O BEATLE, OS MONTY PYTHON E BRIAN | José Gabriel

Há pouco, tropecei aqui, na mesma página, em duas publicações que, não estabelecendo qualquer relação entre si, me chamaram a atenção por terem mais a ver uma com a outra do que se possa suspeitar pela sua leitura em separado. Uma, consistia numa imagem, sem qualquer legenda, retirada do filme Life of Brian dos Monty Python. Outra, era um texto biográfico sobre o quiet Beatle, George Harrison. Tinha as historietas do costume, nada de novo. Porém, quando se biografam personagens como George Harrison, é fácil, dada a sua grandeza e/ou popularidade em áreas bem conhecidas, esquecer outras não menos estimáveis. No caso, raramente se fala no cinéfilo, no produtor cinematográfico, no admirador devoto dos Monty Python a quem, segundo ele, deve a sanidade mental fazendo-lhe companhia no difícil período de separação dos Beatles. E, lá está, Harrison tem tudo a ver com o Life of Brian. Tanto, que talvez o filme não existisse sem a ousadia do Beatle.

Estava-se nos finais da década de 70, os dois primeiros filmes dos Monty tinham sido um sucesso e o grupo tinha escrito um novo guião, que retomava um tema deixado no ar no seu anterior filme “Holy Grail”, a crítica e a sátira às religiões organizadas e o seu papel na manipulação dos povos. O título – depois de outras desvairadas hipóteses: “Life of Brian”. Porém a EMI, que tinha já preparada a pré-produção do filme, desistiu à última hora, temendo as reacções do público, das igrejas e outras entidades vigilantes da boa higiene das almas. “Leram o guião” – queixavam-se, com o habitual sarcasmo, os autores. 

Os Monty iam tentando encontrar alternativas, mas ninguém ousava pegar no filme. Foram até Hollywood, procuraram por lá, mas nada. Por mero acaso, Erik Idle encontrou o seu amigo George Harrison, com quem desabafou as suas mágoas e a tristeza de não conseguir quem produzisse o seu filme. “Eu pago”, disse George. Perante a perplexidade de Idle, acrescentou: “é que quero ver o filme”. Como diria George, “nunca ninguém pagou tanto por um bilhete de cinema”.

Mesmo para um Beatle, a quantia envolvida era elevada. Ainda assim, George aventurou-se. Hipotecou a sua mansão em Londres e outros bens, formou a produtora HandMade Films – que veio a produzir, além da Life of Brian, outros filmes de sucesso – e as coisas avançaram rapidamente. 

Quanto ao êxito do filme, as polémicas que levantou, os amores e ódios que suscitou, todos nos lembramos. George recuperou os milhões investidos – graças a S. Brian, diria um devoto. E nós ficamos com mais um daqueles filmes impagáveis que guardamos na memória, na estante, na estima, no vício. Ia dizer de que todos somos entusiastas, mas hesito. Não vá alguém protestar, citando a personagem que, no meio da multidão exclamava: “I’m not!”

(Na foto: Harrison entre os Monty, numa cena de “A Vida de Brian”)

Retirado do Facebook | Mural de José Gabriel

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