos mitos. Vai ao Brasil, à Ilha de Moçambique, a Goa, a Damão, a Macau, perseguindo a irradiação de Camões, sem se abrir à experiência.
Tinha em mãos o projecto do livro UM HOMEM SÓ, título que poderia ser interpretado como “um homem sozinho”, ou “apenas um homem”.
Chegava a contemplar a segunda dimensão, depois de um longo cepticismo em relação ao que aprendera em criança, mas a figura de Jesus Cristo, como a de qualquer outro profeta, era e é demasiado importante para aqueles que acreditam na sua palavra. Não podia desrespeitá-los.
E depois, à medida que ia lendo e pesquisando documentos, ia recordando que o evangelho de Jesus Cristo não é uma religião, contém em si a significação universal mais completa, que abrange o princípio de todas as religiões.
Lembra que os homens têm a mesma origem e um destino comum, partilham um só planeta, a mesma casa. As suas vidas pessoais e colectivas só têm significado com o compartilhamento dos recursos e adopção do respeito mútuo, porque é inevitável que se cruzem em trocas de experiências e miscigenações.
Antes de todos os princípios, o da fraternidade é essencial. Era esse, essa filosofia de vida, que Jesus pregava. O outro, subentendido, é o do acesso à educação, ou abertura da mente, na altura pela escuta da palavra, para que o esclarecimento afaste os densos véus do obscurantismo.
“O autor mergulha na alma contundente de prismas rápidos. Anacronismos e anomalias em nanonarrativas cênicas e rasteiras. Com sintaxe peculiar, quando não língua bárbara, toda própria, cria desconstruindo situações e momentos, expressando seu desencantamento em fios desencapados. Um esgotamento em nódoas corrosivas, misturando ora Tutti, ora Frutti…
Escritor, professor e blogueiro premiado, com sua carga de ceticismo conta o embuste social paranoico numa literatura contemporânea. O sabor da opereta bufa, tipo deja-vu, guloseima em prosa irônica. Tudo junto e misturado. Esquentando cérebros, instantes-trevas. Periga ler o anacrônico, purgativo e inaceitável. Situações corrosivas e surtos circuitos de criações hilárias, horrendas ou obscuras; luz criativa sobre particularidades assustadoras. Tirem o sorriso do caminho, que Tutti-frutti vai passar com seu escárnio.” (Divulgação, Cult News – Maria das Graças Aranha)
Sobre o autor :
Professor, escritor e blogueiro premiado, 68 anos, nascido em Monte Alegre, criado em Itararé-SP. Autor de outros livros, como Goto, a lenda do Reino do barqueiro noturno do rio Itararé. Consta em várias antologias literárias em verso e prosa, inclusive no exterior. Criador do Estatuto de poeta, traduzido para o inglês, francês, espanhol e russo. Elogiado por Moacyr Scliar, Ignácio de Loyola Brandão e Ledo Ivo, da ABL (Academia Brasileira de Letras), e Adelto Gonçalves e Oscar D´Ambrósio (USP). Acredita na arte como libertação, e seu mote predileto é “Feridos Venceremos”.
Esta obra faz parte do projeto 2 em 1, em que publicamos dois autores em um mesmo volume.
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“Toda arte é uma forma de literatura, porque toda arte é dizer qualquer coisa, disse Fernando Pessoa. A literatura, como toda a arte, é uma confissão de que a vida por si só não basta, disse Heróstrato. Já Afrânio Coutinho preconizou que a Literatura é, assim, a vida, parte da vida, não se admitindo possa haver conflito entre uma e outra. Já para o filósofo grego Aristóteles, um dos primeiros a focar nos estudos sobre essa arte, a arte literária é mimese (imitação); é a arte que imita pela palavra” – Silas Corrêa Leite in Micro ensaio sobre a literatura itarareense.
Nesses tempos tenebrosos, de hordas fascistas no poder, em meio a uma crise pandêmica, resistir é preciso, insurgir-se é preciso, e mais, criar – a arte literária como libertação, levitação e assento desses tempos – é preciso.
Ezra Pound dizia que o artista deve ser antena de sua época, e a isso muito bem o autor se propõe, e assim se apresenta literariamente. A literatura é uma defesa contra as ofensas da vida, disse o poeta italiano Cesare Pavese.
Pelas obras literárias fazemos contato com a vida, nas suas verdades eternas, comuns a todos os homens e lugares. Por essas e outras, receber um livro de versos e prosas registrando resistências, sequelas e experiências, a crise pandêmica como um todo, é sempre um prazer imenso, mormente se o autor contemporâneo for um conterrâneo amigo, jovem pupilo, pensador, criador, estudioso com verve.
COLISEU TROPICAL, o livro de Viegas Fernandes da Costa como um soco duro, fértil e impactante, nesses tenebrosos tempos pandêmicos do fascista necrobrasilis S/A.
“Houve um tempo em que as vidas não estavam escritas” – A Cidade Transparente – Ana Alonso Javier Pelegrin Pere Ginard.
Se “A literatura é uma oferta de espaço”, como bem disse Georges-Arthur Goldschmidt, o livraço COLISEU TROPICAL de Viegas Fernandes da Costa, impactante, feroz e voraz a palo seco, nos assaca de cara, como um soco, a nos remeter, por exemplo, a Kafka: “De modo geral, acho que devemos ler apenas os livros que nos cortam e nos ferroam. Se o livro que estivermos lendo não nos desperta como um golpe na cabeça, para que perder tempo lendo-o, afinal de contas? Para que nos faça feliz, como você escreveu? Meu Deus, poderíamos ser tão felizes assim se nem tivéssemos livros; livros que nos alegram, nós mesmos também poderíamos escrever num estalar de dedos. Precisamos, na verdade, de livros que no toquem como um doloroso infortúnio, como a morte de alguém que amamos mais do que a nós mesmos, que nos façam sentir como se tivéssemos sido expulsos do convívio para as florestas, distantes de qualquer presença humana, como um suicídio. Um livro tem de ser o machado que rompe o oceano congelado que habita dentro de nós.” (Citação de Kafka, no livro História da leitura, Steven Roger Fischer, p. 285).
«No dia em que uma estátua é acabada, começa, de certo modo, a sua vida. Fechou-se a primeira fase, em que, pela mão do escultor, ela passou de bloco a forma humana; numa outra fase, ao correr dos séculos, irão alternar-se a adoração, a admiração, o amor, o desprezo ou a indiferença, em graus sucessivos de erosão e desgaste, até chegar, pouco a pouco, ao estado de mineral informe a que o seu escultor a tinha arrancado. Já não temos hoje, todos o sabemos, uma única estátua grega tal como a conheceram os seus contemporâneos.»
SOBRE A AUTORA:
Marguerite Yourcenar (quase um anagrama do seu apelido verdadeiro, Crayencour) nasceu a 8 de Junho de 1903 em Bruxelas. Escreveu romances como Memórias de Adriano e A Obra ao Negro, e várias novelas. Publicou poesia e traduziu Virginia Woolf, Kavafis, Henry James e espirituais negros. Foi ainda ensaísta e crítica.Primeira mulher eleita para a Academia Francesa, em 1980, afirmou não conceder importância a tal distinção. A sua infância foi invulgar. A mãe morreu quando ela tinha dez dias, sendo educada pela rígida avó paterna e pelo pai, ligado à aristocracia, um viajante inconformista que desempenhou um papel de relevo na sua formação pessoal e literária. Marguerite Yourcenar passava os Invernos em Lille e os Verões, até aos 11 anos, na propriedade familiar em Mont Noir. Estudou em casa e o seu pouco memorável livro de poemas, Le Jardin des chimères, saiu em edição de autor quando tinha 18 anos. Acompanhou o pai em viagens a Londres, durante a Primeira Guerra Mundial, à Suíça e a Itália, onde descobriram a Villa Adriana.
[…] D’abord fuir la peste de cette tristesse gluante, que par tombereaux entiers, tous les jours, on déverse sur nous, cette vase venimeuse, faite de haine de soi, de haine de l’autre, de méfiance de tout le monde, de ressentiments passifs et contagieux, d’amertumes stériles, de hargnes persécutoires.
Fuir l’incrédulité ricanante, enflée de sa propre importance, fuir les triomphants prophètes de l’échec inévitable, fuir les pleureurs et vestales d’un passé avorté à jamais et barrant tout futur.
Une fois réussie cette difficile évasion, […]
Expérimentons, nous-mêmes, expérimentons, humblement, joyeusement et sans arrogance. Que l’échec soit notre professeur, pas notre censeur. Cent fois sur le métier remettons notre ouvrage. Scrutons nos éprouvettes minuscules ou nos alambics énormes afin de progresser concrètement dans notre recherche d’une meilleure société humaine. Car c’est du minuscule au cosmique que ce travail nous entrainera et entraine déjà ceux qui s’y confrontent. Comme les poètes qui savent qu’il faut, tantôt écrire une ode à la tomate ou à la soupe de congre, tantôt écrire Les Châtiments. Sauver une herbe médicinale en Amazonie, garantir aux femmes la liberté, l’égalité, la vie souvent.
Et surtout, surtout, disons à nos enfants qu’ils arrivent sur terre quasiment au début d’une histoire et non pas à sa fin désenchantée. Ils en sont encore aux tout premiers chapitres d’une longue et fabuleuse épopée dont ils seront, non pas les rouages muets, mais au contraire, les inévitables auteurs.
Il faut qu’ils sachent que, ô merveille, ils ont une œuvre, faite de mille œuvres, à accomplir, ensemble, avec leurs enfants et les enfants de leurs enfants.
Disons-le, haut et fort, car, beaucoup d’entre eux ont entendu le contraire, et je crois, moi, que cela les désespère.
Quel plus riche héritage pouvons-nous léguer à nos enfants que la joie de savoir que la genèse n’est pas encore terminée et qu’elle leur appartient.
Não sei se gosta de romances policiais e se leu o “Quarteto de Havana”. Vale a pena, esses livros são alguns dos raros mas saborosos casos em que a história foge do pitoresco e escapa ao padrão que define aquele estilo literário. São, simplesmente, grandes romances. Mas, como não podia deixar de ser, há um fio condutor, que no caso é a vida difícil, quem sabe se a decadência, ou devemos chamar-lhe a persistência?, de um personagem que nos conduz pelo dia a dia de Cuba: Mário Conde foi polícia, tornou-se detetive privado, é um desenrascador, vagamente justiceiro, além de ser um gastrónomo militante, sobrevivendo encostado aos milagres da cozinha da mãe de um antigo camarada de aventuras. Navegando pelas ruas de Havana, Conde chega onde os seus antigos colegas não vão, descobre o crime de um membro do Comité Central, investiga traficâncias de diplomatas, roubos de arte, negócios de emigrados, polícias corruptos e que fecham os olhos, contorna burocratas implacáveis. Há nos livros alguma tristeza, bastante nostalgia e um gigantesca afirmação de amor pela sua terra. E perdemo-nos em intrigas sem concessões, chegamos a finais amargos, o escritor não nos facilita a vida, a rotina continua em Havana.
Leonardo Padura, o autor, é mais conhecido por outros escritos ousados, “O Homem que Gostava de Cães” ou “Os Hereges”. Mas foi com Mário Conde que começou e foi assim que foi descoberto pelos seus compatriotas. Porventura por isso, Conde regressou em “A Transparência do Tempo” para novas rodadas. Graças ao “Quarteto”, a Conde e a toda a sua obra, Padura será o escritor mais popular no seu país, onde ninguém ignora que se trata de uma voz crítica. Por isso, quando a direita festeja os protestos populares nas ruas de várias cidades, fantasiando triunfantemente a vingança de Batista, e enquanto nas esquerdas as opiniões se dividem entre defensores do regime, incluindo alguns dos seus conversos mais recentes que, ao tempo do choque entre Krutchov e Castro estavam indefetivelmente do lado soviético, e aqueles que sentem o protesto popular sobre dificuldades reais de gente real, quando tantas palavras são esgrimidas sem candura, ficamos a saber mais sobre Cuba se o ouvirmos.
Editar uma revista dedicada à poesia no Brasil é um desafio que sempre beirou a utopia. Mesmo assim, o poeta e ensaísta Ademir Demarchi, doutor em Letras pela Universidade de São Paulo (USP), decidiu enfrentá-lo em 2000, quando começou, com o apoio de mais três coeditores, a editar a Babel – Revista de Poesia, Tradução e Crítica, que, em sua primeira fase, teve seis edições e durou até 2004. Depois de muita luta junto a órgãos governamentais para obter apoio e até conquistar o primeiro lugar na seleção do Programa Cultura e Pensamento 2009/2010 do Ministério da Cultura, a revista com o título Babel Poética voltou a ser editada por mais seis vezes, de 2009 a 2013. Em 2017, a revista teve uma terceira fase com mais três edições, resultado de premiação do Programa de Ação Cultural (ProAC) do Governo do Estado de São Paulo, chegando a 15 edições no total.
A história dessa odisseia literária o leitor pode conhecer a partir da leitura de “Babel Poética: a poesia na era Lula”, ensaio que abre a segunda parte do livro Espantalhos (Florianópolis, Nave Editora, 2017), de Ademir Demarchi, em que o editor conta a sua decepção com a Lei Rouanet, que, a princípio, apoiaria iniciativas culturais. “(…) o governo proclama o investimento em cultura através de uma renúncia fiscal que não se cumpre, uma vez que delega aos empresários o poder de decisão de usar essa renúncia. Ocorre que o empresariado, além de massivamente ignorante e inculto, com um imenso contingente habitando confortavelmente os índices de analfabetismo funcional, não tem interesse em cultura e os que têm algum interesse não o têm em revistas. Ainda mais de poesia (…).
Num país em que se ouve comentários sobre a venda de sentenças por juízes, parlamentares legislam em causa própria aumentando de maneira desmedida a verba do fundo do partidário, ex-militares e ex-policiais engrossam as fileiras de milícias que oferecem na base da extorsão segurança particular aos moradores de bairros mais aquinhoados, vereadores e deputados costumam distribuir cargos desde que os favorecidos lhes desviem parte dos salários e, enfim, a corrupção chega a níveis estratosféricos, não é difícil imaginar uma possível reação abrupta daqueles que já não suportam tantos ataques aos cofres públicos. E acabariam recorrendo igualmente a meios ilegais.
Esse é o cenário do romance policial “Os terroristas – uma audaciosa vingança que irá abalar o Congresso”, do médico oftalmologista e escritor gaúcho Leandro Osterkamp Pedrozo, publicado em 2013, como num prenúncio dos momentos difíceis que o Brasil iria viver nos anos seguintes. Segundo a trama, um grupo autointitulado “Filhos do Brasil” assume a tarefa de livrar o país de tanta corrupção exatamente pela via mais rápida: assassinando os corruptos. Com armas de alta precisão e mira telescópica, jovens integrantes daquele grupo, em um documento intitulado “Carta aos Brasileiros”, assumem a autoria do assassinato de quatro parlamentares e prometem que, “de hoje em diante, cada corrupto será condenado por seus crimes”.
“…quem somos nós, autointitulados humanos, senão meros cavalos passando de mão em mão e servindo como veículos para que a vida possa escorrer por meio de nossas existências? – Roberto Damatta
-Como em seus outros diferenciados romances anteriores, o polímata Silas Corrêa Leite de novo se supera. Seu novo livro, bancado pela LetraSelvagem (SP) e Kotter (PR) – Editoras que inauguram parceria de coedição – começa como se em um thriller desesperado e assustador, já iniciando a própria dicotomia que funda a obra como um todo, feições entre a vida morrendo e a morte nascendo, nesses entremeios o medo, o desespero, revisitanças, mais doces e amargas memórias, passagens de vidas a limpo, a corrida contra o tempo, desvãos de almas, tudo isso partindo de uma doença fatal, da capital, para o interior, mais precisamente Itararé, sudoeste do Estado de São Paulo, divisa com o noroeste do Paraná, e ali finca-se o palco do romance em que o cavalo selvagem pode ser apenas uma metáfora de tudo o que somos, como em Hamlets, carnicentos e afins. Diz o rock Cavalos Selvagens “A infância é algo fácil de viver(…)/Você sabe que não posso deixar você deslizar pelas minhas mãos(…)/Cavalos selvagens não conseguiriam me levar embora(…)/Eu assisti você sofrer uma dor lancinante(…)/Nenhuma saída ligeira ou falas nos bastidores(…)/Podem me fazer sentir amargurado ou lhe tratar com grosseria – Wild Horses, (Composição de Keith Richards / Mick Jagger).
Et si on parlait de “Le Soleil rouge du Tsar” de Violette Cabesos, sorti là, en mars 2021 chez l’éditeur Mon Poche.
Milena, petite-fille de Russes blancs, a une passion : les trésors perdus de la Russie des tsars. Alors qu’elle s’apprête à partir pour Saint-Pétersbourg où une cache datant de 1917 vient d’être découverte, elle apprend que sa maison de Nice a été saccagée. Sur les murs, d’énigmatiques vers slaves, probablement des références codées à Vladimir le Grand, fondateur de la Sainte Russie.
Un siècle auparavant, Vera, ballerine du théâtre Mariinsky, est déchirée entre les faveurs d’un grand-duc, son amour pour un poète anarchiste, et un brûlant secret d’Etat dont sa famille est dépositaire.
Au-delà du temps et des frontières, une mystérieuse et terrifiante malédiction semble lier ces deux femmes. Faut-il y croire ? Comment ne pas y succomber ?
Au fil d’un suspense historique éblouissant d’érudition, Violette Cabesos nous plonge dans les méandres de la Russie éternelle, sur les traces des Romanov, de Raspoutine et d’obscurs espions du FSB.
Les jours de ce mois d’avril risque de se rallonger avec un confinement qui n’en est pas vraiment un, enfin confusion et restrictions et besoin que le moral remonte en flèche, … j’attendais avec impatience en avril une avalanche de polars, dont un grand nombre seront chroniqués ici … dès que je les aurais lus, bien sûr, le polar et moi , c’est toute une histoire ! En attendant, voici ceux que j’ai apprécié
Sortir de sa sphère de contact, être déstabilisé par une intrigue, la réaction d’un personnage, ou même changer carrément de décor, se plonger dans un futur imaginaire et imaginé, pour se poser des questions, avancer ou juste s’amuser.
Dans cette dernière catégorie, au rayon Angoisse, La maison à Claire-Voie de Brice Tarvel (Zinedi) est un recueil de nouvelles dont la précision d’écriture fait monter sans cesse la tension.
Au rayon Anticipation, Cinquante-trois présages de Cloé Mehdi (Seuil) démontre la talent de cette jeune auteure qui, après nous avoir expliqué l’avènement d’une Multitude de divinités, nous présente une de leurs messagers avec toutes ses difficultés spirituelles et matérielles. Ce roman nous offre la possibilité de réfléchir à la fois sur les pauvres et leur manque d’espoir mais aussi sur la religion et son devenir, ce qui en fait un roman puissant.
Embora abarcando temas muito diversos, o facto de ter sido escrito em 2012, faz com que muitos dos artigos deste “Palavras em Tempos de Crise” sejam verdadeiros manifestos de um homem de esquerda. Por Almerinda Bento
Há um ano tomámos conhecimento de que Luis Sepúlveda, que tinha estado nas Correntes d’Escritas na Póvoa de Varzim, estava infectado com o novo coronavírus. Viria a falecer em meados de Abril com apenas 70 anos e para quem gostava do homem e dos seus livros, foi um choque e uma grande tristeza. Ainda tenho por ler alguns dos seus livros e este ano, quando seleccionei os livros que iria ler, fui buscar um deles e, no “sorteio” dos 27 títulos a ler este ano, tirei o papelinho que dizia “Palavras em Tempos de Crise”.
Não sei se foi o facto de “Rosas de Atacama” ter sido um dos primeiros livros que li de Sepúlveda, esse livro sempre teve um lugar muito especial no meu coração. Mal comecei a ler “Palavras em Tempos de Crise”, percebi que a estrutura era parecida: pequenos artigos, experiências e reflexões pessoais.
Não é preciso ser historiador, cronista ou especialista em política para se apaixonar pela Longa entrevista que fiz em 42 tardes a Vasco Pulido Valente e que chega em livro às livrarias dia 25. Basta ter uma pontinha de curiosidade sobre o que tem sido a nossa História nos últimos 200 anos, vista por alguém que não fazia cedências, e estar disposto a não largar a narrativa de VPV enquanto não chegar ao fim.
(…) Tu já assististe, leitora da minha alma, numa dessas manhãs de Julho, quando o sol começa a espreitar por cima do dorso gigante do Pico a água tranquila da baía, para onde ele deixa correr o oiro dos seus raios numa faixa de luz que treme e corre – um rio de oiro regando um prado de safiras – já assististe numa dessas manhãs claras à chegada dos barquinhos que nos trazem da fronteira ilha a lenha para cozermos a carne e as batatas, e os damascos para comermos em fruto nas sobremesas da estação calmosa e em amêndoa nos confeitos da Semana Santa?
Já assististe, leitora da minha alma?
Pois bem, nessa doce hora de calmas poesias suaves, em que todo o ar se agita num gozo sensual, como se as frescas emanações do oceano e os deliciosos aromas dos arvoredos rumorejantes o tivessem fecundado num himeneu castíssimo, há uma brusca interrupção frisantíssima quando os barquinhos com as suas velas em triângulo – os barquinhos de que te falei – abicam à praia e vazam no sílex do areal os picarotos e as picarotas que trazem a bordo.
Os que esperam em terra gritam furiosamente pelos cestos de ameixas, pelos molhos de lenha, pelos sacos de inhames, pelos cabazes de ovos e pelas esteiras de sumagre; os que estão a bordo ainda mais gritam pelo homem que está à vara, pelo que deita a poita, pelo que tira o leme, pelo que apanha os remos e pelo garoto que está na caverna deitando água fora.
Já presenciaste uma destas cenas, leitora adorável, lança mão agora da tua vigorosa imaginação de mulher, acrescenta à algazarra em que te falei toda a algazarra que puderes imaginar, e terás uma ideia um pouco pálida, mas todavia uma ideia, do alarido que se fez na abertura da Junta Geral, no primeiro dia deste mês de Maio – o mês das flores que nem ao menos teve flores de retórica – do ano da graça que vai correndo. (…
Manuel Zerbone, «Crónicas Alegres», I. Organização de Carlos Lobão. Câmara Municipal da Horta, 1989. (Crónica de 10.05.1885, pp. 41-42)
A EPOPEIA LUSITANAViriato é uma narrativa histórica sobre A Grande Epopeia da Lusónia, cujo símbolo está encarnado no mítico chefe lusitano, que sonha com uma terra liberta do jugo de Roma.
Para o sábio Idevor – conhecedor das mais antigas tradições lusitanas –, o sentido místico do nome Viriato encontra-se ligado ao Touro – animal tutelar dos nossos antepassados, símbolo da valentia e da missão libertadora do herói.
Viriato, o libertador da Lusitânia, é reconhecido como sendo digno de receber a Víria: o Colar dos Três Crescentes, legado da época em que os Estados lusitanos estavam unidos solidariamente nos costumes e no governo da Callaecia e da Bética, em torno da Lusónia.
Andergus desejava forjar com as suas mãos uma espada que fosse companheira de Viriato nas batalhas contra o invasor romano. Mas o druida sabia que tal espada heróica – consagrada para as vitórias – existia e que o seu poder tornava invencível quem a cingisse: a Espada Gaizus! Talismã de liberdade, achava-se oculta, enterrada em chão lusitano…
Vous n’avez pas besoin d’être un homme, juste d’être humain, d’avoir juste des sentiments, d’avoir juste un cœur. Il faut savoir parler et garder le silence, surtout écouter. Il faut aimer la poésie, l’aube, l’oiseau, le soleil, la lune, le chant, les vents et les chants de la brise. Vous devez avoir de l’amour, un grand amour pour quelqu’un, ou ne pas avoir cet amour, vous devez aimer votre prochain et respecter la douleur que les passants emportent avec eux. Vous devez garder un secret sans vous sacrifier.
Il n’est pas nécessaire que ce soit de première main, ni d’être de seconde main. Vous avez peut-être déjà été trompé, car tous les amis sont trompés. Il n’est pas nécessaire que ce soit pur, ni que tout soit impur, mais cela ne doit pas être vulgaire. Vous devez avoir un idéal et avoir peur de le perdre et, si ce n’est pas le cas, vous devez ressentir le grand vide que cela laisse. Il doit avoir des résonances humaines, votre objectif principal doit être celui d’un ami. Vous devez vous sentir désolé pour les gens tristes et comprendre l’immense vide des solitaires. Vous devez aimer les enfants et regretter ceux qui n’ont pas pu naître.
Un ami est recherché pour profiter des mêmes goûts, ce qui est ému lorsqu’il est appelé un ami. Qui sait parler de choses simples, de rosée, de fortes pluies et de souvenirs d’enfance. Vous avez besoin d’un ami pour ne pas devenir fou, pour vous dire ce que vous avez vu pendant la journée, beau et triste, sur les aspirations et les réalisations, les rêves et la réalité. Il faut aimer les rues désertes, les flaques d’eau et les chemins humides, au bord de la route, sous-bois après pluie, allongé sur l’herbe.
Vous avez besoin d’un ami qui dit que ça vaut la peine d’être vécu, non pas parce que la vie est belle, mais parce que vous avez déjà un ami. Vous avez besoin d’un ami pour arrêter de pleurer. Pour ne pas vivre le passé à la recherche de souvenirs perdus. Qui nous gifle sur les épaules en souriant ou en pleurs, mais qui nous appelle un ami, pour être conscient que nous vivons encore.
Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar.
Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoa tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.
Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando chamado de amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das recordações de infância. Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade. Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim.
Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.
Un roman historique, ancré dans notre histoire Algérienne, celle de la régence d’Alger et des captifs esclavagisés, que beaucoup ignorent.
Bien sûr, il y a les captifs célèbres comme Miguel de Cervantes. Mais Alger, pendant des siècles, a été une ville cosmopolite sans pareille en Méditerranée. Combien, aujourd’hui, d’Algérois sont issu de ce cosmopolitisme, ignoré ou dénié. Nous avons là, un Roman avec, évidemment un point de vue, islandais. Mais comme toujours avec notre histoire, nous sommes contraints de nous servir du travail historique des autres, à déconstruire pour nous y retrouvez, puisque, pour diverses raisons, dont celle de la subjectivité idéologique, qui place sous tutelle tout travail universitaire sérieux, nous ne parvenons pas à écrire notre histoire nous-même.
Sauf, engluer dans le mémoriel plutôt que libéré par l’histoire, à l’instrumentaliser avec les révisionnismes au service de projets politiques et partisans qui n’ont strictement rien à voir avec l’histoire.
Hoje escrevo no jornal I sobre este estimulante livro de Pedro Galvão. Ignoramos em geral o tema da morte, mas o tema impõe-se como uma constante da humanidade. Transcrevo um excerto:”(…) No 3.º diálogo, que trata a questão da imortalidade (“um tédio”, para o Sr. Perrier), são apresentados dois argumentos famosos na história das ideias sobre a morte. Um deles é de Epicuro, o filósofo grego dos sécs. IV e III a.C., que, na sua Carta a Meneceu, nos sossega: “Portanto, o mais atemorizador dos males, a morte, nada é para nós, porque quando existimos, a morte não está presente, e quando a morte está presente, não existimos. Deste modo, ela nada é nem para os vivos nem para os mortos, porque os primeiros não a têm e os últimos já não existem.” E o outro é de Lucrécio, o filósofo romano do século I a. C., expresso no poema De Rerum Natura (“Da Natureza das Coisas”, nome do blogue que mantenho há anos): “Vê, olhando para trás, como nada significou para nós toda a porção de eternidade que se passou antes do nascer. Eis o espelho que a Natureza nos apresenta do tempo futuro, do que virá depois da nossa morte. Surge nisto algum horror, alguma tristeza? Não é tudo muito mais seguro do que o sono?” (há uma edição recente: Relógio d’Água, 2015, que Galvão não usa).Não sendo tratada no livro, vale a pena referir a relação profunda que há entre o sexo e a morte. Jacques Ruffié aborda-a no seu livro O Sexo e a Morte (D. Quixote, 1987): “O sexo e a morte são dois tributos que pagamos ao progresso evolutivo. São dois fenómenos complementares, mas surpreendentemente contrastados. O primeiro ocorre na alegria, no prazer, e na esperança; o segundo no sofrimento, no horror e no vazio”. E, noutro lado, “A morte é um fenómeno biologicamente necessário, sem o qual a sexualidade estaria sem objetivo”. (…)
O propósito desta homenagem a Machado de Assis, mais que lembrar o centenário de sua morte, é fazer com que a sua obra completa chegue a qualquer usuário internet, em edições confiáveis e gratuitas. Resultado de uma parceria entre o Portal Domínio Público – a biblioteca digital do MEC – e o Núcleo de Pesquisa em Informática, Literatura e Lingüística (NUPILL), da Universidade Federal de Santa Catarina, o projeto teve como propósito organizar, sistematizar, complementar e revisar as edições digitais até então existentes na rede, gerando o que se pode chamar de Coleção Digital Machado de Assis.
O prazer da grande escrita e a expetativa de uma história que vive num triângulo que também é território meu, O Continente, os Açores e África, o tempo da ditadura, da guerra, do 25 de Abril, da descolonização, das lutas pelo futuro.[Carlos Matos Gomes}
Para se conhecer a alma do Rio de Janeiro do final do século XIX e início do XX, é fundamental ler a obra de Machado de Assis (1839-1908). Mas, com certeza, daqui a um século, para se conhecer a alma de Brasília, imprescindível será conhecer a obra do escritor João Almino (1950), que acaba de dar à luz Entre facas, algodão (Rio de Janeiro, Editora Record, 2018), o seu sétimo romance que tem a nova capital federal como um de seus cenários.
Com quase 60 anos de existência, Brasília precisava de um romancista que a explicasse, expondo sua vulgaridade e os sonhos e frustrações de seus moradores. E João Almino assumiu-se como seu intérprete, construindo um painel romanesco contemporâneo que colocou a capital do País no mapa da prosa literária brasileira, como bem observou o romancista, contista e ensaísta Cristóvão Tezza na apresentação que escreveu para este livro.
Escrito em forma de diário, este romance conta as vicissitudes da vida de um advogado, de 70 anos, que, vivendo em Taguatinga, região administrativa do distrito federal, onde fez a sua vida, separa-se da mulher e decide reencontrar as suas raízes, retornando a uma pequena fazenda nas proximidades de Mossoró, no Rio Grande do Norte, onde passara a infância.
Decidido a plantar algodão e viver dessa atividade, o retorno ao passado carrega também uma frustração – uma história de amor mal resolvida e simbolizada por um fio de cabelo guardado há muitos anos numa caixa de fósforo – e um sentimento de vingança, já que, quando menino, soubera que aquele que então supunha ser seu pai havia sido assassinado. Volta, então, com a intenção de acertar contas e honrar o nome do pai.
Ao ler o novo – e de novo polêmico e de novo diferenciado – romance (místico, ecumênico, religioso?) “O MARCENEIRO, A última Tentativa de Cristo”, Editora Viseu, 2018, de Silas Corrêa Leite, a primeira coisa que nos vem à mente é uma frase de Friedrich Nietzche: “A verdadeira questão é: quanta verdade consigo suportar?”. Simples assim. O livro, segundo o autor, é do final do ano 2.000, com aquela história do tal bug do milênio, o mundo iria acabar, coisa assim, e ele escreveu este despojo para não dizer que não era capaz de escrever um romance, principalmente se mirando o livro Memorial de Maria Moura, de Raquel de Queiroz, quando então se decidiu que, se aquele era um romance contemporâneo, atual, também poderia bolar um. Deu nisso. Um desafio? Um braço quebrado, engessado, outro com problema, pois pegou uma velha maquina remington, botou papel de formulário contínuo, e, feito um surto-circuito – psicografado? Jorro neural? – por quinze dias, a média de doze horas por dia, de licença médica, macetou o começo, meio e fim do projeto então se formalizando. Às vezes, confessa, aqui e ali, numa parte emocionante e elevadora, do registro que punha para fora, sentia que, madrugada a dentro, a sala do apartamento da Alameda Barros onde morava no bairro de Santa Cecilia como se iluminava, e ele, que tem medo de fantasma, de espírito, feito um bobo, parava assustado e chamando a esposa, acendia todas as lâmpadas do lugar, quando ela assustada, mas já o conhecendo, perguntava:
-O que você está fazendo?
-Estava escrevendo sobre Jesus, dizia ele.
Ela então entendia, e respondia:
– E você quer escrever sobre Jesus sem iluminação de algum lugar? Quem procura, acha…
Uma das mulheres que melhor me amou nunca a vi à luz do dia. Nem à luz de velas. Entrava no quarto (de um pequeno hotel) à noite, com a luz apagada, com todas as persianas cerradas, e com a luz apagada saía. Assim tínhamos combinado. Costumava dizer-me, como no mito, Nunca deverás olhar-me, se precisares de luz para me ver é porque és cego ou não tenho em mim luz bastante. Tinha. Um corpo perfeito, uma voz alcalina, uma arte indizível ou talvez só essa cantada pelos poetas do amor. “Não podes saber quem sou, nem sequer se te amo.” Amava-me, isso sim, amava-me porque fazia o que fazia com arte e entusiasmo, fundidos com fervor crescente um no outro. Nunca acendi a luz. Aceitei a desigualdade, e penso que só com ela a aceitei: sentindo que, ela, conhecendo-me embora o rosto e o percurso, também desejava desvendar os meus mistérios. Um dia senti que me estava a apaixonar por ela, e disse-lhe. Foi o fim. Disse-me apenas, “Isso seria a nossa desgraça. Vou partir.” E partiu, essa que devia ser a mulher de algum dos meus amigos. Nunca quis saber, nunca procurei saber nada, e talvez agora me leias. Mas conheci de ti fontes que outros não poderão conhecer — porque nesses momentos tu eras uma-comigo, a tua humidade derramava-se em mim, numa dor única e feliz e sei que nunca ninguém te amará como eu te amei. Nem imaginas o que eu daria, não para ver o teu rosto, não para saber quem és, mas para me sentir novamente afogado nas tuas fontes loucas, que nunca mais esquecerei. Onde estarás? O que sentirás quando passas por mim e não te vejo? O que sentirás quando leres isto? Talvez me telefones de novo.
ELE ESTÁ NO MEIO DE NÓS, Romance místico, romance religioso ou romance ecumênico? Depois de Goto, A Lenda do Reino Encantado do Barqueiro Noturno do Rio Itararé, pela Clube de Autores Editora, SC, romance pós-moderno (considerado a melhor obra do escritor); depois do gracioso Gute-Gute, Barriga Experimental de Repertório, Editora Autografia-RJ, e depois do revoltado Tibete-De quando você não quiser mais ser gente, Editora Jaguatirica, RJ, três romances de peso e agraciados por boas críticas literárias de renome, o escritor, ciberpoeta, ensaísta, crítico literário e então por isso mesmo romancista, Silas Correa Leite, de Itararé-SP, premiado em diversos concursos literários, lança finalmente o romance ELE ESTÁ NO MEIO DE NÓS, primeiro de uma trilogia. Este livro começou a ser escrito em 1998, terminado em 2015, e só agora finalmente lançado pela Sendas Editora do grupo Kotter Editorial de Curitiba-PR.
Como todos os livros diferenciados do autor, polêmicos, críticos, ELE ESTÁ NO MEIO DE NÓS não foge à regra e ao estilo de Silas Correa Leite vai nesse fulcro literário. Desta feita, entrando num campo por assim dizer místico, ele narra a história de um cidadão de Itararé, claro – “Canta a tua aldeia e serás eterno”, disse Leon Tolstoi – (e isso o Silas faz como primeiro expoente da chamada Literatura Itarareense), e narra sobre um cidadão pobre, renegado pelo pai empresário rico da cidade de origem, que depois de décadas de muitos trabalhos e estudos em SP, vence na vida, feito um new rich da chamada alta sociedade paulistana. Menino sensível, camuflou seu lado sentidor, especial, para ganhar dinheiro. Ficando rico – e ninguém fica muito rico impunemente entre riquezas impunes e lucros injustos – o personagem (real, imaginário?), dr Paulo de Tarso Trigueiro um dia ao sair de um luxuoso jantar em point rico de área nobre da capital, tem uma visão que o alumbra.
I
O jornalista Elio Gaspari, autor de cinco inolvidáveis livros sobre o regime militar (1964-1985), em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, dia 30 de janeiro de 2019, observou que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso gosta de relembrar uma cena na qual o historiador Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982) discutia o tamanho de algumas figuras do Império e ensinou: “Doutora, eles eram atrasados. Nós não temos conservadores no Brasil. Nós temos gente atrasada”. Em seguida, o jornalista fez uma relação sucinta de males causados ao Brasil e à população brasileira por atitudes e decisões tomadas por gente despreparada e inculta, ou seja, “atrasada”, que chegou ao poder tanto pela força das armas como por acordo entre elites ou pelo voto popular.
Para ter uma ideia dos males que esse tipo de “gente atrasada” já causou à cidade do Rio de Janeiro, o antigo Distrito Federal, o leitor não pode deixar de ler EfeméridesCariocas (Rio de Janeiro, edição dos autores, 2016), dos historiadores Neusa Fernandes e Olinio Gomes P. Coelho. Ali pode constatar um dos maiores atentados à inteligência e à cultura nacional que foi a demolição a 5 de janeiro de 1976 do Palácio Monroe, projetado para representar o Brasil na Exposição Internacional de Saint Louis, nos Estados Unidos, e inaugurado em 30 de abril de 1904.
O edifício abrigou o Ministério de Viação e Obras Públicas, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, a partir de 1915, até a sua mudança para Brasília, em 1960. Apesar dos protestos da população e de entidades ligadas à engenharia e à arquitetura, o ditador da época, Ernesto Geisel (1907-1996), determinou ao ministro da Fazenda, Mário Henrique Simonsen (1935-1997), a demolição do palácio, sem quaisquer justificativas técnicas e culturais. O local seria revitalizado com a instalação de um antigo chafariz da cidade e a construção de uma garagem subterrânea (p.24-25).
nesta manhã de sol, a intensidade da luz é um oboé de esperança. sopro e ocorrem-me primaveras intensas, tanta a beleza do verde ao longe. a noite, em marés de receios é um apeadeiro de desgraças. hoje canto o dia e o mistério da claridade a sacudir os sentidos. sagrado este brilho onde o coração dos pássaros se ergue alto.
hoje celebro o dia, a manhã clara para planar numa colina de sonho onde haja futuro para os nossos voos.
depois sorrimos. és tão depressa quando me fazes sorrir depois da noite.
Um manuscrito resgatado pela Inquisição para redenção de Portugal.
«Portugal tem um império em declínio, com um rei destemido, mas influenciado por uma nobreza e um clero corruptos. Omnipotente, a Inquisição não hesita em prender, matar e destruir as mentes e as obras mais brilhantes.
No país vizinho, observam a decadência de Portugal, jogam com o poder e o apoio dos jesuítas, e mantêm a esperança de voltar a dominar toda a península.
Mas eis que um trota-mundos sem eira nem beira, apesar de uma vida de prisões, putaria e inimigos poderosos, decide cantar as glórias desse povo num poema épico que lembra todos “aqueles, que por obras valerosas” se foram da “lei da morte libertando”. Mas ao cantar uma estirpe de homens que se igualara a deuses, por contraste compunha também um libelo acusatório contra a depravação vigente. Como foi possível que el-rei e o Santo Ofício tenham deixado publicar esta obra?
O Livro do Império narra a vida de um poeta arrependido e a história de Portugal em vésperas da batalha de Alcácer-Quibir.»
“Se um Eça do nosso tempo se atrevesse a perguntar a João Morgado – Filho, tu estavas lá? – teria rigorosa resposta – Sim, estive lá. Porque a expressão aliciante da sua prosa consegue despertar a convicção de que o autor estava efectivamente esteve lá, e tudo o que diz tem igual autoridade à dos documentos que lhe permitem enriquecer a crónica dos acontecimentos, que recria e medita com a minúcia do seu espírito criador”,
Prof. Adriano Moreira Apresentação da obra, 17.DEZ.18
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“Após séculos de mal-entendidos, «O Livro do Império» vem, por fim, reconciliar um Camões humanizado com o público leitor”, numa obra que “pela sua argúcia analítica, pela cultura da época, riqueza da linguagem e ritmo narrativo, consagra João Morgado como um escritor de referência no romance histórico e na literatura portuguesa.”
F. Delfim dos Santos, Universidade Nova. Apresentação da Obra, FNAC Chiado, 17.DEZ.18
É por ela (mulher), através do que nela há de pior e de melhor, que o homem faz a aprendizagem da felicidade, do sofrimento, do vício, da virtude, do desejo, da renúncia, do devotamento, da tiranias, que faz a aprendizagem de si mesmo; ela é o jogo e a aventura, mas também a provação; é o triunfo da vitória e o mais áspero, do malogro superado; é a vertigem da perda, o fascínio da danação, da morte. Há todo um mundo de significações que só existem pela mulher; ela é a substância das acções e dos sentimentos dos homens, a encarnação de todos os valores que solicitam libertação. Compreende-se que, embora condenado aos mais cruéis desmentidos, o homem não deseje renunciar a um sonho no qual todos os seus sonhos estão envolvidos.
Eis, portanto, por que a mulher tem um duplo e decepcionante aspecto: ela é tudo a que o homem aspira e tudo o que não alcança. Ela é a sábia mediadora entre a Natureza propícia e o homem: é a tentação da Natureza indomada contra toda a sabedoria. Do bem ao mal, ela encarna carnalmente todos os valores morais e os seus contrários; é a substância da acção e o que se lhe opõe, o domínio do homem sobre o mundo e o seu malogro; como tal, é a fonte de toda a reflexão do homem sobre a própria existência e de toda a expressão que possa dar-lhe; entretanto, ela esforça-se por desviá-lo de si mesmo, por fazê-lo soçobrar no silêncio e na morte. Serva e companheira, ele espera que ela seja também seu público e juiz, que o confirme no seu ser; mas ela contesta-o com a sua indiferença, e até com os seus sarcasmos e risos. Ele projecta nela o que deseja e o que teme, o que ama e o que detesta. E se é tão difícil dizer algo a seu respeito é porque o homem se procura inteiramente nela e ela é tudo. Só que é tudo à maneira do não-essencial: é todo o Outro. Enquanto Outro, ela é também outra e não ela mesma, outra e não o que dela é esperado. Sendo tudo, nunca é isso justamente que deveria ser; é perpétua decepção, a pópria decepção da existência que nunca consegue atingir-se nem reconciliar-se com a totalidade dos existentes.
Não haveria nada mais fácil no mundo das histórias que escrever um conto de Natal com Menino Jesus ou sem ele, se não fosse dar-se o caso de que uma criança que nasce está sempre nascendo. O nosso grande erro, esquecidos como em geral andamos das infâncias que vivemos, foi pensar que as crianças nascem uma única vez e que depois de nascidas se limitam a ficar à espera de que o tempo passe e as transforme em adultos, os quais, como deveríamos saber, constituem uma espécie diferente de seres humanos. A criança começa por nascer uma vez, que é a de vir ao mundo, e depois continua a nascer para compreendê-lo: não tem outro remédio nem há outra maneira. Como se verá pelas duas breves histórias que se seguem, ambas autênticas, ambas verdadeiras.
A terra, àquela hora, cobria-se de uma noite tão escura que parecia impossível que dela pudesse nascer o Sol. Não tem chovido, as tempestades andam por longe, o rio descansa da sua primeira cheia de Inverno, os charcos são de mercúrio. O ar está frio, parado, e estala quando respiramos, como se nele se suspendesse uma ténue rede de cristais de gelo. Há uma casa e luz lá dentro. E gente: a Família. Na lareira ardem grossos troncos de lenha de donde se desprendem, lentas, as brasas. Quando à fogueira se lhes juntam gravetos, ramos secos, um punhado de palha, a labareda cresce, divide-se em trémulas línguas, sobe pela chaminé encarvoada de fuligem, ilumina os rostos da família e logo volta a quebrar-se. Ouve-se o ferver das panelas, o frigir do azeite onde bóiam as formas redondas das filhós, entre o fumo espesso e gorduroso que vai entranhar-se nas traves baixas do telhado e nas roupas húmidas. São talvez nove horas, a modesta mesa está posta, o momento é de paz e de conciliação, e a Família anda pela casa, confusamente ocupada em pequenos trabalhos, como um formigueiro.
(…) mas umas costas nuas! Nada se compara ao vestido de finas alças nos ombros, estuário aberto que se vem fechar sobre as cinco fundidas vértebras do sacro – incomparável é a geografia de umas costas nuas. (…)
(…) se há prazer que merece ser celebrado, é o das costas nuas. À frente, há uma planície venusiana, certo? Mas atrás! Espaços abertos, duas rasas margens de um vale com um rio de vértebras ao meio. Ebúrneas e delicadas, castanhas e bronzeadas, de acetinado ébano, cantemos, de uma mulher, e logo desta mulher, as costas nuas. (…)
(…) Mas as costas nuas! As costas nuas pedem a didáctica tensão de um Ovídio, a persistência do lento aprendiz de uma “Ars Amatoria”. (…)
Ser criança ainda, neste caso adolescentes, decidiram partir para a aventura de escrever, sonhando como se sonha nessa idade, esgrimindo sonhos ingénuos e fantasias deliciosas como só sente quem nas suas idades se encontra, desenham com palavras tudo isso, poemas muito bem desenvolvidos para a tenra idade que ainda possuem, mas, dando já indicadores do que as poderá esperar: “poetas de alma cheia!”. No decorrer dos cerca de 52 poemas encontra-se a afinidade com a poesia no seu mais estrito sentido. Poemas profundos e sentidos como de facto a poesia nos ensina, que nos levam em viagens e sonhos, delírios e passeios na verdade que a vida nos dispõe vivenciar. Demonstram ainda e muito cedo, a dor de se amar e também o quanto é belo o amor. São três meninas, que juntas, partem para um livro que certamente lhes ficará na memória, o orgulho dos pais e dos amigos, e acima de tudo, dos leitores, que irão encontrar neste livro como se pode, desde que a arte de escrever já nos começa a “incomodar”, a coragem de as explanar num livro aberto a todos os leitores do país e do mundo.
Amanhã, sábado, será apresentado às 18 horas na Livraria Férin (junto da Fnac-Chiado) o meu novo romance “Uma Lágrima que Cega”. O prazer que vou ter em encontrar alguns dos meus amigos daqui… Venham. Ofereço-vos um fragmento do meu romance:
O que queres fazer? Onde queres jantar? Italiano, francês, cipriota? O que queres que eu faça? Saímos? Ficamos em casa? Na cama? Precisas de alguma coisa? Pouco de pouco me basta e ela, que tanto é, mais ainda me quer dar, destinar. Atenta aos meus desejos mais velados, a ler-me, a tocar piano, a escutar-me, a desejar conceder-me o que desejo, se desejo alguma coisa, que nada peço, que me deixo somente ir na onda, enfim, pouco mais que nada. O teu nada é quase tudo, dizia-me Tessa, há vinte anos. Pesa. Hoje, ainda na cama, perguntei-lhe se ainda tocava. Líamos, vagueavamos no corpo do outro. E logo se levantou, nua e fresca, levou-me pela mão para a sala de música, sentou-se ao piano, um Bösendorfer de 1975, exactamente da sua idade e perguntou-me, Queres escolher? e meteu- me nas mãos um caderno com partituras de Mozart.
Romance místico, romance religioso ou romance ecumênico? Depois de Goto, A Lenda do Reino Encantado do Barqueiro Noturno do Rio Itararé, pela Clube de Autores Editora, SC, romance pós-moderno (considerado a melhor obra do escritor); depois do gracioso Gute-Gute, Barriga Experimental de Repertório, Editora Autografia-RJ, e depois do revoltado Tibete-De quando você não quiser mais ser gente, Editora Jaguatirica, RJ, três romances de peso e agraciados por boas críticas literárias de renome, o escritor, ciberpoeta, ensaísta, crítico literário e então por isso mesmo romancista, Silas Correa Leite, de Itararé-SP, premiado em diversos concursos literários, lança finalmente o romance ELE ESTÁ NO MEIO DE NÓS, primeiro de uma trilogia. Este livro começou a ser escrito em 1998, terminado em 2015, e só agora finalmente lançado pela Sendas Editora do grupo Kotter Editorial de Curitiba-PR.
Foi o escritor catalão Eduardo Mendoza, o romancista espanhol que mais vende livros na Espanha contemporânea, quem, a propósito da obra da escritora brasileira (de origem galega) Nélida Piñon, alertou este resenhista para o fato de que as mulheres olham para a vida por uma janela que sempre esteve vedada aos homens. Por isso, quando escrevem romances, criam personagens mais densas, provavelmente, porque as veem com maior sensibilidade.
Esta observação foi feita em janeiro de 1990, a uma mesa do café Samoa, que fica em frente à Casa Milà, também conhecida como La Pedrera, em Barcelona, e sua validade só tem sido confirmada ao longo destes 28 anos. De fato, essa observação pode ser confirmada também com a leitura do recém-lançado de Desamores da portuguesa, primeiro romance da escritora brasileira Marta Barbosa Stephens, que conta a história de vida de uma portuguesa, de 41 anos, sem nome, que vive um triplo autoexílio: do país, da língua e do passado.
Escrito em linguagem em que a autora demonstra domínio do ofício, como observa o escritor Luiz Ruffato na contracapa do livro, Desamoresda portuguesa reconstitui a trajetória de uma mãe de três filhos que, em poucos anos, fracassara por três vezes na tentativa de formar uma família estável. E optara pela solidão, vivendo na fria Londres, longe de tudo e de todos, mas sem entender o que falavam nas calçadas, limitada apenas a rápidos diálogos com compatriotas. “Sua maior frustração era não ajudar as filhas nas tarefas escolares”, escreve a personagem que conta a história, uma brasileira, que, a exemplo da autora, também vive um autoexílio. “Ela não tentou aprender inglês, nem antecipou sua volta para casa. Insistiu a seu modo, esperando que um milagre a salvasse”.
« Mademoiselle, je ne vous ai pas plutôt aperçue que, fou d’amour, j’ai
senti mes organes génitaux se tendre vers votre beauté souveraine et je
me suis trouvé plus échauffé que si j’avais bu un verre de raki.
– Chez qui ? chez qui ?
– Je mets ma fortune et mon amour à vos pieds. Si je vous tenais dans
un lit, vingt fois de suite je vous prouverais ma passion. Que les onze
mille vierges ou même onze mille verges me châtient si je mens !
– Et comment !
– Mes sentiments ne sont pas mensongers. Je ne parle pas ainsi à
toutes les femmes. Je ne suis pas un noceur.
– Et ta sœur ! »
Cette conversation s’échangeait sur le boulevard Malesherbes, un matin
ensoleillé. Le mois de mai faisait renaître la nature et les pierrots parisiens
piaillaient d’amour sur les arbres reverdis. Galamment, le prince
Mony Vibescu tenait ces propos à une jolie fille svelte qui, vêtue avec élégance,
descendait vers la Madeleine. Il la suivait avec peine tant elle marchait
vite. Tout à coup, elle se retourna brusquement et éclata de rire :
« Aurez vous bientôt fini ; je n’ai pas le temps maintenant. Je vais voir
une amie rue Duphot, mais si vous êtes prêt à entretenir deux femmes
enragées de luxe et d’amour, si vous un homme enfin, par la fortune et la
puissance copulative, venez avec moi. »
Il redressa sa jolie taille en s’écriant :
« Je suis un prince Roumain, hospodar héréditaire.
– Et moi, dit-elle, je suis Culculine d’Ancône, j’ai dix-neuf ans, j’ai déjà
vidé les couilles de dix hommes exceptionnels sous le rapport amoureux,
et la bourse de quinze millionnaires. »
Et devisant agréablement de diverses choses futiles ou troublantes, le
prince et Culculine arrivèrent rue Duphot. Ils montèrent au moyen d’un
ascenseur jusqu’à un premier étage.
Cacilda vai cabisbaixa a pontapear uma ou outra pedrita, a afastar os cabelos e a prendê-los atrás das orelhas, em gestos maquinais, repetidos. O corpo, agora muito delgado, dá-lhe um ar de rapariguinha precocemente envelhecida, mas ainda bonita, da beleza suave que certas mulheres ganham quando se aproximam da descida, sem atavios de tardia sedução, num despojamento de quem já aprendeu o amor e o esquecimento. É o ruído do fio de água a correr da bica da fonte que a faz aproximar-se, estender as mãos, delas fazer concha, nelas levar a água à boca, beber, deixar que escorra e molhe o vestido, os braços. Percebe-se na mulher um momento de prazer que a faz virar o rosto para o sol, fechar os olhos e assim ficar um tempo breve no desvão do silêncio onde não cabem vozes ásperas, gestos brutos, olhares que são prenúncio de tormenta.
Arrumámos o carro debaixo de uma oliveira, lembras-te? Iniciavas o teu conhecimento prático das árvores e dos bichos e ficámos por ali um pouco a falar do mecanismo das colheitas e dos preços. Arrumámos o carro, pegámos nas coisas (duas toalhas, um livro, algumas peças de fruta) e entrámos por um caminho riscado na terra lavrada. Terra clara, culturas da beira-mar, areias castanhas, areias agora mais claras, quanto mais próximas do mar mais claras, figueiras e vinhas, clareando ainda, plantas agora espontâneas, rasteiras, e por fim as dunas, a praia, o mar. E, sobre tudo, um céu narcotizado. Como se não existisse.
Uma praia despida. Areia apenas. O desenho de uma criança ou de um louco.E dois corpos estendidos ao sol, reencontrados: como se não tivéssemos vindo um das dunas e o outro do mar — como se tivéssemos naufragado após séculos de usura e de podridão, abraçámo-nos sem ênfase.
Pousámos a cabeça num montículo de areia coberto pelas toalhas. O mar desdobrava-se a nossos pés.
Página sobre página, os nossos corpos nus. E um poema.
Lembro-me do poema porque o assinalámos com uma concha. Finíssima. Uma quase lâmina.
Lembro-me da página porque eu te disse que gostaria de ter escrito para ti aquele poema, este, de Octavio Paz:
“Entre tus piernas hay un pozo de agua dormida,
bahía donde el mar de noche se aquieta,
negro caballo de espuma,
patria de sangre,
única tierra que conozco y me conoce,
única patria en la que creo
única puerta al infinito…
E lembro-me que os teus ombros se erguiam lentamente à medida que o meu braço te envolvia e a mão aberta pousava pouco a pouco no teu seio esquerdo. E no outro. E no primeiro. Seios pequenos. E procurava pousar nos dois ao mesmo tempo.
Modigliani, lembras-te? Sopro de Modigliani. Seios nus, desatados. Acesos.
Pouco a pouco acesos. Palavras poucas. E os meus dedos escoavam-se nos mamilos cada vez mais duros (o livro caído na areia), e os teus dedos enovelavam-se nos meus joelhos, e tudo isto lenta, lentamente, dentro ainda da claridade do dia, metálicos ainda, era um filme submarino, uma câmara lenta, e metálicos ainda estamos, somos, quando pouco os meus lábios nos teus e não os cravo ou apenas um pouco nada quase e só depois com violência ou talvez não muita ou quase nenhuma.
“‘Opiniões de um Palhaço’, sua novela mais célebre, é um bom testemunho dessa sensibilidade social escrupulosa maníaca. Trata-se de uma ficção ideológica, ou como diziam ainda na época em que apareceu (1963), ‘comprometida’. A história serve de pretexto para um julgamento religioso muito severo e moralista do catolicismo e da sociedade burguesa na Alemanha Ocidental do pós-guerra”, sentencia o afiado escritor (Mário Vargas Llosa).
[Imagem cortesia de dadevoti ao Portal Raízes. Texto original em espanhol de Edith Sánchez em A Mente é Maravilhosa. Matéria original no link: http://www.portalraizes.com/vargasllosalivros/]
Queiramos ou não admiti-lo, somos uma Nação fundada sobre a escravidão, e não apenas dos povos africanos, oficialmente extinta há pouco mais de cem anos, mas também dos povos que aqui viviam antes da chegada da esquadra de Cabral, em 1500. De fato, não estamos sozinhos num concerto mundial em que a violência tem origem nas diferenças não apenas de cor da pele como também de crença, de origem, de convicção política e tantas outras. Mas sofremos especialmente as consequências de um feixe de misérias ocasionadas pelo tratamento de seres humanos como bestas durante centenas de anos. Ainda hoje, há os escravos com carteira assinada, os escravos sem segurança, sem garantias, os escravos humilhados pela necessidade absoluta.
Aquele que domina e escraviza entende o outro como inferior, criatura vinculada ao conceito de utilidade, seja para realizar as tarefas que o dominador não deseja ou não está apto a realizar, seja para dar prazer ou simplesmente alimentar a vaidade de deter a posse de outro ser humano – ainda que, no mais das vezes, tal domínio venha justificado pela negação da humanidade do escravizado. Assim, a escravidão nasce da diferença que se autoriza a suprimir a dignidade ao outro, na medida em lhe retira não apenas a liberdade, mas a autodeterminação.
Eufrásia Teixeira Leite (1850-1930), nascida em Vassouras, no interior do Estado do Rio de Janeiro, foi mulher avançada para o seu tempo, que viveu sua infância e adolescência numa bela residência senhorial conhecida como a Casa da Hera e recebeu educação esmerada, pois apreciava literatura de alto nível, especialmente os textos do filósofo alemão Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) e os contos e poemas do norte-americano Edgar Allan Poe (1809-1849).
Ela viveu um romance clandestino de 14 anos com Joaquim Nabuco (1849-1910), advogado, diplomata e herdeiro de José Tomás Nabuco de Araújo Filho (1813-1878), presidente da província de São Paulo (1851-1852), ministro da Justiça (1853-1857) e senador do Império pela Bahia (1857-1878), a quem o filho dedicou o livro Um estadista do Império, obra seminal para se conhecer a história política brasileira daquela época.
Apesar de pertencer à elite brasileira, que sempre se caracterizou por sua ancestral maldade para com as classes menos favorecidas, Joaquim Nabuco destacou-se como defensor da liberdade para os escravos, além de ter sido grande tribuno e combativo jornalista, que despertava a ira dos conservadores que o consideravam um “arrogante mulato nordestino e perigoso abolicionista”. Foi também intransigente defensor das reformas sociais de base, que até hoje o Brasil ainda não conheceu.
Após uma espera de mais de três décadas, estão de volta os contos de Enfeitiçados todos nós (Florianópolis, Editora Insular, 2018), livro do jornalista, contista e romancista Lourenço Cazarré (1953), lançado em 1984 pela Editora Melhoramentos, de São Paulo, depois que seu autor havia conquistado pela segunda vez o Prêmio Bienal Nestlé de Literatura Brasileira, o mais importante concurso literário daquela época. Mais: esta segunda edição traz outros três contos, publicados pela primeira vez em 1986 em jornais e revistas, que, encorpados aos seis da edição original, constituem uma bela mostra do trabalho de Cazarré, um dos mais talentososeoriginais contistas de sua geração.
Como observa o experiente jornalista e escritor Geraldo Hasse no prólogo que escreveu para este livro, Cazarré não “inventa” personagens nem enredos – no máximo, glamouriza-os, ao humanizá-los, acrescente-se –, mas “apenas reprocessa histórias reais”. É o que se pode constatar no conto “O expedicionário” em que o autor coloca a personagem a falar na linguagem coloquial dos gaúchos para contar a sua própria história de soldado brasileiro na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), agora transformado num homem próximo aos 60 anos de idade, precocemente envelhecido, abandonado por todos e pela chamada pátria:
Pré-venda de promoção, no site da poética edições. Só até 15 de Julho.
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«Uma história de vida, narrada com um humor subtil, uma desenvoltura surpreendente e uma simplicidade desarmante, quase subversiva.»
Rita Ferro, escritora
«A literatura é porventura a única máquina do tempo eficaz e romanticamente fiável. Neste livro, a memória é crucial para se entender a paletta difícil de sentimentos que cruzam a vida das pessoas. A história transporta-nos para o que há de melhor em nós, em todos nós, numa escrita irrepreensível, capaz de nos tocar e de nos tomar de assalto.»
Patrícia Reis, escritora, editora.
SINOPSE
Percorrendo um espelho de memórias, que parte das ruas de Lisboa e se ramifica na infância, nas conjecturas e dilemas, numa sofrível determinação, na incerteza e nostalgia de um homem a sós, o leitor vai descobrindo o seu próprio reflexo. A reinvenção dos laços familiares quebrados, a sua justiça ou merecimento, dificilmente serão previsíveis ou consentidos. O projecto da escrita, devorado com absurdo idealismo, vai simbolizando a metamorfose a que assistimos página a página, impulsionada pela descoberta da leitura e o erotismo de alguns encontros. Neste romance, as mulheres que flutuam na esfera de emoções do protagonista – filho, marido, irmão, pai e amante –, constituem o pilar da sua salvação. Apesar de tudo. Ou não fosse a vida.
A minha Religião é o Novo.
Este dia, por exemplo; o pôr do Sol,
estas invenções habituais: o Mar.
Ainda:
os cisnes a Ralhar com a água. A Rapariga mais bonita que
ontem.
Deus como habitante único.
Todos somos estrangeiros a esta Região, cujo único habitante
verdadeiro é Deus (este bem podia ser o Rótulo do nosso
Frasco).
Dele também se podia dizer, como homenagem:
Hóspede discreto.
Ou mais pomposamente:
O Enorme Hóspede discreto.
Ou dizer ainda, para demorar Deus mais tempo nos lábios ou
neste caso no papel, na escrita, dizer ainda, no seu epitáfio que
nunca chega, que nunca será útil, dizer dele:
em todo o lado é hóspede,
e em todo o lado é Discreto.
O filósofo, poeta e ensaísta Agostinho da Silva (1906-1994) sempre teve múltiplos interesses, mas concentrou-se em áreas como literatura portuguesa e brasileira e as questões portuguesas, deixando obras, artigos e ensaios que o colocam hoje como um dos maiores – senão, o maior – pensadores luso-brasileiros do século XX. Em Ensaios sobre Cultura e Literatura Portuguesa e Brasileira, volume I (Lisboa, Editora Âncora, 2000), que tem merecido reedições, o leitor encontrará textos pedagógicos e filosóficos, especialmente aqueles que apareceram a partir da década de 1950, embora possam ser encontrados alguns de décadas anteriores, mas que são suficientes para dar uma ideia geral do pensamento agostiniano.
Um dos textos que se destaca entre os 28 artigos, prefácios de livros e ensaios aqui reunidos é aquele que carrega o título “Ensaio para uma teoria do Brasil”, publicado originalmente na revista Espiral, nºs. 11-12, de 1966, em que o autor diz que “a grande base do retardamento do Brasil como civilização nova vai estar no ciclo do açúcar e, mais que tudo, no ciclo do ouro, que provoca o quase despovoamento de Portugal em homens, fixa no Brasil uma tão elevada percentagem de europeus que o equilíbrio anterior se rompe e se perde aquele hibridismo de cultura que se apresentava como tão promissor”.
Duvidar de Aristóteles (384 a.C.-322 a.C) é sempre necessário, ainda que seja, para mais tarde, concordar com ele. Essa frase ouvi em 1994 do professor Massaud Moisés (1928-2018), quando, ao lhe fazer um relatório verbal de minhas pesquisas nos arquivos de Portugal sobre a vida e a obra de Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810), mostrei-lhe a fotocópia de um documento que consta do Arquivo Histórico Ultramarino, de Lisboa, que provava que o lisboeta Alexandre Roberto Mascarenhas morrera em 1793, no mesmo ano do casamento de sua filha com o poeta.
Portanto, ao casar com Juliana de Sousa Mascarenhas, uma jovem analfabeta de 19 anos de idade, Gonzaga não teria tido a oportunidade de ajudar o sogro a aumentar sua fortuna, como afiançara o professor e filólogo português M. Rodrigues Lapa (1897-1989), para quem o poeta casara “com a herdeira da casa mais opulenta de Moçambique em negócios de escravatura” e ainda consagrara “as horas vagas ao comércio de escravos”.
Memórias da infância vividas num mundo rural há muito perdido num tempo em que os miúdos iam à catequese e acreditavam no poder da confissão. O registo mental dos pecados, convenientemente reduzido a escrito a fim de facilitar a confissão e atestar a sua sinceridade facilitando o perdão.
A ruralidade portuguesa revisitada numa primeira obra, o condão de intuir esse mundo estranho e remoto, a começar pelo nome da aldeia, com a sua ponte sobre o riacho e a violência rude que resulta do desconhecimento da civilidade urbana, mas sábia em conhecimento concreto das coisas da terra, da vida e da morte. Uma ruralidade tão dada a crenças. O invocar de um tempo em que as passagens de nível ceifavam vidas. O culto sagrado da morte, momento a que ninguém falta, nenhum familiar, por mais distante, por mais ausente que fosse, todos reunidos para prestar homenagem ao falecido. Era o luxo a que tinha direito. A compensação por ter morrido. Imagem perfeita da hipocrisia familiar.
O homem do campo, trabalhador primitivo da matéria em bruto, deus sem rosto, criador do universo, separando as trevas da luz e a terra da água, abrindo um rego. E o homem fica satisfeito com o seu trabalho. Não se pode atingir maior pureza. E esse homem deu lugar a outro homem, e depois a outro até os problemas com o rego da água começarem disseminando a morte.
A prosa de Hugo Mezena é seca, limpa e direta como refere Yvette Centeno na contracapa, uma narrativa colada à realidade sem perder a capacidade de respirar. Uma atenção sóbria aos pormenores, como as espinhas na boca zangada do senhor Júlio que desaparecem, mastigadas no meio dos insultos. Momentos que a memória distante insiste em reter. Capítulos curtos, pequenos apontamentos, definem o ritmo do romance no qual a vida parece fluir com alguma lentidão e a enumeração dos pecados acentua a banalidade a que estamos presos. Assegurados os recursos de escrita, Hugo Mezena afirma-se como um autor a seguir.
Quando saiu do seminário, o padre Cláudio dava muita importância aos gestos: o de consagrar o pão e o vinho, o de benzer. Eram gestos que se dirigiam à alma das pessoas. Que tinham a capacidade de lá entrar e pôr as coisas em ordem.
António Ganhão, Acrítico
GENTE SÉRIA é hoje (16 abril) livro do dia, na TSF. A escolha é de Carlos Vaz Marques.
Pede-se a uma criança. Desenhe uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção, outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase nâo resistiu.
Outras eram tâo delicadas que apenas o peso do lápis já era demais.
Depois a criança vem mostrar estas linhas às pessoas:
Uma flor !
As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma flor.
Contudo, a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!
Nació el 5 de junio de 1898, en el Municipio de Fuente Vaqueros, en Granada (España).
Federico García Lorca
Era hijo del hacendado Federico García Rodríguez y de la maestra Vicenta Lorca.
De salud enfermiza y mal estudiante, se graduó luego de sortear varios obstáculos, en la Universidad de Granada, como abogado. Estudió música (piano) pero por influencia de su madre y de Don Fernando de los Ríos, comenzó a inclinarse por la poesía. Su primer artículo, data de 1917, y fue con motivo del aniversario de José Zorrilla.
Su obra muestra la influencia de autores como Benito Pérez Galdós, Miguel de Unamuno, José Ortega y Gasset, Lope de Vega, Juan Ramón Jiménez, Antonio y Manuel Machado, entre otros.
Su padre lo ayudó económicamente para que en 1918 apareciera su primer libro “Impresiones y Paisajes”. En teatro, estrenó en 1920 “El maleficio de la mariposa”. En 1921 “Libro de poemas” (Antología) y en 1923 “La niña que riega la albahaca y el príncipe preguntón” (Comedia de títeres). Publicó “Canciones” en 1927, y al año siguiente surgió la Revista Literaria “Gallo” de la cual solo dos números fueron editados. Aparece ese mismo año el libro “Primer romancero gitano”, donde expresa con grandes metáforas y abundancia de símbolos (La luna, los colores, los caballos, los peces) sentimientos sobre el amor y la muerte en una mítica Andalucía.
En 1929 viajó a Nueva York, donde publicó “Poeta en Nueva York” Un año más tarde se dirigió a La Habana, donde escribió “Así pasen cinco años” y “El público”. Ese mismo año regresó a España donde se estrenaba “La zapatera prodigiosa”, su farsa popular, que enfrenta realidad e imaginación.
Su producción siguió creciendo: “Bodas de sangre”, “Yerma” y “Doña Rosita la soltera” fueron escritas con el gran apoyo moral y financiero de su amigo Fernando de los Ríos, que se desempeñaba como Ministro de Instrucción Pública. Fue nombrado Director del teatro universitario La Barraca, y desde allí realizó una amplia labor de divulgación por toda España.
Viajó a Argentina y Uruguay entre 1933 y 1934, con gran éxito. En 1935, escribió “Llanto por Ignacio Sánchez Mejías”, en la línea del neopopulismo.
Luego, sobrevinieron, en 1936, “Diván del Tamarit” y “Sonetos del amor oscuro”. En “La casa de Bernarda Alba”, afronta el drama de la represión de lamujer y la intolerancia.
Federico García Lorca
En general, su obra, que puede agruparse en farsas, comedias, tragedias y dramas, se inscribe en el dramatismo y el realismo político, inspirado en temas como el amor, la esterilidad, la infancia y la muerte.
Con una gran capacidad de síntesis, armoniza formas, tonalidades y símbolos, como por ejemplo, la luna, que muchas veces representa la muerte, y en otras, la fecundidad, la esterilidad o la belleza. Sus metáforas relacionan elementos opuestos de la realidad y transmiten efectos sensoriales entremezclados.
La tradición está muy presente en su obra, a través de la música y los cantos tradicionales.
Tuvo la influencia del drama modernista, del teatro de Lope de Vega y de Calderón de la Barca.
Falleció fusilado en Granada, víctima del fascismo, durante la Guerra Civil española, a pesar de no haberse afiliado a ninguna fracción política, aproximadamente el 19 de agosto de 1936.
Luego de su muerte, se publicaron “Primeras canciones”, “Amor de Don Perlinplín con Belisa en su jardín” y “Odas y Suites”.
Federico Garcia Lorca declamando seu último poema frente ao pelotão de fuzilamento!
Este é um livro delicioso. Não há ninguém que não se tenha interrogado, uma vez que seja, sobre a relação entre o presente e o passado. Quem é que, num arroubo de nostalgia, não tropeçou já na mais emotiva das declarações: «Ah, antes é que era bom!» Mas era? O passado seria mesmo tão dourado como às vezes o pintamos?
Permitam-me, caros leitores, que vos ponha a falar com Michel Serres. Apresento-o, primeiro: Michel Serres é filósofo e historiador das ciências. E atreve-se: membro da Academia francesa, Serres intervém publicamente arriscando oferecer uma visão do mundo em que a filosofia, as ciências e a cultura se combinam. Neste seu pequeno livro, repleto de fina ironia, Michel Serres, dos seus 87 anos de idade, afirma com toda a clareza: não, o passado não era bom! O presente é bem melhor.
“A Porto Editora publica a 17 de maio uma nova edição do livro Nó Cego, primeiro romance de Carlos Vale Ferraz e livro de culto de uma geração que esteve envolvida na guerra colonial e que, a partir dela, entrou em rutura com o regime português da ditadura.
Nó Cego é hoje reconhecido como um livro essencial para compreender esse período crucial da nossa História que foram os anos da guerra colonial e o fim do regime de ditadura, bem como para conhecer os dramas, as angústias, as alegrias e as tristezas da geração que fez a guerra e que a terminou, abrindo Portugal à modernidade.
A nova edição deste romance serve de pretexto à conversa que Carlos Vale Ferraz, António-Pedro Vasconcelos e João de Melo terão na sessão de lançamento que se realiza a 19 de junho, pelas 18:30, na livraria Ferin, em Lisboa.”
Uma literatura é tanto mais rica, parece-me, quanto houver homens e mulheres de todas as idades e gerações a escreverem e a publicarem. Fico contente com os novos livros de novos autores, ou de autores novos (sobre os quais costumam recair as perguntas que me fazem durante as entrevistas), mas confesso que também fico contente por escritores que já nada têm a provar, como Mário Cláudio, João de Melo, Luísa Costa Gomes, António Lobo Antunes ou Mário de Carvalho, continuarem a manter um ritmo de publicação assinalável e a oferecer-nos livros extraordinários. No caso de Mário Cláudio e João de Melo (não conheço tão bem os outros), temos, além do mais, dois escritores generosos, que se interessam por acompanhar e encorajar a literatura que os mais novos produzem.
Aceitem, pois, a minha mais recente sugestão de leitura. O livro mais novo de um grande escritor.
Quando lemos os poemas de Telmo Barreira, o que se experiencia é tal e qual o estalido frenético que provocaria um shot. Sim, um shot de aguardente. Uma espécie de choque a percorrer o corpo, num compasso de êxtase, primeiramente quente e consolador, em seguida desconfortável, quase doloroso, espraiando-se, por fim, numa sensação dormente e apaziguadora. Depois da casca de noz aberta e do preciso elixir bebido, verifica-se que esta aguardente só poderia estar contida neste invólucro orgânico e natural, como orgânica e natural é a jornada da própria existência.
A viagem começa na infância, com a aguardente ainda a descer-nos pela garganta, tranquila e reconfortante, numa recordação entrelaçada de sonho, identidade e ninho. E por aí nos deixamos guiar, pausadamente, como se a nossa própria infância recordássemos, num ambiente confortável de colo e amor. Os momentos da feliz inconsciência das coisas, onde tudo tem o tempo certo, onde podemos, entre palavras, fazer as pausas prolongadas dos pontos finais…
Mas a aguardente vai descendo e um ardor, desconcertante primeiro e insuportável depois, apodera-se do nosso peito… É o bulício, a experiência, a vida. Nesta ardência provocada pelo líquido, quer-se cortar com o passado e percorrer caminhos imaginados originais. Este calor que sentimos, no peito e na mente, transforma-se em febre que queremos apaziguar com o arrebatamento das descobertas, das experiências. Queremos respostas! Porém, as respostas tardam. Das sucessivas tentativas, ficam as desilusões, a solidão… Quem somos? Quem queremos descobrir nesta viagem vertiginosa? E a aguardente arde cada vez mais cortando, por breves segundos, a respiração. Um grito desesperado solta-se da garganta. Ficamos quietos e ainda exaustos arriscamos inspirar de novo. Depois, já com o peito cheio de ar, aventuramos a compreensão da pessoa em quem nos transformámos, quem emergiu destes pântanos por onde andámos. Talvez o amor, os amores, nos possam dar algumas respostas.
Um livro de contos, geralmente, é o resultado da reunião de textos literários dispersos e autônomos que o autor produz ao longo dos anos, quase sempre sem um fio narrativo que os una. São também textos que escapam a qualquer critério quantitativo, ou seja, não podem ser definidos com base em sua extensão. Mas, ao contrário da novela e do romance, o conto exige, antes de tudo, a atenção concentrada do leitor para produzir nele um “efeito preconcebido, único, intenso, definido”, com observou o professor, ensaísta e investigador venezuelano Carlos Pacheco (1948-2015) em Del cuento e sus alrededores. Aproximaciones a una teoria del cuento (Caracas, Monte Ávila Latinoamericana, 1997, p. 20), com base no que dizia o poeta norte-ame ricano Edgar Allan Poe (1809-1849), para quem o “conto devia ser lido de uma assentada”.
Atlas do impossível (Guaratinguetá-SP, Editora Penalux, 2017), de Edmar Monteiro Filho, quinto livro de contos do autor, não preenche todos esses critérios. Mas, entre os 15 relatos que o compõem, há dois que provam que a extensão em número de páginas ou palavras não é mesmo critério seguro para definir um conto. Por exemplo, o texto de abertura, “Autorretrato em espelho esférico”, tem apenas 18 linhas, enquanto aquele que encerra o volume, “Galeria”, ocupa 49 páginas, dividido em dez capítulos ou trechos, aproximando-se do que se poderia chamar de novela.
O livro, porém, vai além. São relatos caudatários do movimento surrealista da década de 1920, liderado pelo poeta e crítico francês André Breton (1896-1966), que, tanto na pintura ou na gravura como na poesia ou na prosa, procurava incorporar elementos desconexos, formas abstratas e ideias irreais, com o objetivo declarado de escapar da lógica e da razão. Em outras palavras: levar o poder da subversão à criação.
Um levantamento de 354 protagonistas e figurantes – praticamente, todos – que perpassam os romances e peças teatrais do Prêmio Nobel de Literatura de 1998 é o que o leitor vai encontrar em Dicionário de Personagens da Obra de José Saramago (Blumenau-SC: Editora da Fundação Universidade Regional de Blumenau – EdiFurb, 2012), da professora Salma Ferraz, resultado de uma pesquisa que durou mais de 15 anos e contou com a colaboração de mais de oito dezenas de seus alunos.
Obra aberta, sem a pretensão de se tornar definitiva ou completa, o livro, além de homenagear Saramago, segundo a autora, tem o objetivo de não só catalogar a imensa galeria de personagens saramaguianos como abrir um debate e até mesmo aceitar novos verbetes para uma futura segunda edição. Mas, desde já, constitui, sem dúvida, leitura indispensável aos amantes da boa literatura de Saramago.
Da pesquisa, ficaram de fora os contos e crônicas da primeira fase de Saramago, ainda que o romance Terra do Pecado (1947), também da época inicial da trajetória do autor, tenha sido igualmente analisado. Exceção foi aberta para O Conto da Ilha desconhecida (1997), que faz parte da fase madura do escritor. Já o romance Claraboia, embora escrito em 1953, e, portanto, da primeira fase, mas publicado em 2011 pela editora Companhia das Letras, de São Paulo, não foi incluído na pesquisa por se tratar de publicação post mortem.
O romance que lhe mostra o governo por dentro: nos gabinetes, nos negócios, na cama. Francisco Mortágua finalmente é ministro. Quer marcar a diferença e ser um político sério. Mas, entre o calor da cama e as luvas passadas debaixo da secretária, afinal nada é simples e limpo num país de impunidade e compadrio. O ministro Francisco Mortágua é confrontado com a verdadeira face da alta política e descobrir do que é capaz esse enorme monstro chamado corrupção.
Lançamento do livro Freire, André (2017), Para lá da «Geringonça»: O Governo de Esquerdas em Portugal e na Europa, Lisboa, Contraponto. Prefácio do primeiro-ministro, António Costa.
Por Ana Catarina Mendes, Secretária-geral Adjunta do PS e Vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS, & Pedro Filipe Soares, líder parlamentar do BE (*).
Terça-feira, dia 07/03, às 18h30m, na livraria Bertrand do shopping Picoas Plaza.
O jornalista Valdeck Almeida de Jesus é um dos convidados de encontro que acontece na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, de 29 de novembro a 04 de dezembro, promovido pela Associação Internacional dos Poetas.
Poeta e escritor, Valdeck Almeida fará uma palestra sobre ‘A resiliência das minorias no Brasil’, leitura de poemas e lançamento do livro ‘Poesias ao Vento: vinte poemas de amor e uma crônica desesperada’, com texto em português e espanhol, tradução da venezuelana Gladys Medía e revisão do poeta colombiano Júlio Bustos. A coletânea foi ilustrada pelo grafiteiro baiano Zezé Olukemi e relata uma paixão iniciada através de cartas que evoluiu para redes sociais e telefone, mas jamais se concretizou. “Este livro foi baseado em minha memórias afetivas, e atravessa mais de trinta anos de inspiração e desejo e, na verdade, a personagem principal é a fusão de duas pessoas. Uma morava em Uberlândia-MG e trocamos correspondências. A outra, mora em Salvador-BA, é natural de Uberlândia também, mas eu nunca a encontrei pessoalmente”, esclarece o poeta. Os textos refletem esse amor não concretizado, agora tornado público, mas a identidade das musas o poeta guarda em segredo.
Os jornalistas começam sempre como repórteres, mas são poucos aqueles que se mantém na função até o fim da carreira porque a maioria acaba como editor ou até mesmo editor-chefe, sem contar aqueles que, atraídos pelo mundo dos negócios e da política partidária, aceitam participar do tráfico de influência e passam a ocupar cargos públicos ou assessorar canastrões ligados ao poder. De fato, raros são aqueles que continuam a viver o dia-a-dia das ruas ou a participar do cotidiano das populações marginalizadas e a escrever sobre suas esperanças e desilusões.
Ivete Carneiro, nascida em Versalhes, na França, mas portuguesa de quatro costados, jornalista do Jornal de Notícias, de Lisboa, desde outubro de 1993, constitui um desses raros exemplos, pois se mantém incólume nesse caminho há mais de duas décadas. Licenciada em Comunicação Social na Escola Superior de Jornalismo do Porto em 1994, desde logo fez a sua opção pelos pobres e desvalidos da terra. Em 2004, frequentou o curso de Jornalismo em ambientes hostis e técnicas de primeiros socorros da Centurion Risk Assesment Services, na Inglaterra.
Escrito em prosa poética, esse romance é um dos principais representantes da vertente indianista do movimento romântico e traça uma espécie de mito de fundação da identidade brasileira
A narrativa de Iracema estrutura-se em torno da história do amor de Martim por Iracema.
Diferentemente do que ocorre em outros romances de José de Alencar, como O Guarani, o enredo de Iracema é aberto a interpretações. A relação entre Martim e Iracema significa a união entre o branco colonizador e o índio, entre a cultura européia, civilizada, e os valores indígenas, apresentados como naturalmente bons. É uma espécie de mito de fundação da identidade brasileira.
Existe um rapaz que um dia conheceu, num passeio de fim de semana, a Tapada de Mafra. Desde então nunca mais deixou de lá ir. Conheceu todas as aves, conversou com muitos animais, trepou às árvores mais altas, viajou na noite acompanhado de um dos seus maiores amigos, o bufo real Elvis; enfrentou os mistérios da floresta nocturna e diurna, percorreu caminhos, cercados, colinas e vales, decifrou e aprendeu a conhecer e a distinguir plantas e flores, os sons dos ribeiros, as vozes da mata. Percebeu as quatro estações, distinguiu o dia da noite, os sinais da noite, as movimentações dos astros, as manhas dos bichos maiores. Compreendeu a complexidade da vida e aproximou-se da morte no dia em que a Tapada de Mafra ardeu quase completamente, no ano de 2003, num dos maiores incêndios jamais vistos até então. Uma sucessão de histórias todas relacionadas com a floresta e seus habitantes, desde o brilho fantástico de uma nuvem de pirilampos à majestade do mais secreto lobo; desde a suave canção do riacho à força do trovão absoluto. O rapaz aprendeu a conhecer e a estimar o planeta Terra, esse ponto de luz que vibra e estremece entre outros milhares de pontos de luz no firmamento visível. Aquele onde nasceu e onde vai morrer.
Arturo Pérez-Reverte nasceu no ano de 1951 em Cartagena.
Licenciado em Ciências Políticas e Jornalismo, trabalhou durante doze anos no jornal Puebloe nove nos serviços informativos da Televisão Espanhola (TVE), sendo especialista em temas de terrorismo, tráficos ilegais e conflitos armados.
Foram muitos os prémios que ganhou na área da reportagem, nomeadamente o Prémio Astúrias de Jornalismo pela cobertura para a TVE da guerra da ex-Jugoslávia.
Há já alguns anos, este jornalista de profissão dedica-se exclusivamente à literatura.
SINOPSE
Na Europa do século XVIII, dois homens viajam em segredo. A sua missão? Levar para Espanha algo proibido: os 28 volumes da Enciclopédia Francesa de D’Alembert e Diderot. A delicada tarefa está nas mãos do bibliotecário don Hermógenes Molina e do almirante don Pedro Zárate, membros da Real Academia Espanhola. Mas estes dois académicos estão longe de imaginar as peripécias que os aguardam…
Da Madrid de Carlos III à Paris libertina e pré-revolucionária, com os seus cafés e tertúlias filosóficas, don Hermógenes e don Pedro embarcam numa intrépida aventura, repleta de heróis e vilãos, intrigas e incertezas. Com o rigor a que já nos habituou – e baseando-se em acontecimentos e personagens reais, Arturo Pérez-Reverte transporta-nos para a magnífica era do Iluminismo, quando a ânsia de liberdade derrubava a ordem estabelecida, e dá-nos a conhecer os heroicos homens que quiseram mudar o mundo com os livros.
Um romance sobre fé e razão, Teologia e Ciência, sombra e luz.
Ficou viúvo ainda novo, mas não por muito tempo. Tempo não lhe
faltava para procurar novo compromisso, já que outros não tinha. Tinha
debaixo de olho a antiga namorada que ficara viúva. Viúva já por três vezes,
murmurava-se em segredo. Em segredo o namoro foi rápido, que a paixão
fora forte. Forte suspeita pairava quanto ao destino do quarto marido. Marido
e mulher oficializam o acto e juntam os pertences. Pertences de três maridos
que fazem pequena fortuna. Fortuna maior é a do quarto que a agora não
viúva, agora ambiciona. Ambiciona ser de novo viúva, rica, poderosa e dispor
de tudo. Tudo por amor diz ela, tudo por dinheiro diz a vizinhança. Vizinhança que faz apostas sobre a duração do dito. Dito isto vão de viagem,
longa viagem que acaba sem regresso para ele. Ele, o quarto marido acaba
por morrer, e sem explicação, no quarto de núpcias.
Rodolfo Miguez Garcia in “A Audiência Escreveu Um Crime”
(…) Sou a maior ave de rapina nocturna do mundo inteiro! E a mais bela! E a mais silenciosa no voo!
No dia em que nasci, nesse dia em que o ovo estalou e o céu se abriu num todo claro e imenso consegui, por fim, espreitar a medo, cá para fora. Eu vivia, por essa altura, num emaranhado de babas gelatinosas e mal podia ser distinguido. Era um bico, apenas. Um bico aberto à sede e à fome. Neste mesmo dia em que apareci no mundo, nasceu também o meu adorado amigo. Eu fui um pássaro. Ele foi um homem.
(…) Logo que nasci, fiquei ali, meio fora, meio dentro da casca do meu ovo branco a piar, a piar num alvoroço doido de penas e líquidos gelatinosos que bordavam todo o redondo do ninho. E ouvia muito bem o potente som que a minha mãe emitia, aquele Hooooo Hooooo prolongado, suave e, ao mesmo tempo, poderoso e quente. Conseguia ouvir o som da minha mãe ainda que ela estivesse bastante longe, a caçar para me alimentar. Depois, já muito de noite, ela chegava com pequenos ratos pendurados no bico que largava perto de mim. Quando eu ainda era muito pequeno e sem forças, ela segurava o ratico e ali ficávamos, eu a petiscar o bicho e ela a segurá-lo para que eu me alimentasse devidamente.
(…)
Cristina Carvalho – excerto de “AS FABULOSAS HISTÓRIAS DA TAPADA DE MAFRA” – publicado por Sextante / Porto Editora.
Um dos romances maiores de Naipaul. Duro, mas cheio de compaixão. Este livro começa por contar a história de um criado indiano em Washington, que adquire a cidadania americana, mas que sente já não fazer parte do grande fluxo da vida. Segue-se a história do caribenho de origem asiática em Londres: está perturbado, preso por homicídio, mas nunca saberá onde se encontra. A terceira e principal narrativa desloca-se para África, para um país ficcional parecido com o Uganda ou o Ruanda. As personagens centrais são dois ingleses, que no passado sentiam África como um continente libertador, que entretanto o deixara de ser. Em tempo de conflitos tribais, no meio de uma grande insegurança, os dois terão de empreender uma longa viagem.
Joaquim António Ramos tem 65 anos e vive em Azambuja, onde nasceu, e a cuja Câmara presidiu durante 12 anos.
Licenciado em Economia, foi professor universitário, responsável, durante mais de duas décadas, pelo sector de Ambiente do Município de Lisboa, consultor de diversas empresas de estudos ambientais e desenvolveu vários projectos, nacionais e internacionais, nessa mesma área.
Foi durante dois mandatos coordenador do Comité de Ambiente das Eurocities, sediado em Bruxelas.
Em 2005 publicou a sua primeira obra literária, “ Contos Semibreves”.