FILOSOFIA POLÍTICA | CORTINAS DE FUMO por Tomás Vasques, em 21.01.13

A semana passada foi marcada pela encenação do “debate” sobre a “refundação” do Estado proposta por Vítor Gaspar e Passos Coelho, tendo como pano de fundo um duvidoso “relatório” do governo, assinado por “técnicos” do FMI. Começou com uma conferência, encomendada e montada pelo primeiro-ministro, no Palácio Foz, e acabou no “debate quinzenal”, na sexta-feira, na Assembleia da República. Em ambos os casos, apenas a registar a irrelevância do que foi dito e a frouxidão política dos intervenientes, à medida dos interesses e objectivos do governo. Estamos à beira de um terramoto na vida da maioria dos portugueses, a juntar às suas difíceis condições de sobrevivência, e tudo parece estranhamente calmo, uma espécie de bonança que antecede as grandes tempestades.

Casimiro de Brito, “A Boca na Fonte”, editora Lua de Marfim, Lisboa, 2012 by Maria João Cantinho

Casimiro de Brito

Casimiro de Brito

O mundo não posso mudar –
Deixa-me sacudir a areia
Das tuas sandálias

Casimiro de Brito, “Através do Ar”, ed. Schichigatsudo, 23, Tóquio, 2008, p. 28.

Muito jovem, Casimiro de Brito parte para Londres, onde acabou por viver até 1968. Tendo ficado alojado no apartamento de um professor de estudos orientais, tomou contacto com a poesia japonesa pela primeira vez. E essa presença iria marcar, em definitivo, a sua própria poética. A extrema condensação do haiku e o choque que esta poética teve sobre si marcar-lhe-iam decisivamente o rumo poético. Numa entrevista que Casimiro deu a Andreia Brito, em 2005, “O essencial ainda está por vir”, explica assim o poeta à entrevistadora:
Conheci uma poética que hoje considero ser a mais bela de todos os tempos (comparável só às nossas cantigas de amigo); entrei num campo de trabalho como eu gosto, a longo prazo, para sempre; entrei na vida (física, mental, sensível) de um ser celestial, a minha amiga japonesa, enfim, coisas bonitas que mudaram o meu caminho. Nunca mais deixei de respirar essa poesia e, sobretudo, nunca mais deixei de pensar (e de fazer) que é preciso conhecer mais do que a nossa tradição poética.

Essa presença da poesia japonesa e das suas musas poéticas prolongou-se no tempo (e ainda continua viva pelos contactos de Casimiro de Brito com a poesia japonesa) e lembro duas obras fundamentais: “À Sombra de Bashô: Renga com Matsuo Bashô” (2001) e o livro “Através do Ar”, escrito em colaboração com Ban’ya Natsuishi, composto de haikai que são traduzidos, simultaneamente em inglês, francês e português.
O haiku, que no plural se designa por haikai (um termo que significa “versos de diversão”), constitui a forma lírica japonesa por excelência. Tradicionalmente o haiku consta de dezassete sílabas, divididas em 3 versos, seguindo o esquema 5/7/5, para descrever qualquer cena natural ou objecto, concentrando um sentimento, uma ideia ou um aforismo, tal como nos ensina Martin Gray, in “Haiku”, na página 132 da sua obra. Ainda de acordo com o tema dominante, multiplica-se em quatro subgéneros: wabi (frugalidade), sabi (isolamento), aware (impertinência) e yugen (mistério) . Continua, ainda, Jorge Sousa Braga, na mesma página, a explicar-nos a estrutura do haiku, dizendo que “do ponto de vista puramente retórico, o haiku divide-se em duas partes, separadas por uma palavra-chave: Kireji.” A primeira parte, segundo o autor, “dá a condição geral e a ubiquação temporal ou espacial do poema (o outono ou a primavera, uma árvore ou uma rocha…); a outra, explosiva, deve conter um elemento activo. Uma é descritiva e quase enunciativa; a outra, inesperada. A percepção poética surge da colisão entre ambas.”
A estética do haiku tem, ainda, vários pontos de afinidade com o aforismo, pela mesma retórica, pelo mesmo sentido de economia e de rigor poético, daí que ela tenha entrado na literatura ocidental pela estética do fragmento, tão cara aos poetas alemães românticos, tendo como cultor máximo do género o poeta Novalis. E o poeta Casimiro de Brito foi, também, ao longo da sua obra, um exemplo maior da escrita aforística. Cito aqui, a título de exemplo, “A Arte da Respiração”, editado pela D. Quixote (1988), “Da Frágil Sabedoria”, das edições Quasi (2001), “Fragmentos de Babel” (2007) e “Arte de Bem Morrer”, pela Roma Editora (2007). A peculiaridade e o próprio sentido desta estética do fragmento nasce do próprio instante e da concentração temporal nele existente, do Aqui e do Agora que se abrem na sua leitura. Isto é, o poema conquista a sua plenitude à luz da organicidade e da estruturação que dele irradia, da sua própria concentração temporal e espacial. Por isso e, como me disse um dia o poeta, cada poema deve ser lido ao centro, para que, da concentração do olhar, surja também a contemplação da origem e do fim do poema, da palavra e da coisa. Cada aforismo, cada haiku, cito Casimiro de Brito, é “simultaneamente um ovo e uma pedra”. Na entrevista que deu a Andreia de Brito, Casimiro diz, sobre o haiku:
(…)Tem a forma de um ovo, de onde pode nascer um pássaro. É um texto mínimo que, começando por surpreender, vai transformar-se em coisa do outro, do leitor, uma vez que a sua estrutura enigmática se presta à interpretação. Deve ser perfeito como um ovo ou uma pedra: não há nele uma sílaba a mais, mas tudo o que lá está é muito mais. A única comparação possível é com a forma mais bela de poema que existiu: o haiku.

Esta compreensão do haiku só pode nascer da articulação do tempo a-histórico com aquele tempo em que vivemos, o tempo quotidiano, onde a outra dimensão temporal se revela e manifesta, em cada uma das partes, reclamando uma pertença antiga. Relembro aqui a bela definição de Edmond de Jabès:
C’est pourquoi j’ai rêvé d’une oeuvre qui n’entrerait dans aucune catégorie, qui n’appartiendrait à aucun genre, mais qui les contiendrait tous; une oeuvre que l’on aurait du mal à définir, mais qui se définirait précisément par cette absence de définition (…) un livre enfin qui ne se livrerait que par fragments dont chacun serait le commencement d’un livre.

A estética do haiku ou do fragmento recusa a ideia de um acabamento ou de uma definição da obra e esta vai-se fazendo à medida que se escreve cada poema, definindo-se precisamente pela ausência da sua definição, avançando contra as evidências e o fechamento imposto pelo formal, recusando o acabamento e a imperfeição, colhendo, em cada verso a imperfeição e o segredo, o inesperado. E, como Casimiro de Brito gosta de nos recordar, “o poeta é aquele que trabalha com o segredo”, habitando o umbral do querer dizer das línguas e do mundo, numa luta perdida contra o emudecimento da matéria.
Esta tensão interna, este “segredo” da matéria e do mundo e que constitui a sua opacidade é o que confere à poesia de Casimiro de Brito esta poderosa imagética, evidente, desde logo, no título “A Boca na Fonte”, que nos remete para essa busca do primordial, do acto de beber directamente da fonte, aqui dupla, pois é no sentido da natureza e simultaneamente da linguagem.
Uma poética que se faz irmã da terra e da água, da escuta e da visão directa. Cito dois haikai, para dar ideia desta proximidade: por exemplo, o número 43, na página 16: “Silêncio. Ouçam/a vida – água correndo/cada vez mais triste” ou o 48, da página 17: “Diante do mar/o meu coração derrama-se/e vai com as ondas.” Cosmos, palavra, coração são rostos de uma mesma realidade, metamorfose incandescente que se fixa no haiku, em que o poema se coagula na forma de imagem, breve e luminosa. Se os elementos e a força da terra e da natureza perpassam a sua poética, sob as mais variadas formas, desde a ínfima gota de chuva ou grão de areia até ao enigmático silêncio das constelações, também o onírico deflagra, a todo o instante, para nos recordar a brevidade da vida e do instante: “Viagem nocturna –/ regresso à origem do sonho/donde nunca saí.”
Morte e vida, sonho, natureza e linguagem são os diversos rostos que constituem a poesia de Casimiro, sempre. Seja na sua forma lírica ou de fragmento, em particular. Desses nomes essenciais dá conta a sua linguagem poética, revelando uma profunda sabedoria que se entrelaça com a simplicidade e o rigor da sua poética. Se, por um lado, Casimiro é dos mais inspirados poetas portugueses e disso nos dá conta a sua “paleta lírica”, por outro, é senhor de uma contenção e de um rigor irrepreensíveis, que nunca o deixam resvalar para o sentimentalismo. Esse é um segredo que poucos detêm na sua poesia, feita de demora e de paciência, o tempo em que o poeta sonha o mundo e o transforma em linguagem e em luz.
Cito um haiku deslumbrante e que resume esse rumo poético: o haiku 6 da página 8: “Na prosa do dia/a rosa alumia. Que prosa/se tudo é rosa?”. É por esta razão que o poeta René Char dizia que a poesia era superior à filosofia e a qualquer metafísica. Na poesia de Casimiro, a filosofia e a sagesse lavram esse sulco, em que a poesia deita a sua semente, onde a concentração da imagem atinge o seu esplendor e um ponto de intensidade raros. Como raros o foram os poetas-pensadores da Antiguidade Grega, guiados pelo rigor e pela claridade enigmática do pensamento. É desta sabedoria e desta humildade que se constrói o poema, desta pobreza essencial da finitude humana, esse magma secreto e indizível do poema, que recusa a beleza e a perfeição. Por isso, diz Casimiro, no haiku 12: “Homem caminhando./Árvore nómada em busca/da mãe obscura.”

Mãe obscura da vida ou da linguagem? Essa é a questão que coloco ao poeta.

Maria João Cantinho

http://pnetliteratura.pt/cronica.asp?id=5432 … (FONTE)

Fundação José Saramago | Comunicado de imprensa

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A Fundação José Saramago criou um Grupo de Amigos através do qual quem estiver interessado pode oferecer donativos para a instituição. O valor das contribuições determina as diferentes contrapartidas de que os Amigos poderão usufruir.

Quem quiser contribuir pode fazê-lo através de transferência bancária, para a conta cujos dados estão explicitados no nosso site da Internet.

Os benefícios previstos começam pela simples menção do nome do doador na lista de Amigos (de cinco a dez euros), entradas gratuitas na Fundação (a partir dos 10 euros), descontos de 20 por cento na livraria/loja (a partir dos 20 euros), oferta do livro A Estátua e a Pedra. O autor explica-se, a publicar pela Fundação nos próximos meses (a partir dos 50 euros). Quem contribuir com 500 euros ou mais será considerado parceiro da Fundação e mencionado como tal em todos os nossos materiais.

A Fundação José Saramago tem como fontes de financiamento os direitos de autor da obra do escritor e as receitas de entrada e da livraria/loja da Casa dos Bicos, e não recebe qualquer financiamento público.

As contribuições dão direito, em Portugal, a benefícios fiscais.

Mais informações em:

http://www.josesaramago.org/373151.html 

Novo romance de Federico Moccia – Amor 14

image012O novo romance de Federico Moccia – Amor 14 – é uma viagem fantásticas através dos sentimentos. Carolina tem quase 14 anos. Está a viver um momento cheio de magia, que partilha com as amigas: os sonhos; os primeiros beijos roubados; as músicas que falam da sua experiência; as festas; a escola, os exames e os colegas; a sua querida avó, que a entende como ninguém; e o seu irmão, tão excecional, que leva o coração de Carolina a sonhar. E o amor? Como será o verdadeiro amor? Serão os olhos de Maximiliano, que encontrou por acaso? Quem sabe…

O livro foi adaptado ao cinema em 2009.

«Moccia possui uma técnica narrativa impecável. Além disso, consegue fotografar de uma maneira nítida a sociedade atual.» Secolo d’Italia.

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=ddTlUybIRRM

BIBLIOHISTÓRIA – BASE DE DADOS LITERÁRIA | Pedro Almeida Vieira

patrocinio2biblioHistória constitui uma base de dados, iniciada em meados de 2010 pelo escritor Pedro Almeida Vieira, que integra  obras de literatura do género histórico – ou com incursões históricas – publicadas por escritores portugueses desde o século XIX até à actualidade. Foi na pesquisa de informação que foi (re)descoberta a obra do primeiro escritor do romance moderno português, Guilherme Centazzi, que publicou «O Estudante de Coimbra», em 1840 e 1841, entretanto reeditada no ano passado pela Planeta (ver vídeo).

Actualmente, a biblioHistória tem já inventariados 645 autores (incluindo pseudónimos) e 1.770 títulos, entre romances, novelas, contos e narrativas ficcionadas. Estão também incluídas 59 obras de autores anónimos, grande parte das quais em periódicos. No entanto, ainda se continua a realizar pesquisas para a inclusão de mais obras e obtenção de mais informação.

Esta base de dados teve o apoio da Porto Editora até 2012, da ordem dos 600 euros por ano, mas por razões desconhecidas este grupo editorial decidiu suspender esta colaboração, pelo que o projecto se encontra sem sustentabilidade financeira e ameaça encerrar.

Antes da decisão unilateral da Porto Editora, a biblioHistória tinha previsto, e concretizará se houver apoios, um upgrade que permitirá tornar ainda mais interactiva a base de dados (como pesquisa temática e por palavras-chave), completar a inserção de mais informação e incluir outros dados, nomeadamente recensões, artigos académicos e ligações a edições digitalizadas actualmente existentes.

Caso o apoio agora pedido atinja ou ultrapasse o montante mínimo, o promotor compromete-se a elaborar um relatório detalhado das despesas e informar dos avanços da base de dados com regularidade, bem como passar a disponibilizar uma newsletter sobre as novidades literárias do género histórico em Portugal.

Sobre Pedro Almeida Vieira

Escritor e jornalista, Pedro Almeida Vieira licenciou-se em Engenharia Biofísica na Universidade de Évora em 1993. Dois anos mais tarde tornar-se-ia jornalista, colaborando nos jornais «Expresso» e «Diário de Notícias», bem como nas revistas «Forum Ambiente» e «Grande Reportagem». Em 2003 foi-lhe atribuído o Prémio Nacional de Ambiente «Fernando Pereira», pela Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente, pela sua contribuição, como jornalista, para as causas ambientais.

Em 2003 publicou um ensaio ambiental intitulado «O Estrago da Nação», repetindo esta temática em 2006, com a publicação do livro «Portugal: O Vermelho e o Negro», sobre os incêndios florestais.

A sua estreia literária na ficção surgiu com o romance «Nove Mil Passos» (2004), sobre a construção do Aqueduto das Águas Livres, seguindo-se «O Profeta do Castigo Divino» (2005) – que aborda a vida do jesuíta Gabriel Malagrida e a ascensão política do Marquês de Pombal, com enfoque no período anterior ao terramoto de Lisboa de 1755 -, «A Mão Esquerda de Deus» (2009, finalista do Prémio Literário Casino da Póvoa) – que constitui uma reconstrução da heterodoxa vida de Alonso Perez de Saavedra, o suposto falso núncio que criou a Inquisição lusitana, durante o reinado de D. João III de Portugal -, e «Corja Maldita» (2010), um romance que, subvertendo o género histórico, incide sobre o processo de extinção da Companhia de Jesus na segunda metade do século XVIII.

Em 2011 publicou o primeiro volume de narrativas históricas «Crime e Castigo no País dos Brandos Costumes», sobre procesos judiciais em Portugal entre os séculos XVI e XIX, bem como um ensaio sobre resíduos sólidos urbanos intitulado «Resíduos: Uma Oportunidade». Em 2012 preparou a edição, com fixação de texto e notas, do romance «O Estudante de Coimbra», de Guilherme Centazzi, considerada a primeira obra de ficção moderna portuguesa.

http://ppl.com.pt/pt/prj/bibliohistoria

FILOSOFIA POLÍTICA | A dívida! A eficiência! Os cortes! O desastre! | Carlos Matos Gomes in “Facebook”

A dívida! A eficiência! Os cortes! O desastre! A notícia do reescalonamento da dívida e o relatório encomendado ao FMI estão ligados pelo mesmo pensamento da moda: o extremismo mercantil – o endeusamento dos mercados – com o messianismo evangélico dos que agem segundo a crença de que um Deus nos deu a posse do mundo e dos seus bens até à eternidade. Esta mistura foi a mesma que levou os povos da Ilha da Páscoa a derrubarem até à última palmeira para construirem e transportarem a ultima grande estátua dos seus Deuses. Fazendo estátuas maiores dos deuses a quem pediam boas colheitas à medida que iam esgotando as árvores e com elas a possibilidade de regeneração da natureza. A questão das dívidas dos estados devida à competição pelos bens disponíveis (caso das dividas soberanas) e da necessidade da “eficiência” a palavra mágica do relatório dito do FMI que apontam para uma mais acelerada e frenética utilização de recursos são o sintoma da esquizofrenia em que caimos. Alguém chamou a este estado “o rodopio do suicida “. A ideia do crescimento eterno e da eficiencia (fazer mais, mais depressa, com menos gente e pagando o menos possível) a todo o custo vai levar-nos à destruição. Na verdade vivemos sempre a crédito e talvez seja mais sensato falar em desenvolvimento do que em crescimento.

Páscoa