UM DISCURSO COM ALMA SOBRE O ESTADO DA UNIÃO | de Ursula von der Leyen | Paulo Sande

“Se sembra impossibile allora si può fare”

Como todos os anos, ritual inaugurado pelo muito nosso (salvo seja) Durão Barroso, quando Presidente da mesma Comissão, Ursula von der Leyen, actual incumbente no cargo, pronunciou ontem, 15 de setembro, o seu discurso da União – em 2021, num ano ainda duro, dolorosamente presente, de futuro indecifrável, onde mora o medo mas também a coragem, o desânimo mas também a esperança.

Aqui ficam dez apontamentos sobre este discurso – um grito pela Alma da Europa.

1. A Europa, em tempo de pandemia, assegurou o acesso praticamente simultâneo de todos os países europeus à vacina. E foi a única região a partilhar metade das vacinas com o resto do Mundo (700 milhões de doses para os europeus, 700 milhões espalhadas pelo globo). E mais de 70% dos adultos europeus estão vacinados. E o projeto europeu HERA, num investimento de 50 mil milhões €, visa garantir que nenhum vírus transformará no futuro uma epidemia local numa pandemia global.

2. A Europa, velho fidalgo arruinado, enfrenta agora o desafio da recuperação económica, depois de quase 2 anos de pandemia e confinamento. Muito graças à ação da União Europeia – e do NextGeneration EU (vulgo PRR) – 19 países europeus deverão regressar já este ano aos níveis anteriores à pandemia, os restantes oito só em 2022 (adivinhem onde está Portugal?).

3. A Europa fita, com olhar esfíngico e fatal, o digital, um dos eixos da sua estratégia. E o clima, em relação ao qual todos os países têm uma parte de responsabilidade, maior a das principais economias – aumentando a Europa a sua participação financeira. A COP26 em Glasgow será decisiva. E o social, com o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, que passou pelo Porto, aguarda concretização. E a anunciada luta sem tréguas contra a evasão e fraude fiscais ou os lucros ocultos das empresas de fachada, a proteção do orçamento europeu contra a corrupção, roubo do dinheiro dos contribuintes, desincentivo dos investidores, que facilita a compra de favores e o desrespeito das regras democráticas pelos mais poderosos. Cada caso como se fosse o recipiente de todos os males do Mundo (e não é?)

4. O novo programa europeu ALMA, vai permitir aos jovens europeus uma experiência profissional temporária noutro Estado-Membro. É uma espécie de Erasmus profissional. E 2022 será o Ano Europeu da Juventude – aos jovens caberá liderar os debates da Conferência sobre o Futuro da Europa.

5. A Europa deve tirar consequências do Afeganistão e fazer mais por sua própria conta. Ursula falou da necessidade de uma União Europeia da Defesa; só falta vontade política, não recursos ou capacidades. Durante a presidência francesa da União (2022) será convocada uma cimeira europeia de defesa.

6. E a UE como Ponte Global. Não basta construir estradas (belts and roads?), não quer criar dependências – mas relacionar-se com países de todo o Mundo; sem esquecer parceiros tradicionais ou essenciais, como os EUA (e um novo Conselho de Comércio e Tecnologia), os Balcãs Ocidentais, a parceria oriental e a nova agenda para o mediterrâneo. E há uma novel estratégia EU-Indo-Pacífico.

7. Uma Alma com espírito, que repudia a instrumentalização de seres humanos. E quer proteger as suas fronteiras, num sistema equilibrado e humano que trave a migração irregular proporcionando em simultâneo refúgio às pessoas forçadas a fugir. O novo Pacto de Migração e Asilo, que pode ser a resposta, arrasta-se sem concretização. A confiança é a chave.

8. E depois as mulheres, fragilizadas na pandemia – “devem voltar a viver livres e independentes” -, ameaçadas no Afeganistão. No horizonte, uma proposta de lei contra a violência sobre as mulheres.

9. Uma Europa com Alma declina irrenunciáveis valores, numa era de estratagemas para ganhar influência, de rivalidades regionais e de grandes potências entrevigiando-se. Os acontecimentos no Afeganistão são um sintoma dessa mudança, não a sua causa.

10. Uma Europa com alma, de valores. A liberdade da informação – os jornalistas. “Quando defendemos a liberdade dos nossos meios de comunicação social, estamos a defender a democracia”. Há uma evolução preocupante nalguns Estados-Membros e o diálogo é fundamental, mas não um fim em si mesmo – deve conduzir a um objetivo. A par do diálogo, a Comissão tomará medidas decisivas – a mensagem é clara.

UMA EXALTADA CONCLUSÃO, UM DISCURSO MOTIVACIONAL E ASPIRACIONAL

Ao proteger os extraordinários valores europeus, terá dito Vaclav Havel, protegemos a liberdade.

O discurso de Ursula von der Leyen sobre o Estado da União, foi um discurso sobre o estado da Alma da Europa, uma União “deliciosamente única e unicamente bela”, por imperfeita que seja – e é.

Uma União que reforça a liberdade individual graças à força da comunidade, moldada tanto pela história e os valores que partilhamos como pelas diferentes culturas e perspetivas que a integram.

São palavras que o vento leva? Mas afinal, o que seríamos nós sem as palavras?

Eu faço, fiz há muito, motivado pela emoção e pela razão, em doses (não sei se) iguais, a opção de lutar pelo projeto de integração europeia – esse objeto político tão único e tão belo e tão magnificamente imperfeito. Onde a solidariedade e a humanidade, a liberdade e a segurança se encontram.

Um projeto de união verdadeiramente sem par na História humana.

Uma União com Alma.

Retirado do Facebook | Mural de Paulo Sande

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