Adormecem mamilos gretados | Célia Moura

Adormecem mamilos gretados
De indignação
Em cada palavra
Que não ouso.

Gemem catadupas de papoilas
Entre o trigo
E por isso as digo
As escrevinho
Grito-as aqui
Neste papel de ninguém!

E que prazer é
Mordê-las!

Saborear-lhes o sangue
Expulso das artérias
Libertando-as de mim
Desta clausura
Onde tentam amordaçar-me
Todas elas
As mais insolentes
As deliciosas
As mordazes
E até as mais voluptuosas!

Que prazer,
Enamorá-las
Consenti-las
Dar-lhes permissão
Para logo a seguir
As arremessar certeiras
Fugidias ou sarcásticas
Como flores ou como dardos
Aguçando-lhes a destreza
Verbalizá-las todas,
Libertando-as do sémen
Que nos fecunda a seara
Do Bem e do Mal
Arrancando ervas daninhas
Pelos dentes.

© Célia Moura – A publicar “Terra de lavra” (2012)
(Imagem – Justin Grant Photography)

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