Setúbal sob a Ditadura Militar

Ditadura_Setubal

Uma das medidas seguidas pela Ditadura para combater o défice é a diminuição dos salários. Dia a dia os trabalhadores vão perdendo direitos conquistados. Há uma ambiência de pobreza extrema sendo que as autoridades locais chegaram a “deportar” para as terras de origem dezenas de famílias que viviam em Setúbal e que não tinham emprego pagando-lhes o bilhete de comboio.

Setúbal sob a Ditadura Militar (1926-1933) é o mais recente livro do historiador Albérico Afonso Costa. O retrato de uma cidade no período que mediou o fim da primeira República e o início do Estado Novo.

O autor aceitou responder a algumas questões colocadas pelo Das Culturas.

Setúbal sob a ditadura militar é um livro de resistência?

A investigação histórica deve tentar sempre libertar-se das duas visões dicotómicas que normalmente se colocam ao historiador: a condenação de determinado período histórico, ou a sua defesa. Essas opções são quase sempre limitadas e pobres. Nesse sentido este não é um livro de resistência. Contudo, ao pretender devolver a memória aos setubalenses, ao pretender que a cidade de Setúbal se reencontre com o seu passado, podemos, nessa vertente, encarar este livro como um livro de resistência. Resistência contra o silêncio e contra o esquecimento.

Setúbal, conhecida pela sua indústria conserveira, baseada numa mão-de-obra essencialmente feminina, teve na luta operária um dos vetores da contestação ao regime?

Setúbal no início do século passado transforma-se no maior centro da indústria conserveira do país. Estamos perante uma cidade mono-industrial em que a maioria da mão-de-obra era constituída por mulheres. Uma cidade que durante todo o período da 1ª República lutou contra as condições de sobre exploração, travando uma luta social muito intensa, num quadro de quase guerra civil, com várias greves gerais da indústria conserveira, algumas das quais se prolongaram por mais de dois meses.

Quando ocorre a revolução de 28 de maio, Setúbal vive uma das suas piores crises, com vários milhares de desempregados. Estes acontecimentos são vistos com grande distanciamento. O 28 de maio é lido como mais um golpe militar. Apenas isto.

Este desânimo está associado a muitos combates travados durante o regime republicano muitos dos quais foram perdidos.

Que riscos corre um historiador que se dedica à sua cidade?

O estudo da história local, no fundamental, não é diferente do estudo da história nacional ou internacional. No entanto, o historiador, tendo muitas vezes uma ligação afetiva ao objeto de estudo, pode ficar prisioneiro de uma narrativa laudatória ou hagiográfica supervalorizando determinados factos que podem não ter relevância que lhes é atribuída.

 

Partilhe connosco algum aspeto interessante que tenha sido trazido à luz por este livro.

Há muito poucas investigações sobre este período da nossa história. No que diz respeito a Setúbal, este é o primeiro estudo sobre a Ditadura Militar.

Telegraficamente, posso identificar alguns aspetos que me parecem particularmente interessantes.

Do ponto de vista social e económico, salvaguardando todas as distâncias, há desde logo vários pontos em que o leitor conseguirá identificar a crise que vivemos nos dias de hoje com a crise que é retratada neste período. Uma das medidas seguidas pela Ditadura para combater o défice é a diminuição dos salários. Dia a dia os trabalhadores vão perdendo direitos conquistados. Há uma ambiência de pobreza extrema sendo que as autoridades locais chegaram a “deportar” para as terras de origem dezenas de famílias que viviam em Setúbal e que não tinham emprego pagando-lhes o bilhete de comboio.

Outro aspeto que é estudado é greve dos marítimos de 1931 que opôs os pescadores aos armadores. Uma greve que vai durar três meses e que paralisa praticamente toda a atividade económica da cidade. Nesta greve, para além do afrontamento com os armadores e com o governo, há um outro combate interessante. É a disputa travada entre os anarquistas e o PCP pela hegemonia deste movimento grevista.

Como se documentou?

Para além dos arquivos locais, da hemeroteca da Biblioteca Municipal de Setúbal, consultei na Torre Tombo os arquivos da PIDE/DGS e do Ministério do Interior.

Trabalhei ainda com documentos do Arquivo Histórico Militar e também pude utilizar documentos de algumas coleções particulares.

 

O livro Setúbal sob a Ditadura Militar (1926-1933), é uma edição da Estuário e será lançado no dia 10 de Maio, pelas 16:30, na galeria do Quartel do 11 em Setúbal. A Apresentação do livro estará a cargo de Carlos Tavares da Silva e Fernando Rosas. A capa é da autoria de José Teófilo Duarte.

 

2 thoughts on “Setúbal sob a Ditadura Militar

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