Roberto Merrill: “Rendimento Básico Incondicional elimina a armadilha da pobreza”

robRoberto Merrill é porta-voz para Portugal da iniciativa  de petição que pretende levar o Parlamento Europeu a discutir a introdução do Rendimento Básico Incondicional (RBI), uma prestação do Estado que seria dada todo o cidadão, empregado ou desempregado. Merrill é investigador do Grupo de Teoria Política do Centro de Estudos Humanísticos da Universidade do Minho e também investigador convidado na Universidade Católica de Louvain. Ao Dinheiro Vivo, explicou e defendeu o conceito que transformaria a sociedade.

Para os mais interessados no assunto, fica a informação de que estão previstas para 2014 duas publicações em Portugal que defendem o RBI : a tradução para o português do livro que contém a defesa mais exaustiva do RBI, escrito pelo filósofo belga Philippe Van Parijs, e intitulado Real Freedom for All (Oxford University Press, 1995); assim como um livro de Roberto Merrill, o nosso entrevistado, intitulado Rendimento básico incondicional: uma utopia realista para o século XXI.


De onde veio a ideia do RBI? Quem a criou efetivamente?
A ideia do RBI não é nova. As suas raízes históricas recuam ao século XVI. A ideia dum rendimento básico para os pobres foi sobretudo defendida pelos pensadores humanistas Thomas More (1478-1535) e Ludovicus Vives (1492-1540). Durante o período anos 60-70 do século XX, o debate teve lugar sobretudo nos EUA, dois dos seus mais famosos defensores sendo Milton Friedman (1912-2006), no seu livro Capitalism and Freedom (1962), e James Tobin (1918-2002), ambos prémios Nobel em economia. O RBI também foi defendido nessa altura pelo político norte-americano Martin Luther King, assim como pelo Presidente Richard Nixon mas sem chegar a implementá-lo.A partir dos anos 80, o RBI foi sobretudo defendido na Europa continental, sobretudo a través da criação, em 1986, do BIEN (Basic Income European Network) com sede na Universidade Católica de Louvain, sendo o filósofo belga Phillipe Van Parijs, director da Hoover Chair, um dos seus mais activos fundadores. Desde 2004, o BIEN significa Basic Income Earth Network.

Mas qual foi a intenção de tentar levar a ideia até ao Parlamento Europeu?
A Iniciativa de Cidadania Europeia sobre RBI foi lançada por um grupo de cidadãos europeus, alguns dos quais ligados ao BIEN. A existência dum movimento organizado em torno da defesa de um RBI em Portugal é muito recente e está directamente ligada à Iniciativa de Cidadania Europeia.

O RSI é um “parente” do RBI?
Até hoje, a experiência que existe em Portugal mais próxima dum RBI é o pagamento de um “rendimento mínimo garantido”, criado durante o Governo socialista de António Guterres. Hoje chama-se Rendimento Social de Inserção (RSI) e consiste no pagamento de um rendimento mínimo a todos os indivíduos que não se integrem no circuito do trabalho e da subsistência social. Também existiu durante o governo socialista de José Sócrates a intenção de implementar uma medida de incentivo à natalidade, a “Conta Poupança Futuro”, atribuindo um cheque-bebé de 200 euros por cada criança nascida. Mas esta medida não chegou a ser implementada, apesar de ter sido aprovada no Conselho de Ministros, contrariamente às medidas similares implementadas em Espanha (o Cheque bebé, atribuindo aos pais de cada criança nascida 2500 euros, mas esta medida, implementada em 2007, deixou de existir em 2011), assim como na Grã-Bretanha (Child Fund Trust, que continua em vigor).
Um sistema que remunera só pelo facto de a pessoa estar viva não desincentiva o trabalho, desestruturando o atual modelo capitalista?
É de salientar que a investigação mais recente em relação às consequências da implementação de um RBI indica que as transferências de dinheiro incondicionais têm resultados muito positivos nas vidas das pessoas que o recebem.  A ideia de que o RBI pode incentivar à preguiça corresponde sobretudo a um preconceito cultural e social, e não a uma verdade empiricamente comprovada. Os estudos empíricos realizados em vários países com o objectivo de averiguar a objectividade desta concepção, demonstraram que entre as pessoas que recebem um RBI e têm um trabalho remunerado apenas um número reduzido opta por mudar de trabalho e as que o fazem é com o objectivo de encontrar um trabalho que corresponda mais às suas capacidades e gostos. Vejam-se os casos do Brasil ou Canadá.

Discorda em absoluto que o RBI desincentivaria a procura ativa de trabalho?

Um dos problemas das transferências de prestações sociais sujeitas a condições de recursos, além de serem humilhantes e estigmatizantes para quem as recebe, é precisamente o de manterem quem as recebe na “armadilha da pobreza”. Ora o RBI pode em parte ser justificado como instrumento de eliminação desta  armadilha, pois ao não ser retirado quando as pessoas conseguem um emprego, motiva-as a procurarem-no e  a sair assim da pobreza, acumulando o RBI com o salário do trabalho remunerado. Do ponto de vista dos incentivos ao trabalho, podemos afirmar que os estudos empíricos já feitos provam que as pessoas não deixam de trabalhar com um RBI. Certamente que um RBI pode ter consequências nos incentivos para o trabalho que sejam benéficas para os trabalhadores.
O RBI é financeiramente sustentável para um Estado como Portugal, por exemplo? As contribuições para a Segurança Social incidiriam também sobre o RBI? Mas não haveria um défice financeiro crónico no sistema?
Para os países em crise da zona euro, como Portugal, creio que financiar um RBI pelos seus próprios meios é actualmente muito difícil, dadas as dificuldades orçamentais derivadas da dívida soberana. Para que o financiamento em Portugal de um RBI seja exequível devemos salientar que o financiamento teria de ser em parte europeu, como por exemplo sugere Philippe Van Parijs na sua recente proposta de financiamento deum euro dividendo. Este financiamento pode ser feito com um imposto europeu sobre o capital, ou com a implementação de um imposto sobre transacções financeiras, ou com um imposto sobre o património, mas também lutando de maneira mais eficaz contra a fraude e a evasão fiscal.

A petição a apresentar ao Parlamento Europeu quantos subscritores tem neste momento?
A petição tem perto de 135.000 subscritores em toda a União Europeia e cerca de 4000 em Portugal. O objectivo é chegar ao milhão de assinaturas e conseguir assim que a Comissão Europeia examine a iniciativa para que seja discutida no Parlamento Europeu.

http://www.dinheirovivo.pt/Economia/Artigo/CIECO294176.html?page=0 … (FONTE)

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