Hoje atiro-me a José Sócrates. Tinha de chegar a minha vez. | PAULO QUERIDO

Certamente! Qui, 15 abril 2021: Pois mas Isaltino não tinha um apartamento de luxo em Paris.

Hoje atiro-me a José Sócrates. Tinha de chegar a minha vez.

Desagrada-me em José Sócrates a atitude face ao Partido Socialista. As instituições são maiores que as pessoas. Todas as pessoas. Isto inclui fundadores históricos e grandes conquistadores (e criminosos, acumulem ou não com outras definições). Sócrates tem todos os direitos, incluindo o de criticar o seu antigo partido. Criticar não me desagrada. Desagrada-me o modo como o faz: pessoalizando o assunto. Como se ele fosse credor e o partido devedor. Não: o partido não o serve. Ele serviu o partido. Ele, above all people, devia saber o que é um partido político e quais as regras implícitas da vida política.

Para abordar o assunto Sócrates é comum ver declarações iniciais de auto-crítica. O típico “eu até votei nele mas”. Compreende-se, embora seja errado. E corrigir este erro é um dever de cidadania. Vivemos uma época intensa em que cada palavra é um punhal ou um carinho. Por exemplo: eu regressei ao voto no PS por causa de José Sócrates. Mas fui eleitor do PS, não de José Sócrates. A distinção é importante não por qualquer tipo de demarcação — estive em comícios, ouvi Sócrates e outros socialistas, gostei das propostas e achei que ele tinha a visão e a paixão necessárias para conduzir o país e não me arrependo de ter votado nem me envergonho desse momento nem do Sócrates dessa época — mas para ficar claro o ponto principal: em eleições legislativas, votamos em programas de ação e seus executores embainhados por partidos.

José Sócrates é um cadáver político que insiste em circular como se estivesse vivo. É um passivo tóxico desprovido de auto-consciência. Fernando Medina (para minha surpresa) disse o que havia para dizer para o despertar para a dura realidade. Sócrates preferiu continuar no sono a sonhar que tem capital político. Se realmente se vê como um Lula, como decorre de comportamentos e afirmações públicas, é lamentável. Não falo da matéria processual. Comparo somente as figuras políticas. Se tivéssemos uma escala de lulismo de 0 a 10, Sócrates não passava de um 2, correspondente às doses de carisma e importância histórica. E mesmo sobre Lula há dúvidas quanto à sua importância política atual e futura. Sobre Sócrates há a certeza de que passou a capital negativo.

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O que é insuportável em José Sócrates Luís Osório

1. O problema já nem são os processos, a inocência processual ou a culpa redentora para o sistema judiciário. O problema já não é o escandaloso arrastar do caso, as notícias e contra notícias, a quantidade de cofres, as explicações, as fugas de informação, os debates, as intermináveis discussões sobre Ministério Público, juízes, comunicação social. O problema já não é saber o que vai acontecer a seguir. Se o juiz Ivo Rosa é sério ou se está a soldo dos poderosos (seja isso o que for), se a mãe do ex-primeiro-ministro tinha uma herança, se guardava o dinheiro vivo ou se estava morto no banco, se a ex-mulher do ex-primeiro-ministro, mais o amigo milionário, mais Ricardo Salgado e o tipo do negócio do sangue e todos os personagens desta novela, têm ou não provas suficientes contra si.

2. O problema é todo este esgoto. Esta imundície moral. Este despudor. Não me interessa se José Sócrates é culpado ou inocente, o problema é que foi primeiro-ministro e teve o meu voto nas eleições em que teve maioria absoluta, o meu e o de milhões de portugueses. E voltou a ter o voto de milhares e milhares nas eleições seguintes (aí já não o meu).

3. O problema é que este senhor nos enganou. O problema é que tinha uma vida desbragada, uma vida de luxúria com dinheiro que ia buscar aqui e ali quando, no exercício das suas funções, pedia sacrifícios aos portugueses. O problema é todo o circo que montou. O poder que acumulou fazendo o que fosse preciso. O problema é tudo o que ouvimos dizer através da sua defesa, dos argumentos que utiliza, da vida que tinha, dos amigos que tinha, do dinheiro que circulava sem pudor, do modo como tratou a função de primeiro-ministro, da falta de dignidade que emprestou à sua função com a vida que decidiu ter.

4. Não, o problema não é o que o pode condenar. As alegações de corrupção prescrita ou não, os indícios ou a falta deles, os testas de ferro, as seis mil páginas do processo, o branqueamento de capitais ou as falsificações e a fraude fiscal.

Dou isso de barato.

O problema, o que verdadeiramente é insuportável, é o cheiro que isto tem a lama que nos foi atirada à cara por um homem em quem o país confiou e ofereceu uma maioria absoluta. Isso é simplesmente imperdoável.   

LO

Retirado do facebook | Mural de Luís Osório

Citando Paulo Querido | a propósito de José Sócrates

Há uma constante na televisão desde que José Sócrates começou a aparecer nela com regularidade, já lá vai uma década. Sempre que é entrevistado, nas horas seguintes recolhemos os cacos dos entrevistadores.

Sempre.

Quer-me por isso parecer que talvez devamos procurar a explicação não nos comentadores, mas na capacidade mediática dele. A capacidade de desarmar um discurso. De contrapor. A combatividade. De desrespeitar, respeitando o jogo democrático.

Sócrates escapa à docilidade da esmagadora maioria dos políticos, que preferem uma relação macia com os jornalistas. Se aceitarmos os argumentos sobre a sua ferocidade vindos precisamente dos mais experimentados desses entrevistadores ficará mais fácil analisar o trabalho deles.

Não acho que Paulo Ferreira e Vítor Gonçalves se tenham distinguido pela negativa. Não estiveram brilhantes, é certo, e tiveram os seus próprios momentos de se atropelarem mutuamente.

Mas o problema deles não foi a “má preparação”: foi Sócrates. E, se quisermos fazer mesmo justiça, a súbita existência de um discurso de contraponto aos números e guidelines com que a insistência ultraliberal acabou por adormecer o coletivo através da visão única e da voz monocórdica a repetir a mesma ladainha há 4 anos. Acaba por se entranhar e depois qualquer beliscadura faz estremecer.

O contraponto, para mais expresso por uma pessoa veemente, segura de si e com domínio perfeito — visceral — da narrativa televisiva e do timing, desarmou os entrevistadores, habituados a entrevistados concordantes ou no mínimo macios e oblíquos.

Uma notinha final: da próxima vez que quiserem entrevistar José Sócrates em televisão, para evitar o atropelamento pelo camião TIR televisivo que o homem é, não facilitem metendo 2 (ou mais) entrevistadores. Isso só o ajuda a desarmar — basta-lhe mudar o olhar de um para o outro para destruir uma pergunta.

https://www.facebook.com/PauloQuerido (FONTE)

O homem está em grande forma | por BAPTISTA-BASTOS in “Diário de Notícias”

Notoriamente, os dois jornalistas destacados para entrevistar José Sócrates estavam impreparados, ou não tomaram em consideração a aptidão dialéctica do ex-primeiro-ministro, ou, pior, não estavam ali para esclarecer, sim, acaso, para baralhar e entrar em chicana, colocando-se como protagonistas, quando deviam ser mediadores. Chegou a ser pungente a evidência com que o entrevistado repôs a natureza dos factos, perante a turva propriedade das enunciações. O esclarecimento das manobras e das conspiratas com origem em Belém, e as inclinações ideológicas do dr. Cavaco, que põem em causa a sua tão apregoada “independência”, foram pontos fulcrais da entrevista. Ficou-se a saber o que se suspeitava: o manobrismo unilateral de quem começa a ser cúmplice consciente do desastre para que nos encaminham. Um a um, ponto a ponto, Sócrates rebateu as alegações de “desincorporação” que ambos os jornalistas se aplicavam em expor, recorrendo às instâncias que estabeleciam as relações marcantes na época. Aí, a sua intervenção foi arrasadora. Claro que Sócrates e o seu governo não podem ser responsáveis de todas as malfeitorias, apesar das estruturas de contra-informação utilizadas, da negligência propositada de alguma comunicação social, e que ele denunciou com denodo. A entrevista foi extremamente interessante porque o reconhecido talento de José Sócrates voltou a impor-se em grande estilo. Ficámos esclarecidos? Não; porque os entrevistadores, além das deficiências apontadas, foram intimidados pelo “animal feroz”. O homem está em grande forma.

http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=3134586 (FONTE)