Boaventura Sousa Santos | Mereceu a pena? | in Jornal Público

Começa a ser evidente que os neoconservadores norte-americanos conseguiram impor na Europa, através de uma guerra de informação sem precedentes, uma vertigem bélica e anti-russa, cujas consequências levará tempo a avaliar. É, no entanto, possível identificar os sinais do que vem por aí.

Derrotados. Não se sabe ainda quem ganhará esta guerra (se é que alguém a ganhará, para além da indústria do armamento), mas já se sabe quem mais perde com ela. São o povo ucraniano e os restantes povos europeus. A Ucrânia em ruínas e os milhões de refugiados e a descida da cotação do euro são os sinais mais claros da derrota.

Nas sete décadas que se seguiram à destruição causada pela Segunda Guerra Mundial, a Europa, então designada como ocidental, reergueu-se. Liderada por governantes de alto nível intelectual e apoiada pelos EUA em sua cruzada para travar o comunismo, a Europa Ocidental conseguiu impor-se como uma região de paz e de desenvolvimento, ainda que muito deste fosse à custa do capital colonial que acumulara durante séculos. Bastou uma guerra fantasma – travada na Europa, mas não protagonizada pela Europa e nem sequer no interesse dos europeus – para pôr tudo isto a perder.

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Para uma autocrítica da Europa | Boaventura Sousa Santos, in Público, 10/03/2022

Imagem: Enlèvement d’Europe de Nöel-Nicolas Coypel, c. 1726

Somos forçados a concluir que os líderes europeus não estavam nem estão à altura da situação que vivemos. Ficarão na história como as lideranças mais medíocres que a Europa teve desde o fim da Segunda Guerra Mundial.

Porque não soube tratar das causas da crise da Ucrânia, a Europa está condenada a tratar das suas consequências. A poeira da tragédia está longe de ter poisado, mas mesmo assim somos forçados a concluir que os líderes europeus não estavam nem estão à altura da situação que vivemos. Ficarão na história como as lideranças mais medíocres que a Europa teve desde o fim da Segunda Guerra Mundial.

Esmeram-se agora na ajuda humanitária, e o mérito do esforço não pode ser questionado. Mas fazem-no para salvar a face ante o escândalo maior deste tempo. Governam povos que nos últimos setenta anos mais se manifestaram contra a guerra em qualquer parte do mundo. E não foram capazes de os defender da guerra que, pelo menos desde 2014, germinava dentro de casa. As democracias europeias acabam de provar que governam sem o povo.

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O esquecimento como arma política – I | José Pacheco Pereira | in Jornal “Público”

pacheco-pereiraA direita é hoje uma entusiasta do investimento público, do fim da austeridade, de uma baixa generalizada de impostos, em particular para os mais ricos, do acelerar de “reversões” de medidas que ela própria tomou como sendo temporárias no IRS e — espante-se! — pouco entusiasta do controlo do défice e da execução orçamental, coisas “menores” que são obsessão deste Governo.

O esquecimento é uma poderosa arma política que compõe a panóplia de mecanismos orwellianos que são uma parte importante da acção político-mediática dos nossos dias. O esquecimento é muito importante exactamente porque faz parte de um contínuo entre a política e os media dominado por um “jornalismo” sem edição nem mediação centrado no imediato e no entretenimento, com memória abaixo de passarinho. Ele vive hoje dos rumores interpares nas redes sociais, de consultas rudimentares no Google e não se dá ao trabalho sequer de ir ler ou ver como se passaram os eventos sobre os quais escreve e fala, há um ou dois anos. O tempo mediático é cada vez mais curto e isso é uma enorme oportunidade para uma geração de políticos assessorados por “especialistas em comunicação”, agências de manipulação e uma rede de influências no próprio círculo jornalístico, em que cada vez mais existe uma endogamia de formações, de habilidades e ignorância, de meios e métodos, e de confinamento social e cultural.

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O “quando” do “colapso” europeu | Francisco Louçã in “Público”

francisco loucaHá dias discuti aqui o “se” do que Assis chamou, também no PÚBLICO, de “colapso” europeu (ele referia-se ao “colapso moral” se for aprovado esta semana o acordo com a Turquia). Agora refiro-me ao “quando” de um outro colapso, o do sistema financeiro, onde se acumulam riscos vários importantes. O risco é tão evidente que o governador do BCE não fala de outra coisa.

Esse perigo tem duas facetas: deflação e estagnação. O risco de queda sucessiva da procura, em particular do investimento (esse é o primeiro efeito da deflação), mas também dos salários e pensões e portanto do consumo, conduz à redução das perspectivas de recuperação económica. É o que se está a passar nas principais locomotivas europeias que aterraram na estagnação, depois de um longuíssimo período de recessão (ou de duas recessões seguidas) em que se manteve sempre um nível elevado de desemprego. O desespero de Draghi é por isso compreensível: ele sabe que reduzir as taxas de juro tem resultados insignificantes, que a política de dinheiro barato já não tem impacto, e pede aos governos que façam o que ele não pode fazer, que aumentem a despesa … mas os governos não podem usar políticas expansivas por causa das regras orçamentais, que entre outros são drasticamente impostas pelo próprio BCE. É o círculo vicioso perfeito.

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A crise da social-democracia | MANUEL LOFF in “Público”

manuel lof - 150A tão discutida crise da social-democracia (SD) – não, não estou a falar da que Passos Coelho redescobriu há dias… – observa-se hoje, a partir de Portugal, com uma experiência de governo tão original quanto a atual, de forma substancialmente diferente da visão desoladora com que ela emerge à escala internacional. Depois da sua viragem ideológica dos anos 80 no sentido de um social-liberalismo (liberal na economia e nos costumes, social na preservação de políticas de redistribuição desde que não ponham em causa a recomposição do capitalismo internacional em nome da competitividade), a SD perdeu uma grande parte da sua capacidade de representação política, sobretudo entre os que dependem de um salário e os setores sociais que, avessos a mudanças estruturais do capitalismo, não deixam de acreditar na função reguladora das políticas sociais.

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Leitores do PÚBLICO elegem Afonso Cruz, ALT-J e Moonrise Kingdom como os melhores do ano

Há dois nomes portugueses entre os melhores do ano para os leitores do PÚBLICO. Afonso Cruz, que venceu de forma inequívoca a votação para eleger o melhor livro de 2012, com Jesus Cristo Bebia Cerveja. Miguel Gomes ficou em segundo nas preferências dos leitores para o cinema, com o muito aplaudido Tabu.

As escolhas foram feitas online em três votações separadas ao longo de quatro dias – entre dia 28 de Dezembro e o último dia do ano –, a partir de três listas com 50 livros50 discos e 50 filmes pré-seleccionados pelos jornalistas e críticos do PÚBLICO.

Jesus Cristo Bebia Cerveja (Alfaguara) venceu com 19% dos votos na Literatura, à frente de A Piada Infinita de David Foster Wallace (Quetzal) e de 1Q84 de Haruki Murakami (Casa das Letras), que amealharam respectivamente 10% e 9% dos votos. O resultado desafia as escolhas do ípsilon, que não incluíam nem Afonso Cruz nem Murakami (à frente ficaram, além de Foster Wallace em terceiro, O Bom Soldado de Švejkde Jaroslav Hašek em primeiro e Já Então a Raposa Era o Caçador de Herta Müller em segundo).

No cinema, Tabu foi, para os críticos do PÚBLICO, o filme do ano. Mas os leitores que participaram na votação preferiram Moonrise Kingdom (14%), de Wes Anderson. O filme de Miguel Gomes ficou em segundo (13%) e Vergonha, de Steve McQueen, em terceiro (11%). Estes dois também fizeram parte dopódio no ípsilon.

À lista de 50 filmes levada a votos, os leitores acrescentaram, no espaço para comentários, muitos outros títulos. Entre os mais citados encontram-seAmigos Improváveis (Olivier Nakache e Eric Toledano), Cloud Atlas (irmãos Wachowski), Looper – Reflexo Assassino (Rian Johnson), Os Vingadores(Joss Whedon) e Temos de Falar Sobre Kevin (Lynne Ramsay).

Nos discos, Tame Impala é consensual entre críticos e leitores: Lonerism é um dos melhores do ano. Só muda a posição na tabela, do primeiro lugar para o segundo (8%). Para os leitores, o melhor disco de 2012 foi An Awesome Wavede ALT-J (10%). The xx é o terceiro nome no topo da lista, com Coexist, com o mesmo resultado de Tame Impala (8%).

A escolha do disco do ano foi a que mais participação gerou. E mais sugestões de novos títulos para a lista: Desfado de Ana Moura, Wrecking Ball de Bruce Springsteen, Shields de Grizzly Bear e Confess de Twin Shadow foram alguns dos álbuns de que os leitores mais sentiram falta na votação.

FONTE:  () – http://www.publico.pt/cultura/noticia/leitores-do-publico-elegem-afonso-cruz-altj-e-moonrise-kingdom-como-os-melhores-do-ano-1579128?fb_action_ids=466955423341536&fb_action_types=og.recommends&fb_source=other_multiline&action_object_map=%7B%22466955423341536%22%3A514911288529710%7D&action_type_map=%7B%22466955423341536%22%3A%22og.recommends%22%7D&action_ref_map=%5B%5D

Foto: RUI GAUDÊNCIO

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