Uma Viagem à Índia | Gonçalo M. Tavares in “Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura”

GMT - 200O autor de “Uma Viagem à Índia”, Gonçalo M. Tavares, conta que a ideia desta obra “partiu da ideia de responsabilidade em relação ao passado”. Acrescentando que, para si, “o que diferencia o homem e o bicho é esta capacidade de memória das gerações anteriores”. “Esta ideia de conservar a memória”, precisou.

Admitiu a “aproximação amorosa” em relação a ‘Os Lusíadas’ e acrescenta que deseja “deixar sinais para gerações futuras”.

“Uma Viagem à Índia” (ed. Caminho) é um livro que, segundo o escritor, pede uma mudança de posição do leitor por obrigar este a arranjar uma nova posição para ler e pela possibilidade de ler fragmentos, a possibilidade de “abrir ao acaso e ler”.

O livro começou a ser escrito em 2003 e a sua revisão final demorou um ano.

VER AQUI :  http://www.snpcultura.org/vol_uma_viagem_a_india.html

(Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura)

Guardador de Rebanhos (Poemas Completos) | Alberto Caeiro

 

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I
Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.

Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela dar por isso.

Como um ruído de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.

Pensar incomoda como andar à chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais.

Não tenho ambições nem desejos
Ser poeta não é ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho.

E se desejo às vezes
Por imaginar, ser cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado por toda a encosta
A ser muita coisa feliz ao mesmo tempo),
É só porque sinto o que escrevo ao pôr do sol,
Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz
E corre um silêncio pela erva fora.

Quando me sento a escrever versos
Ou, passeando pelos caminhos ou pelos atalhos,
Escrevo versos num papel que está no meu pensamento,
Sinto um cajado nas mãos
E vejo um recorte de mim
No cimo dum outeiro,
Olhando para o meu rebanho e vendo as minhas ideias,
Ou olhando para as minhas ideias e vendo o meu rebanho,
E sorrindo vagamente como quem não compreende o que se diz
E quer fingir que compreende.

Saúdo todos os que me lerem,
Tirando-lhes o chapéu largo
Quando me vêem à minha porta
Mal a diligência levanta no cimo do outeiro.
Saúdo-os e desejo-lhes sol,
E chuva, quando a chuva é precisa,
E que as suas casas tenham
Ao pé duma janela aberta
Uma cadeira predileta
Onde se sentem, lendo os meus versos.
E ao lerem os meus versos pensem
Que sou qualquer cousa natural –
Por exemplo, a árvore antiga
À sombra da qual quando crianças
Se sentavam com um baque, cansados de brincar,
E limpavam o suor da testa quente
Com a manga do bibe riscado.

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