In Memoriam – Carlos Matos Gomes | “Nunca vivemos numa democracia como a que existiu do 25 de Abril ao 25 de Novembro”

Retirado do Facebook | Mural de Carlos Fino

O coronel Carlos Matos Gomes combateu nas três frentes da guerra colonial e ganhou duas Cruzes de Guerra. Foi Capitão de Abril. Nesta entrevista, falou do livro autobiográfico ‘Geração D’.

Carlos Matos Gomes faleceu hoje, 13-04-2025, no Hospital Cuf-Tejo.

DN – Leonídio Paulo Ferreira, (Entrevista originalmente publicada a 7 de abril de 2024)

Chega a Moçambique como militar com 20 anos. Qual era a experiência de África para um miúdo nascido em Vila Nova da Barquinha?

A experiência de África que eu tinha era a de ter muitos colegas oriundos da África portuguesa que estudaram comigo no Colégio de Tomar.

De toda a África portuguesa?

De toda. De Moçambique, de Angola, da Guiné, de Cabo Verde. Até de fora de África, pois também de Timor havia. De maneira que não tinha nenhuma noção de racismo. Tinha a ideia de que éramos portugueses, todos iguais.

No Colégio de Tomar havia essa camaradagem entre os miúdos?

Havia, sim. Toda a gente se praxava uns aos outros e convivíamos de manhã à noite. Havia negros que estavam no grupo de forcados, havia outros que representavam figuras históricas portuguesas, como o Gualdim Pais. E, portanto, é um choque tremendo quando chego a África e vejo aquilo que era a exploração e a violência do racismo contra os africanos que não eram cidadãos portugueses, porque não tinham direitos. Eram recrutados para fazer trabalhos de obras públicas e não eram pagos. Eram explorados nos seus coletivos agrícolas. Eram agredidos…

É um choque, mas, como conta no livro, não chegou a África com aquele ideal de que ia defender Portugal, defender a pátria.

A minha geração chega a África e já não tem a noção de que a pátria era do Minho a Timor e nem tem a noção da defesa do regime. Tem a noção de pertencemos a uma nação e a um povo que é europeu e que está inserido na história da Europa. Portanto, aquilo que vai ser a guerra para a minha geração é uma questão política. O regime que existe aqui neste país tem que resolver este problema, que é o problema de uma guerra, como todos os outros regimes tinham resolvido, como a República tinha resolvido na Grande Guerra. Mal, a vários títulos, mas mantendo Portugal no seio da Europa e das políticas europeias. O que não aconteceu com a recusa de integrar o movimento descolonizador. (continua)

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