Spinoza e a História da Filosofia Judaica, por Marcos Bazmandegan

Os primeiros estudos de Spinoza foram em Teologia Judaica. Não há dúvidas a este respeito. Podemos considerar Spinoza parte da História da Filosofia Judaica ou até perguntar se poderá existir uma filosofia judaica? Essa é outra questão, mais complexa. Complexa em parte devido a inúmeras confusões que se fazem a respeito desta área de estudos.

No sentido comum, Filosofia Judaica é o nome que se dá aos estudos teológicos e filosóficos (filosofia religiosa) do Judaísmo. É sobretudo na Idade Média que esta disciplina se desenvolve e Maimónides é o seu maior expoente, particularmente através da sua obra Moré Nebuchim ou Guia dos Perplexos.

Assim, a primeira formação de Spinoza deu-se nessa área e os seus pensadores de referência são todos eles participantes dessa história: Ibn Ezra, Maimónides, Gersónides, Abravanel, Hasdai Crescas, Leão Hebreu, etc.

No dizer de Deleuze & Guattari, a Filosofia é a arte de criar conceitos. E podemos falar de uma filosofia judaica quando o Judaísmo é capaz de criar conceitos próprios. Mas essa filosofia não é plenamente uma Filosofia, mas antes uma pré-Filosofia, porque não se dá num plano de pura imanência. Por isso, a Filosofia Judaica (no sentido comum) pode tanto ser considerada como Teologia quanto Filosofia Religiosa. Só quando esses mesmos conceitos são arrastados para um plano de pura imanência é que poderemos falar de uma Filosofia Judaica no sentido estrito.

Spinoza no seu Tratado Teológico-Político situa-se plenamente no campo da Teologia Judaica, discute os conceitos e dialoga com os pensadores desta tradição. No entanto, por arrastar a discussão desses mesmos conceitos para um plano de pura imanência, Spinoza produz uma verdadeira Filosofia Judaica, a primeira do seu género.

Assim, percebemos o papel ambíguo, complexo e controverso de Spinoza nos manuais de História da Filosofia Judaica. Ele é continuidade e ruptura. É passagem de uma filosofia religiosa para uma filosofia da Religião. Leva a Filosofia Judaica ao seu fim e princípio. Por isso, tanta confusão a seu respeito. Ele permanece em suspense e tensão no último capítulo da História da Filosofia Judaica Medieval.

O Tratado Teológico-Político é um Tratado de Teologia, mas de uma teologia radical. Sobretudo, de uma teologia judaica radical. Torna-se o primeiro livro de Filosofia Judaica no sentido estrito, onde todos os conceitos da tradição judaica são pensados num horizonte de pura imanência.

É neste horizonte que devemos compreender o Judaísmo difícil de Spinoza.

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