Fraternidade rastejante | por José Goulão in AbrilAbril

A geração actual dos dirigentes europeus, sem qualquer excepção, é a mais acéfala de sempre perante Washington, a ponto de deixar as populações do continente à mercê de uma estratégia aventureirista.

QUINTA, 31 DE MARÇO DE 2022

Comecemos com algumas citações.

Petro Poroshenko, ex-presidente da Ucrânia (2014-2019): «Nós teremos trabalho, eles não; teremos pensões, eles não, teremos apoio para as pessoas, crianças e pensionistas, eles não; as nossas crianças irão para escolas e jardins de infância, as crianças deles irão para os abrigos».

Discurso em Odessa, Maio de 2015. «Eles» são os habitantes da região ucraniana do Donbass e o quadro traçado «é o que acontecerá quando ganharmos esta guerra», ou seja, a operação de punição e genocídio lançada pelas tropas do regime ucraniano e os seus destacamentos nazis contra a população do Leste do país, de maioria russófona – que provocou pelo menos 14 mil mortos entre 2014 e 2021.

Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia: «Existem heróis indiscutíveis: Stepan Bandera é um herói para certa parte dos ucranianos, o que é uma coisa normal e legal. Ele foi um dos que defenderam a liberdade da Ucrânia».

Stepan Bandera, agora consagrado oficialmente como «herói da Ucrânia», foi o chefe da organização nazi OUN/UPA, constituída segundo o modelo das SS e que colaborou com as tropas invasoras de Hitler nos massacres de milhares de polacos, judeus e resistentes soviéticos; aconteceu em 1941, ano em que o avô da presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, foi um dos oficiais alemães que conduziu essas chacinas na Ucrânia soviética. Bandera igual a liberdade, eis o conceito que o Ocidente apoia desde 2014 na Ucrânia.

Josh Cohen em publicação do Atlantic Council, think tank associado à NATO: «A Ucrânia tem um problema real com a violência de extrema-direita (e não, isto não é uma manchete do RT). Parece coisa de propaganda do Kremlin mas não é».

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O capitalismo em estado de guerra civil | José Goulão in Blog “abrilabril.pt”

POR JOSÉ GOULÃO 

A guerra civil capitalista está lançada. Quanto aos resultados a proporcionar pela vitória de qualquer dos campos em confronto, por indefinidos que ainda sejam, que venha o diabo e escolha.

A ordem mundial – chamemos-lhe assim, por comodidade – monolítica e unipolar, nascida nos escombros do muro de Berlim, e consolidada através do cada vez mais misterioso atentado de 11 de Setembro de 2001, está à beira do fim.

Atribuir o funesto desenlace de um sistema que fica como espelho da ortodoxia neoliberal aos maus humores de Donald Trump, à sua embirração com a senhora Merkel, à falta de polimento congénita e à mais do que comprovada tendência autoritária é uma explicação apenas ao alcance de indigentes mentais. Só as cabeças que se deixaram formatar pela quadratura neoliberal, a arte de transformar a ausência de reflexão e de ideias em pensamento único, podem alinhar numa tese tão desfasada da realidade.

Observar o presidente dos Estados Unidos da América passar um atestado de óbito à União Europeia, vê-lo desqualificar a elite governante da NATO, sentar-se ao lado do presidente da Rússia com o desejo declarado de iniciar uma nova relação entre Washington e Moscovo não pode ser uma questão humoral; nem subjectiva; nem um delírio. Tem que haver causas objectivas.

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