OS ROBERTOS. (in “Évora, anos 30 e 40”, no prelo) | António Galopim de Carvalho

Vêm aí os Robertos! Gritava o meu irmão Mário, ofegante de dois andares a subir de um pulo, vindo da rua. Era assim que nós nos referíamos a esta herança cultural portuguesa que é o teatro de fantoches ou de marionetas, dito “de luva”. Descemos de um salto e, já na rua, a correr, ouvíamos a voz de “palheta” do bonecreiro. Lá estavam eles, gesticulando, no topo de uma guarita instalada naquele passeio mais alargado da Rua João de Deus, em frente da mercearia do Anselmo, rodeada por uma muito razoável assistência de miúdos e graúdos. Já montada, a guarita era uma armação de madeira forrada com chita barata, a fazer as vezes de palco virado a todos os quadrantes.

De pé, escondido lá dentro, o bonecreiro, falando sem parar, manipulava os figurantes, simples bonecos ou fantoches reduzidos a uma tosca cabeça de pau, vistosamente pintada, agarrada a um meio corpo que não era mais do que a respectiva roupa. Diz-se fantoches “de luva” porque o operador mete o dedo indicador na cabeça do boneco e usa o polegar e o dedo médio para fazer os braços, enfiando-os nas mangas terminadas por mãos igualmente vistosas. Testemunho de uma das tradições mais antigas das artes cénicas europeia e portuguesa julga-se ter ido buscar heróis populares ao oriente.

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