“As pessoas vêem Israel como um Estado ocupante e não como um país democrático”, Nabil Abuznaid, embaixador da Palestina em Portugal | in DN

Em entrevista por email, Nabil Abuznaid, embaixador da Palestina em Portugal, espera uma mudança do Hamas para que este possa vir a aderir à Autoridade Palestiniana.

Que balanço faz dos três meses decorridos desde os atentados terroristas de 7 de outubro?
Após três meses da mais sangrenta guerra e destruição, não houve solução. Até as esperanças de paz diminuíram. Isto diz-nos que a paz entre a Palestina e Israel não pode ser alcançada através de guerras e que não há solução militar para este conflito. A única via é a das negociações pacíficas entre ambas as partes, e a única forma de Israel poder viver em segurança é se os palestinianos puderem viver em paz e com dignidade num Estado próprio chamado Estado da Palestina.

O chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell, afirmou há dias em Lisboa que a comunidade internacional deve impor uma solução para o conflito. Que solução pensa que deve ser adotada? Na sua opinião, quem a pode aplicar?
Este conflito demorou demasiado tempo, e não esperamos que os ocupantes israelitas se vão embora voluntariamente. Ao mesmo tempo, não se pode colocar o opressor e o oprimido juntos e pedir-lhes que cheguem a uma solução. A comunidade internacional tem de exercer pressão e tomar medidas para obrigar Israel a pôr termo à ocupação e a aceitar a solução de dois Estados. Sem essa pressão, será difícil ou impossível chegar a uma solução.

Concorda com a análise segundo a qual o Hamas beneficiou com esta guerra em detrimento do povo palestiniano e de outros movimentos políticos?
Não há vencedores nas guerras. A única forma de vermos vencedores é na paz. As guerras trazem mais destruição e a paz traz mais esperança. Nos últimos três meses, cerca de 100 mil palestinianos foram mortos, feridos e perderam-se sob os escombros. Os palestinianos pagaram um preço elevado para trazer a causa palestiniana à tona. Ao mesmo tempo, os israelitas sofreram muito a nível internacional e interno. A opinião pública mudou, as pessoas veem Israel como um Estado ocupante e não como um país democrático ou pacífico. Esperamos que os resultados desta guerra tragam um pensamento positivo, em que os israelitas compreendam que a ocupação não terá vida longa e que os palestinianos se sintam mais próximos da sua liberdade. O próximo período mostrará se as coisas se encaminham para um pensamento pacífico ou para uma mentalidade de vingança.


O Hamas afirmou recentemente que está pronto para um governo único em toda a Palestina. Na sua opinião, estão reunidas as condições necessárias?
O Hamas faz parte do povo palestiniano, mas acredita que a luta armada é a única forma de libertar as suas terras. Esta convicção contradiz a posição oficial da maioria dos países da Europa, bem como a da Autoridade Palestiniana (AP), que assinou o acordo de Oslo e acreditava que os seus direitos poderiam ser alcançados por meios pacíficos. É lamentável que a Autoridade Palestiniana, que acreditava em meios pacíficos, tenha perdido mais terras e sofrido mais depois da assinatura do Acordo de Oslo. Essa experiência enviou uma mensagem ao Hamas de que os meios pacíficos não eram a forma correta de pôr termo à ocupação. Talvez a mudança de posição do Hamas e a adesão à AP tornem os palestinianos mais fortes na sua unidade e nas suas convicções para atingirem os seus objetivos, e será melhor do que estarem divididos, o que só pode beneficiar o ocupante.

cesar.avo@dn.pt

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