Projecto de Bienal Literária Argélia / Portugal | Carlos Matos Gomes

Demos conhecimento a Carlos Matos Gomes da ideia, ainda em projecto, da realização de uma Bienal Literária entre Argélia e Portugal. Em resposta,  recebemos entusiasmado apoio que entendeu transmitir com o texto que tomamos a liberdade de publicar. Numa sucinta, clara e brilhante resenha histórica, justifica esta “reunião” de dois povos amigos, juntando intelectuais argelinos e portugueses, mulheres e homens de cultura de ambos os países, escritores, poetas e historiadores. Vamos tentar!

São historicamente conhecidas as antiquíssimas relações entre Portugal, o ocidente peninsular e o Magreb, são fortíssimas as relações culturais entre estas duas regiões, das margens do Mediterrâneo, da língua à poesia e à literatura em geral, da ciência às artes e às ciências. Mas, sendo tão antigas e tão profundas estas relações, elas são também atuais e essenciais aos povos do Mediterrâneo Ocidental, no caso, aos portugueses e argelinos.

Partilhamos preocupações com os nossos povos, com o seu desenvolvimento no respeito pelas suas idiossincrasias culturais, com a paz e a liberdade, com equilíbrios regionais, com movimentos demográficos e migratórios. Partilhamos esperanças e riscos.

A cultura, em todas as suas vertentes, é, porventura, o mais fácil e amigável meio de promover relações harmoniosas entre povos. Através da cultura podemos abordar todas as diferenças e encontrar as melhores zonas de entendimento.

Nos tempos mais recentes, as alterações provocadas pelo desfecho da Segunda Guerra Mundial causaram um impacto decisivo na história da Argélia e na de Portugal. Os ventos da mudança de que falou o primeiro-ministro inglês Harold Macmillan no discurso na cidade do Cabo, trouxeram com eles o movimento descolonizador. Para a Argélia estes novos tempos significaram a luta pela independência da França, conseguida através de uma guerra de grande violência, de novo tipo, a guerra subversiva. A Argélia seria o regaço acolhedor dos guerrilheiros e dos líderes políticos dos movimentos independentistas das colónias portuguesas, dos poucos que em África, pela recusa do governo da ditadura portuguesa de Salazar, tiveram de combater pela sua libertação do colonialismo, mas seria também o porto de abrigo dos oposicionistas e democratas portuguesas que na Argélia lutaram contra a ditadura colonial.

Para a literatura portuguesa com referências à guerra colonial, ao colonialismo e à descolonização faz pois o maior sentido a ligação à Argélia. Afinal foi na Argélia que se formaram os guerrilheiros dos movimentos independentistas – PAIGC, FRELIMO, MPLA, que lhes serviram de matéria prima para as suas obras, foi na Argélia que se desenvolveram as teorias da guerrilha e da contra-guerrilha, foi da Argélia que veio em boa parte da politização dos militares portugueses que em 25 de Abril de 1974, com a Revolução dos Cravos, derrubariam a ditadura e promoveriam a descolonização. Foi ainda na Argélia que estiveram exilados oposicionistas portugueses como o general Humberto Delgado, a grande figura da oposição à ditadura, Manuel Alegre, além de lutador pela liberdade, de jornalista na Rádio Argel, a Voz da Liberdade, um escritor e poeta de mérito, Fernando Piteira Santos, historiador e jornalista, entre tantos outros. Mas ainda intelectuais das antigas colónias e dirigentes políticos como Amílcar Cabral, Agostinho Neto, Viriato da Cruz ou Aquino de Bragança.

Foi ainda na Argélia que se procederam as trocas de prisioneiros portugueses entregues pelos movimentos à Cruz Vermelha Internacional, foi na Argélia que se realizaram as conversações para o reconhecimento da independência da Guiné-Bissau.

Em suma, os lutadores pela liberdade, os intelectuais que conjugaram o pensamento, a cultura e a ação para conquistarem os objectivos de liberdade e respeito pela dignidade dos povos, os escritores quer da literatura portuguesa de ficção, quer a de investigação histórica da 2ª metade do século XX têm a Argélia como ponto nodal.

Faz pois todo o sentido reunir hoje intelectuais portugueses e argelinos, homens e mulheres da cultura de ambos os países, escritores, poetas, historiadores para revivificarem as relações entre dois povos amigos.

Assim seja possível concretizar esta reunião de boas vontades a bem de Portugal e da Argélia.

Com os melhores cumprimentos

Carlos Matos Gomes


Nous avons informé Carlos Matos Gomes de l’idée, encore en cours de développement, d’une Biennale littéraire entre l’Algérie et le Portugal. En réponse, nous avons reçu un soutien enthousiaste qu’il avait l’intention de transmettre avec le texte que nous avons pris la liberté de publier. Dans une approche historique succincte, claire et brillante, elle justifie cette « rencontre » de deux peuples amis, réunissant des intellectuels algériens et portugais, des femmes et des hommes de culture des deux pays, des écrivains, des poètes et des historiens. Essayons !

(vítor coelho da silva)

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Les relations séculaires entre le Portugal, la péninsule ouest et du Maghreb, sont connues historiquement. Ce sont de très fortes relations culturelles entre ces deux régions, les rives de la Méditerranée, la langue de la poésie et de la littérature en général, de la science aux arts et aux sciences. Mais comme ces relations sont si anciennes et si profondes, elles sont également présentes et essentielles pour les peuples de la Méditerranée occidentale, en l’occurrence les Portugais et les Algériens.

Nous partageons les préoccupations de nos peuples, avec leur développement dans le respect de leurs idiosyncrasies culturelles, avec la paix et la liberté, avec des équilibres régionaux, avec des mouvements démographiques et migratoires. Nous partageons les espoirs et les risques.

La culture, sous tous ses aspects, est peut-être le moyen le plus facile et le plus amical de promouvoir des relations harmonieuses entre les peuples. Grâce à la culture, nous pouvons aborder toutes les différences et trouver les meilleurs domaines de compréhension.

Ces derniers temps, les changements provoqués par l’issue de la Seconde Guerre mondiale ont eu un impact décisif sur l’histoire de l’Algérie et du Portugal. Dans son discours au Cap, les vents de changement prononcés par le Premier Ministre anglais, Harold Macmillan, ont apporté avec eux le mouvement décolonisant. Pour l’Algérie ces temps nouveaux signifiaient la lutte pour l’indépendance de la France, réalisée à travers une guerre de grande violence, d’un nouveau type, la guerre subversive. L’Algérie serait le tour confortable de la guérilla et les dirigeants politiques des mouvements d’indépendance des colonies portugaises, et la base de quelques dirigeants en Afrique qui, par le refus du gouvernement de la dictature portugaise de Salazar, ont dû se battre pour leur libération du colonialisme. Mais ce serait également le port de l’abri des opposants et des démocrates portugais qui, en Algérie, ont combattu la dictature coloniale.

Pour la littérature portugaise avec des références à la guerre coloniale, au colonialisme et à la décolonisation, le lien avec l’Algérie prend tout son sens. Après tout, c’était en Algérie que la guérilla des mouvements indépendantistes s’est formée – PAIGC, le FRELIMO, le MPLA, qui les ont servis de matière première pour leurs œuvres. C’était en Algérie que les théories de la guérilla et contre-guérilla ont été développées. C’était Algérie qu’en grande partie la politisation de l’armée portugaise est développée.  C’est ainsi que le 25 avril 1974, avec la Révolution des Œillets, a renversé la dictature et a promu la décolonisation. Également, l’Algérie a été la terre des exilés de l’opposition portugaise comme le général Humberto Delgado, la grande figure de l’opposition à la dictature, Manuel Alegre, ainsi que combattant de la liberté, journaliste à Radio Alger, Voix de la Liberté, un écrivain et poète du mérite, Fernando Piteira Santos, historien et journaliste, parmi tant d’autres. Mais encore celle des intellectuels des anciennes colonies et leaders politiques comme Amílcar Cabral, Agostinho Neto, Viriato da Cruz  ou Aquino de Bragança.

C’est également en Algérie où se sont déroulés les échanges des prisonniers portugais remis par les mouvements à la Croix-Rouge internationale et les pourparlers de reconnaissance de l’indépendance de la Guinée-Bissau.

En bref, l’Algérie est le point nodal des combattants de la liberté, les intellectuels qui combinent la pensée, la culture et l’action pour atteindre les objectifs de la liberté et le respect de la dignité des peuples, écrivains de la littérature portugaise, de la fiction et de la recherche historique de la seconde moitié du XXème siècle.

Il est logique de réunir aujourd’hui des intellectuels portugais et algériens, des hommes et des femmes de la culture des deux pays, des écrivains, des poètes, des historiens pour relancer les relations entre ces deux peuples amis.

Il est donc possible de faire cette rencontre de bonne volonté pour le bien du Portugal et l’Algérie.

Cordialement

Carlos Matos Gomes

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